Corte Interamericana de Direitos Humanos Caso La Cantuta Vs. Peru Sentença de 29 de novembro de 2006



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Corte Interamericana de Direitos Humanos
Caso La Cantuta Vs. Peru

Sentença de 29 de novembro de 2006
(Mérito, Reparações e Custas)

No caso La Cantuta,


A Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “Corte Interamericana”, “Corte” ou “Tribunal”), integrada pelos seguintes juízes:
Sergio García Ramírez, Presidente;

Alirio Abreu Burelli, Vice-Presidente;

Antônio Augusto Cançado Trindade, Juiz;

Cecilia Medina Quiroga, Juíza;

Manuel E. Ventura Robles, Juiz; e

Fernando Vidal Ramírez, Juiz ad hoc;


presentes, ademais,

Pablo Saavedra Alessandri, Secretário; e

Emilia Segares Rodríguez, Secretária Adjunta,
em conformidade com os artigos 62.3 e 63.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante denominada “Convenção” ou “Convenção Americana”) e com os artigos 29, 31, 53.2, 55, 56 e 58 do Regulamento da Corte (doravante denominado “Regulamento”), profere a presente Sentença.
I

Introdução da Causa


1. Em 14 de fevereiro de 2006, nos termos dos artigos 50 e 61 da Convenção Americana, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “Comissão” ou “Comissão Interamericana”) submeteu à Corte uma demanda contra o Estado do Peru (doravante denominado “Estado” ou “Peru”), que teve origem na denúncia número 11.045, recebida na Secretaria da Comissão em 30 de julho de 1992. Na demanda, a Comissão solicitou que o Tribunal declarasse que o Estado é responsável pela violação dos direitos consagrados nos artigos 3 (Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (Direito à vida), 5 (Direito à integridade pessoal), 7 (Direito à liberdade pessoal), 8 (Garantias judiciais) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em detrimento de Hugo Muñoz Sánchez, Bertila Lozano Torres, Dora Oyague Fierro, Luis Enrique Ortiz Perea, Armando Richard Amaro Cóndor, Robert Edgar Teodoro Espinoza, Heráclides Pablo Meza, Felipe Flores Chipana, Marcelino Rosales Cárdenas e Juan Gabriel Mariños Figueroa. A Comissão também solicitou que a Corte declarasse que o Estado é responsável pela violação dos artigos 5 (Direito à integridade pessoal), 8 (Garantias judiciais) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em detrimento dos familiares das supostas vítimas. A Comissão solicitou ainda ao Tribunal que declarasse que o Estado descumpriu os artigos 1.1 (Obrigação de respeitar os direitos) e 2 (Dever de adotar disposições de direito interno) da Convenção, em detrimento das supostas vítimas.
2. A demanda se refere à suposta “violação dos direitos humanos do professor Hugo Muñoz Sánchez e dos estudantes Bertila Lozano Torres, Dora Oyague Fierro, Luis Enrique Ortiz Perea, Armando Richard Amaro Cóndor, Robert Edgar Teodoro Espinoza, Heráclides Pablo Meza, Felipe Flores Chipana, Marcelino Rosales Cárdenas e Juan Gabriel Mariños Figueroa […] bem como de seus familiares”, pelo alegado sequestro das supostas vítimas, ocorrido na Universidade Nacional de Educação “Enrique Guzmán y Valle – La Cantuta”, em Lima, na madrugada de 18 de julho de 1992, que teria contado com a participação de efetivos do Exército peruano, “os quais [supostamente] sequestraram as [supostas] vítimas para posteriormente ocultá-l[a]s e executar sumariamente algumas delas”; bem como pela alegada impunidade desses fatos por não terem sido investigados de maneira diligente. A Comissão alegou que “o caso reflete os abusos cometidos pelas forças militares, bem como a prática sistemática de violações de direitos humanos, dentre as quais desaparecimentos forçados e execuções extrajudiciais, realizados por agentes estatais cumprindo ordens de chefes militares e policiais, conforme já ressaltaram a Comissão Interamericana, desde o início da década de 90, e a Comissão da Verdade e Reconciliação do Peru”.

3. A Comissão também levou ao conhecimento da Corte o suposto dano causado pelo Estado aos familiares das supostas vítimas, e solicitou ao Tribunal que, em conformidade com o artigo 63.1 da Convenção, ordenasse ao Estado que adotasse determinadas medidas de reparação mencionadas na demanda. Por último, solicitou à Corte que determinasse o pagamento pelo Estado das custas e gastos incorridos na tramitação do caso na jurisdição interna e perante os órgãos do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos.


II

Competência


4. A Corte tem competência para conhecer do caso, nos termos dos artigos 62.3 e 63.1 da Convenção Americana, já que o Peru é Estado Parte na Convenção desde 28 de julho de 1978, e reconheceu a jurisdição contenciosa da Corte em 21 de janeiro de 1981.

III

Procedimento perante a Comissão


5. Em 30 de julho de 1992, Gisela Ortiz Perea, Rosario Muñoz Sánchez, Raida Cóndor, José Oyague e Bitalia Barrueta de Pablo apresentaram uma petição à Comissão Interamericana pela suposta detenção, ocorrida em 18 de julho de 1992, e pelo desaparecimento de Hugo Muñoz Sánchez, Bertila Lozano Torres, Dora Oyague Fierro, Luis Enrique Ortiz Perea, Armando Richard Amaro Cóndor, Robert Edgar Teodoro Espinoza, Heráclides Pablo Meza, Felipe Flores Chipana, Marcelino Rosales Cárdenas e Juan Gabriel Mariños Figueroa. Em 4 de agosto de 1992, a Comissão abriu o caso, de número 11.045, e transmitiu a denúncia ao Estado.
6. Em 4 de fevereiro de 1993, a Associação Pró-Direitos Humanos (doravante denominada “APRODEH”) apresentou petição à Comissão Interamericana pelas supostas detenções e pelo desaparecimento dessas pessoas (par. 5 supra).
7. Em 22 de outubro de 1993, o Centro de Estudos e Ação para a Paz (doravante denominado “CEAPAZ”) apresentou-se perante a Comissão, na qualidade de “codenunciante”, e encaminhou informação adicional sobre os fatos.
8. Em 11 de março de 1999, no âmbito do 102º Período Ordinário de Sessões, a Comissão aprovou o Relatório de Admissibilidade no 42/99. No dia 15 do mesmo mês e ano, a Comissão comunicou aos peticionários e ao Estado a aprovação desse Relatório.
9. Em 22 de fevereiro de 2001, no âmbito do 110° Período Ordinário de Sessões, a Comissão emitiu um comunicado de imprensa conjunto com o Estado sobre os resultados de uma reunião da qual participaram, como representantes do Estado peruano, o então Ministro da Justiça do Peru, senhor Diego García-Sayán, e o então Representante Permanente do Peru junto à Organização dos Estados Americanos (doravante denominada “OEA”), Embaixador Manuel Rodríguez Cuadros. A Comissão foi representada pelo então Presidente, senhor Claudio Grossman; pelo Primeiro Vice-Presidente, senhor Juan Méndez; pela Segunda Vice-Presidente, senhora Marta Altolaguirre; pelos comissários Robert Goldman e Peter Laurie; e pelo Secretário Executivo, senhor Jorge E. Taiana. Na alínea b do comunicado de imprensa conjunto, incluiu-se este caso, entre outros, nos quais o Estado reconheceria a responsabilidade e adotaria medidas para restituir os direitos afetados e/ou reparar o dano causado.
10. Em 24 de outubro de 2005, no âmbito do 123° Período Ordinário de Sessões, a Comissão aprovou, nos termos do artigo 50 da Convenção, o Relatório de Mérito no 95/05, no qual concluiu, inter alia, que o Estado violara os direitos consagrados nos artigos 3 (Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (Direito à vida), 5 (Direito à integridade pessoal), 7 (Direito à liberdade pessoal), 8 (Garantias judiciais) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação aos artigos 1.1 e 2 do mesmo instrumento. A Comissão recomendou ao Estado a adoção de uma série de medidas para sanar as mencionadas violações.
11. Em 14 de novembro de 2005, a Comissão transmitiu o Relatório de Mérito ao Estado, concedendo-lhe o prazo de dois meses para que informasse acerca das medidas adotadas para dar cumprimento às recomendações nele constantes.
12. Em 28 de novembro de 2005, a Comissão, em conformidade com o artigo 43.3 de seu Regulamento, comunicou aos peticionários a aprovação do Relatório de Mérito e seu envio ao Estado, e solicitou que se posicionassem a respeito de um eventual encaminhamento do caso à Corte Interamericana. Em 30 de dezembro de 2005, entre outras considerações, os peticionários informaram que “caso o Estado peruano não cumpris[se] as recomendações da Comissão Interamericana no prazo indicado no Relatório [de Mérito] aprovado pela Comissão, […era seu] interesse que o caso [fosse] submetido à jurisdição contenciosa da […] Corte”. Em 13 de janeiro de 2006, o Estado solicitou uma prorrogação do prazo para informar sobre as medidas adotadas para dar cumprimento às recomendações da Comissão. O prazo foi prorrogado até 29 de janeiro de 2006, e o Peru apresentou seu relatório em 30 de janeiro do mesmo ano.
13. Em 30 de janeiro de 2006, a Comissão solicitou aos peticionários que, ante o eventual envio do caso à Corte Interamericana, indicassem um interveniente comum que, conforme o artigo 23.2 do Regulamento do Tribunal, seria “o único autorizado a apresentar petições, argumentos e provas no decorrer do processo, inclusive nas audiências públicas”. Em 3, 7 e 10 de fevereiro de 2006, o CEJIL e a APRODEH enviaram comunicações mediante as quais apresentaram, respectivamente, informação relativa aos beneficiários e suas prerrogativas, e designaram um interveniente comum.
14. Em 10 de fevereiro de 2006, a Comissão Interamericana decidiu submeter o presente caso à jurisdição da Corte, “ante a falta de implementação satisfatória [por parte do Estado] das recomendações constantes do Relatório no 95/05”.
IV

Procedimento perante a Corte


15. Em 14 de fevereiro de 2006, a Comissão Interamericana apresentou perante a Corte a demanda (par. 1 supra), à qual anexou prova documental, e ofereceu prova testemunhal e pericial. A Comissão designou como delegados o Comissário Clare K. Roberts e o Secretário Executivo Santiago A. Cantón; e como assessores jurídicos o senhor Víctor Madrigal Borloz e as senhoras Elizabeth Abi-Mershed, Dominique Milá e Lilly Ching.


16. Em 17 de março de 2006, a Secretaria da Corte (doravante denominada “Secretaria”), após exame preliminar conduzido pelo Presidente da Corte (doravante denominado “Presidente”), transmitiu a demanda, juntamente com os respectivos anexos, ao Estado, informando sobre os prazos para contestá-la e designar sua representação no processo.
17. Ainda em 17 de março de 2006, a Secretaria, em conformidade com o disposto no artigo 35.1, alíneas d) e e) do Regulamento, transmitiu a demanda aos representantes dos familiares das supostas vítimas, a APRODEH, o CEAPAZ e o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) (doravante denominadas “representantes”), e informou-os de que dispunham de um prazo de dois meses para apresentar seu escrito de petições, argumentos e provas (doravante denominados “escrito de petições e argumentos”).
18. Em 31 de março de 2006, a Secretaria comunicou ao Estado que, em conformidade com o disposto nos artigos 18 do Regulamento da Corte e 10 de seu Estatuto, poderia designar, nos 30 dias seguintes a essa comunicação, um juiz ad hoc para participar da consideração do caso.
19. Em 21 de abril de 2006, o Estado designou o senhor Iván Arturo Bazán Chacón como Agente.
20. Em 28 de abril de 2006, o Estado designou o senhor Fernando Vidal Ramírez como Juiz ad hoc.
21. Em 17 e 23 de maio de 2006, as representantes apresentaram seu escrito de petições e argumentos, com os respectivos anexos, no qual ofereceram prova testemunhal e pericial.

22. Em 21 de julho de 2006, o Estado apresentou seu escrito de contestação da demanda (doravante denominado “contestação da demanda”), ao qual anexou prova documental. Nesse escrito, o Peru acatou e reconheceu parcialmente sua responsabilidade internacional por determinadas violações alegadas pela Comissão (pars. 37 a 44 infra).


23. Em 17 de agosto de 2006, o Presidente expediu resolução mediante a qual ordenou que fossem recebidos, por meio de declarações prestadas perante notário público (affidavit), os depoimentos dos senhores Fedor Muñoz Sánchez, Rodolfo Robles Espinoza, Víctor Cubas Villanueva, oferecidos pela Comissão e pelas representantes; e os de Jaime Oyague Velazco, José Ariol Teodoro León e José Esteban Oyague Velazco, e das senhoras Dina Flormelania Pablo Mateo, Carmen Amaro Cóndor, Bertila Bravo Trujillo e Rosario Carpio Cardoso Figueroa, oferecidos pelas representantes, bem como as peritagens do senhor Eloy Andrés Espinoza-Saldaña Barrera, oferecida pela Comissão, e dos senhores Kai Ambos e Samuel Abad Yupanqui, oferecidas pelas representantes, que deveriam ser enviadas ao Tribunal o mais tardar em 8 de setembro desse ano (2006). Em conformidade com o ponto resolutivo 3º dessa resolução, seria concedido às partes um prazo não prorrogável de sete dias, contados a partir do recebimento das declarações, para a apresentação das observações que, sobre elas, considerassem pertinente formular. Além disso, considerando as circunstâncias particulares do caso, o Presidente convocou a Comissão Interamericana, as representantes e o Estado para uma audiência pública, a ser realizada na sede da Corte, a partir das 9h00 do dia 29 de setembro de 2006, para ouvir as alegações orais finais sobre o mérito e as eventuais reparações e custas no caso, bem como os depoimentos das senhoras Gisela Ortiz Perea e Raida Cóndor Sáez, oferecidos pela Comissão e pelas representantes, e de Antonia Pérez Velásquez, oferecido pelas representantes. Finalmente, nessa resolução o Presidente informou às partes que dispunham de um prazo improrrogável, até 29 de outubro de 2006, para apresentar as alegações finais escritas em relação ao mérito e às eventuais reparações e custas.


24. Em 30 de agosto de 2006, a Secretaria solicitou ao Estado que remetesse, com a maior brevidade, vários documentos a que havia feito referência na contestação da demanda, mas que não havia oferecido ou incorporado como prova nos respectivos anexos. Em 27 de setembro do mesmo ano, essa solicitação foi reiterada ao Estado, que remeteu parte da documentação solicitada em 2 de novembro de 2006.
25. Em 8 de setembro de 2006, as representantes apresentaram as declarações testemunhais prestadas, perante notário público (affidavits), por Fedor Muñoz Sánchez, Carmen Rosa Amaro Cóndor, Dina Flormelania Pablo Mateo, Víctor Andrés Ortiz Torres, Víctor Cubas Villanueva, José Ariol Teodoro León, José Esteban Oyague Velazco, Rosario Carpio Cardoso Figueroa e Edmundo Cruz (par. 23 supra).
26. Em 11 de setembro de 2006, a Secretaria recebeu a declaração juramentada do senhor Rodolfo Robles Espinoza. Nesse mesmo dia, a Secretaria comunicou à Comissão e ao Estado que dispunham de um prazo de sete dias para apresentar observações às declarações enviadas pelas representantes (par. 25 supra).
27. Em 11 de setembro de 2006, as representantes informaram que a senhora Bertila Bravo Trujillo e o senhor Jaime Oyague não tinham podido apresentar as respectivas declarações testemunhais perante notário público, e que o senhor Kai Ambos não poderia realizar a peritagem que lhe havia sido solicitada.
28. Em 14 e 21 de setembro de 2006, depois de concedida uma prorrogação, a Comissão e as representantes enviaram as peritagens dos senhores Eloy Espinosa-Saldaña Barrera e Samuel Abad Yupanqui.
29. Em 18 de setembro de 2006, a Comissão informou que não tinha observações sobre as declarações apresentadas pelas representantes (par. 25 supra). Por outro lado, no dia seguinte, o Estado apresentou suas observações sobre os depoimentos prestados perante notário público e transmitidos às partes no dia 11 do mesmo mês e ano (par. 26 supra).
30. Em 26 de setembro de 2006, a Corte expediu uma resolução mediante a qual resolveu encarregar o Presidente, Juiz Sergio García Ramírez, o Vice-Presidente, Juiz Alirio Abreu Burelli, os Juízes Antônio Augusto Cançado Trindade e Manuel E. Ventura Robels, bem como o Juiz ad hoc Fernando Vidal Ramírez, de assistir à audiência pública que havia sido convocada para o dia 29 de setembro de 2006 na sede da Corte (par. 23 supra).
31. Em 26 de setembro de 2006, o Estado apresentou suas observações sobre os relatórios periciais prestados perante notário público (affidavit) pelos senhores Eloy Andrés Espinoza-Saldaña Barrera e Samuel Abad Yupanqui (par. 28 supra).
32. Em 29 de setembro de 2006, no LXXII Período Ordinário de Sessões, a Corte realizou a audiência pública convocada (par. 23 supra), à qual compareceram: a) pela Comissão Interamericana: Paolo Carozza, Delegado; Santiago Cantón, Secretário Executivo, Delegado; Víctor H. Madrigal Borloz, assessor; e Norma Colledani e Lilly Ching, assessoras; b) pelas representantes: Gloria Cano, advogada da APRODEH; e Ana Aliverti, María Clara Galvis, Ariela Peralta e Viviana Krsticevic, advogadas do CEJIL; e c) pelo Estado: Iván Arturo Bazán Chacón, Agente, e Alberto Gutiérrez La Madrid, Embaixador do Peru na Costa Rica. A Corte ouviu os depoimentos dos familiares das supostas vítimas convocados, bem como as alegações finais orais das partes.
33. Em 24 de outubro de 2006, a Secretaria, por instrução do Presidente e com base no artigo 45.2 do Regulamento, solicitou à Comissão Interamericana, às representantes e ao Estado que apresentassem, o mais tardar em 31 de outubro de 2006, as seguintes informações e documentação, para que fossem consideradas como prova para melhor resolver:


  • esclarecimento quanto a se a indenização disposta em favor dos familiares das vítimas na sentença de 18 de maio de 1994, proferida pelo Conselho Supremo de Justiça Militar, em relação aos fatos do presente caso, correspondia a danos materiais ou morais, ou ambos, e se fora disposta por danos causados diretamente às supostas vítimas executadas ou desaparecidas, ou por danos causados a seus familiares. Além disso, que esclarecessem se os familiares das dez supostas vítimas ali mencionadas haviam efetivamente recebido a referida indenização;

  • quais dos processados ou condenados nos processos penal militar e penal ordinário, abertos em relação aos fatos do presente caso, permaneceram ou se encontram atualmente privados de liberdade e, nesse caso, se estão ou estavam em prisão preventiva ou na qualidade de condenados nesses processos;

  • cópia dos códigos penais, penais militares e processuais penais, tanto os vigentes quanto os que haviam sido aplicados nas investigações e processos penais abertos em relação aos fatos deste caso;

  • informação sobre a situação atual e os resultados do procedimento ou procedimentos de extradição, pendentes ou encerrados, em relação às investigações e processos penais abertos pelos fatos deste caso, bem como cópia de todas as ações e gestões conduzidas a esse respeito por parte de autoridades peruanas, ou de qualquer outro país, que tenham em seu poder; e

  • relatório acerca da situação atual das investigações e procedimentos que se encontram abertos em relação aos fatos deste caso.

Além disso, solicitou-se à Comissão e às representantes que apresentassem documentação pertinente que confirmasse a filiação e, se fosse o caso, a morte de pessoas que apareceriam como familiares das supostas vítimas na demanda e no escrito de petições e argumentos, em relação aos quais não haviam sido entregues documentos que atestassem sua existência ou filiação. Solicitou-se ainda à Comissão e às representantes que informassem as razões pelas quais Zorka Muñoz Rodríguez não havia sido incluída na lista de familiares das supostas vítimas e, caso fosse pertinente, que enviassem a documentação pertinente que demonstrasse sua eventual filiação ou falecimento.


34. Em 27 de outubro de 2006, a organização Instituto de Defensa Legal do Peru apresentou um amicus curiae. Em 24 de novembro do mesmo ano, o Estado formulou observações sobre esse documento.

35. Em 29 de outubro de 2006, a Comissão e o Estado apresentaram suas alegações finais escritas. No dia seguinte, as representantes fizeram o mesmo.


36. Nos dias 1º, 3, 10, 13, 20 e 24 de novembro de 2006, as representantes, a Comissão e o Estado apresentaram informação e documentação em resposta à solicitação de prova para melhor resolver (par. 33 supra e par. 66 infra).
V

Acatamento Parcial
37. No presente caso, o Estado reconheceu sua responsabilidade internacional tanto perante a Comissão quanto perante o Tribunal, motivo pelo qual se passa a especificar os termos e o alcance desse reconhecimento.
38. Na alínea b do comunicado de imprensa emitido pela Comissão em 22 de fevereiro de 2001, juntamente com o Peru, durante o 110° Período Ordinário de Sessões, (par. 9 supra), o país declarou que “reconhecer[ia] a responsabilidade e adotar[ia] medidas para restituir os direitos afetados ou reparar o dano causado em vários casos, entre os quais o caso no 11.045 (La Cantuta)”.
39. Durante a tramitação deste caso perante a Corte Interamericana, o Estado acatou “os fatos alegados, mas declara sua discordância com respeito às consequências jurídicas que se deseja atribuir a alguns desses fatos”; além disso, “declar[ou] à Corte que acata parcialmente algumas das pretensões da Comissão e das representantes das supostas vítimas”.
40. No Capítulo V da contestação à demanda, intitulado “reconhecimento dos fatos pelo Estado”, reiterado no Capítulo III de suas alegações finais escritas, o Peru declarou o seguinte:
Os fatos reconhecidos pelo Estado compreendem:


  1. a identificação e preexistência das supostas vítimas nas pessoas de Hugo Muñoz Sánchez; Juan Mariños Figueroa; Bertila Lozano Torres; Roberto Teodoro Espinoza, Marcelino Rosales Cárdenas; Felipe Flores Chipana; Luis Enrique Ortiz Perea; Armando Amaro Cóndor; Heráclides Pablo Meza; e Dora Oyague Fierro (parágrafo 50 do escrito de demanda);

  2. a presença e controle militar na área do recinto universitário de La Cantuta no dia dos fatos (parágrafos 51 a 53 do escrito de demanda);

  3. o ato de sequestro que compreendeu a detenção ilegal e o dano à integridade pessoal das dez pessoas: Hugo Muñoz Sánchez; Juan Mariños Figueroa; Bertila Lozano Torres; Roberto Teodoro Espinoza; Marcelino Rosales Cárdenas; Felipe Flores Chipana; Luis Enrique Ortiz Perea; Armando Amaro Cóndor; Heráclides Pablo Meza; e Dora Oyague Fierro; seu desaparecimento forçado e o prejuízo ao reconhecimento da personalidade jurídica (parágrafos 53 a 57 do escrito de demanda);

  4. a execução extrajudicial de Armando Richard Amaro Cóndor, Roberto Teodoro Espinoza, Heráclides Pablo Meza, Juan Gabriel Mariños Figueroa, Luis Enrique Ortiz Perea e Bertila Lozano Torres, cujos cadáveres foram posteriormente encontrados (parágrafos 58 a 68 do escrito de demanda);

  5. a persistência do desaparecimento forçado de Dora Oyague Fierro, Felipe Flores Chipana, Marcelino Rosales Cárdenas e Hugo Muñoz Sánchez (parágrafo 69 do escrito de demanda);

  6. a violação das garantias judiciais e da proteção judicial. Esses fatos se manifestaram nos atos iniciais de investigação (parágrafos 90 a 105 do escrito da demanda), nos atos posteriores de intervenção de tribunais militares (parágrafos 106, 111 e 112 do escrito de demanda) e do Congresso da República (parágrafo 109 do escrito de demanda), na decisão da Corte Suprema de Justiça (parágrafos 108, 109 e 110 do escrito da demanda), na aprovação da Lei de Anistia nº 26.479 pelo Congresso (parágrafo 113 do escrito de demanda), da Lei nº 26.492 (parágrafo 116 do escrito de demanda) e na promulgação dessas leis de anistia por parte do Poder Executivo, embora não mencionado de forma expressa no texto da demanda;

  7. a existência do denominado “Grupo Colina” (parágrafos 83 a 89 do escrito de demanda);

  8. a promulgação das leis de anistia e os efeitos da sentença da Corte Interamericana no Caso Barrios Altos Vs. Peru (parágrafos 113, 116, 117 e 118 do escrito de demanda);

  9. as novas investigações (parágrafos 119, 120 e 121 a 126 do escrito de demanda).

41. Com base nesse reconhecimento dos fatos, o Estado declarou que


[é] evidente, à luz das investigações iniciadas já em 1993, em seguida suspensas e posteriormente retomadas pelo Ministério Público do Estado peruano, órgão autorizado pela Constituição Política do Estado e pela Lei Orgânica do Ministério Público a exercer essa atividade, e dos dois processos penais em curso no Poder Judiciário, que se violou a Convenção Americana nos artigos 4, 5, 3, 7, 8 e 25, respectivamente, em relação ao artigo 1.1 do citado Tratado, por diversos atos e omissões do Estado peruano ao longo de 14 anos.
42. Além disso, imediatamente, o Estado emitiu uma série de declarações sobre o alcance desse reconhecimento, que intitulou “discordância do Estado e acatamento parcial das consequências jurídicas dos fatos reconhecidos, e algumas apreciações ou ponderações jurídicas a respeito desses fatos”, nos seguintes termos:
O Estado peruano, imediatamente após o encerramento do mandato do ex-presidente Alberto Fujimori Fujimori, adotou medidas concretas para restabelecer relações fluidas com o sistema interamericano de proteção, fortalecer o Estado de Direito e evitar a impunidade dos crimes cometidos em detrimento dos direitos humanos e em prejuízo do patrimônio público. […]
[M]ediante comunicado conjunto assinado pela ilustre Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelo Estado peruano, em 22 de fevereiro de 2001, o Estado anunciou que reconheceria a responsabilidade internacional em alguns casos, entre os quais o La Cantuta, e adotaria outras medidas em casos encerrados com relatórios emitidos em conformidade com o artigo 51 da Convenção Americana. […]
O Estado não nega a ocorrência dos fatos, nem que tenham acontecido em virtude de atos ou omissões de representantes do Estado, quer se trate de autoridades, quer de funcionários públicos, o que gera obrigações para o Estado. Entretanto, explica o contexto em que se elabora a resposta do Estado frente à situação de impunidade reinante até o final do ano 2000, quando há uma mudança de conduta do Estado a partir da transição democrática e da reinstitucionalização do Estado de Direito no país. […]
[O] Estado admite que não há um resultado de condenação dos atuais acusados ou investigados, mas também reconhece que a obrigação de investigar e punir é uma obrigação de meio e não de fim, como estabelece a jurisprudência da Corte Interamericana nos casos Velásquez Rodríguez, Godínez Cruz, Caballero Delgado e Santana e Baldeón García. [A] conduta do Estado de dar andamento a dois processos penais e realizar uma investigação preliminar não deveria ser considerada simples formalidade, condenada de antemão ao fracasso, e sim um sério e decidido processo de reverter a impunidade que se tentou institucionalizar no Peru na década passada. […]
O Estado admite que o avanço dos processos penais abertos no Tribunal Penal Especial e na Junta de Instrução da Corte Suprema de Justiça da República é parcial. Também reconhece que a investigação preliminar no Ministério Público sobre a autoria intelectual ainda não resulta em denúncia formal perante o Poder Judiciário, que possa dar início a um novo processo penal. […]
O Estado peruano não questiona a apreciação da [Comissão] sobre o período em que ocorreu o fato, que o inscreve numa prática sistemática e generalizada de execuções extrajudiciais e desaparecimento forçado, artigo VII.E da demanda, ou seja, […] os fatos se contextuali[zam] naquilo que a [Comissão] denomina de uma prática sistemática e generalizada (características associadas ou unificadas) de violações de direitos humanos. […]
[É] claro que a Corte Interamericana concluiu, em casos anteriores, que existiu no Peru, na mesma época dos fatos do Caso La Cantuta, uma prática sistemática, tanto de execuções extrajudiciais como de desaparecimento forçado de pessoas. […]
[…] na sentença do Tribunal Penal Nacional proferida recentemente, em 20 de março de 2006, no caso do desaparecimento forçado de Ernesto Castillo Páez, […] o Tribunal Nacional endossa a [jurisprudência da Corte Interamericana, segundo a qual,] entre 1989 e 1993, era praticado no Peru o desaparecimento forçado de pessoas como parte da estratégia de combate à subversão executada pelo Estado peruano. Essa conduta foi qualificada pela Corte como prática sistemática e generalizada de violação dos direitos humanos. Esse período coincide com a ocorrência dos fatos do presente caso.
Essa afirmação, embora proveniente de um órgão jurisdicional interno, ainda não reveste o caráter de sentença definitiva expedida pela Corte Suprema de Justiça da República, mas revela a disposição do Estado de reconhecer que existiu uma prática estatal, que supera o ato de verificar se foi generalizada ou sistemática, ou, como afirma a demanda, que foi generalizada e sistemática.
A esse respeito, a análise e a contribuição do relatório final da CVR foram esclarecedoras. Cumpre salientar que o conceito de prática generalizada de violações de direitos humanos supõe um elevado número de atos e de vítimas.
Naturalmente, para a Corte bastará a concomitância de indícios e prova circunstancial, sem a exigência do nível de prova de um tribunal penal interno; mas se à mesma conclusão chegou um tribunal penal local, especializado em direitos humanos, cujo nível de prova é diferente ou mais rigoroso, ao decidir sobre a liberdade de pessoas e para proteger bens jurídicos tão fundamentais como a liberdade física, a integridade pessoal e até a vida, é razoável entender que, se o Tribunal Penal nacional conclui que houve uma prática estatal de desaparecimento forçado, o próprio Estado admite que é responsável internacionalmente por haver provocado essa situação ou por não haver adotado as medidas que prevenissem a prática desse ilícito internacional.
O Tribunal Constitucional do Peru, no Caso Santiago Enrique Martín Rivas, conclui também que, na época dos fatos, ‘essas circunstâncias se relacionam à existência de um plano sistemático para promover a impunidade em matéria de violação de direitos humanos e crimes de lesa-humanidade, especialmente os atos cometidos pelo Grupo Colina […] Com o que tanto o órgão judicial especializado da judicatura peruana quanto o órgão máximo de justiça constitucional coincidem em admitir que na época dos fatos cometiam-se crimes contra a humanidade e promovia-se o acobertamento das violações de direitos humanos por meio de um plano sistemático.
Cumpre lembrar, ademais, que o Estado não somente é parte na Convenção Americana, mas também na Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas, em cujo artigo IV se compromete a reprimir o desaparecimento forçado.
43. Na audiência pública realizada pela Corte no presente caso (par. 32 supra), o Agente do Estado manifestou “seu pesar aos familiares das supostas vítimas” e leu uma “declaração oficial por incumbência do Presidente da República” nos seguintes termos:
O Presidente da República do Peru cumprimenta a Corte Interamericana de Direitos Humanos, reunida nesta oportunidade para revisar o Caso La Cantuta. O Estado peruano lamenta profundamente a sorte que se abateu sobre esse grupo de peruanos, nove estudantes e um professor, e, ao reiterar seu pesar pela dor causada às famílias, também deseja ratificar o compromisso de cumprir suas obrigações internacionais.
44. Além disso, nas alegações finais orais e escritas, o Estado

[r]eiter[ou] […] que esses fatos e omissões constituem atos ilícitos internacionais que geram responsabilidade internacional do Estado. Constituem crimes segundo o direito interno, além de serem crimes internacionais que o Estado deve combater.


[R]eiter[ou] que reconhece os fatos e, quanto ao tema pendente na justiça, compartilha a preocupação dos familiares. O Estado está empenhado em fazer justiça. Entretanto, embora reconheça os fatos, discorda da ilustre Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em algumas de suas pretensões, mediante as quais deseja, em síntese, que se declare o Estado peruano responsável internacionalmente por violar as garantias judiciais e a proteção judicial também por sua conduta do final do ano 2000 até a atualidade, bem como que se declare que o Estado peruano não adotou medidas suficientes para tornar sem efeito jurídico as leis de autoanistia.
Do mesmo modo, a existência da CVR e de seu Relatório Final partem do dado incontrastável de que o Peru passou por um conflito armado interno; de que nesse contexto específico ocorreram graves violações de direitos humanos, atribuídas, entre outros atores do conflito, ao Estado peruano; de que, como parte dessas violações, aconteceram desaparecimentos forçados, execuções extrajudiciais e torturas (Conclusão Geral 55); e de que, entre os casos que, lamentavelmente, provocaram esses danos às pessoas está o de La Cantuta, agora em jurisdição supranacional.
[S]olicita à Corte que declare que, tendo cessado a controvérsia sobre os fatos alegados, o debate se circunscreva aos aspectos ou consequências decorrentes desses fatos, formulados em diversas pretensões da [Comissão] e dos representantes das supostas vítimas. […]
45. Em suas alegações finais orais e escritas a Comissão declarou, inter alia, que:
a) a confissão dos fatos por parte do Estado permite concluir que cessou a controvérsia quanto à detenção arbitrária, tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes e posterior desaparecimento forçado ou execução extrajudicial do professor e dos nove estudantes vítimas deste caso. A Comissão também entende que cessou a controvérsia relativa à ausência de uma investigação completa, imparcial e efetiva, associada à existência de atos destinados a esconder a verdade e os responsáveis pelos fatos, até o final de 2000, com a transição entre o governo de Alberto Fujimori e o de Valentín Paniagua. Manifesta sua satisfação pelo acatamento do Estado com respeito à responsabilidade internacional pela violação dos artigos 3, 4, 5, 7, 8 e 25 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em virtude dos fatos da demanda. […] A Comissão leva em conta a importância dessa manifestação e considera que constitui um passo positivo para a recuperação da memória e da dignidade das vítimas e da redução dos danos causados a seus familiares bem como para o incentivo a ações voltadas para a não repetição de situações similares;

  1. concorda com o Estado que o relatório da Comissão da Verdade e Reconciliação representa uma ferramenta fundamental na descoberta da verdade dos fatos e das violações relacionadas a este caso; e

  2. continuam ainda controvertidos importantes assuntos relacionados às conclusões a que a Comissão chegou com base nos fatos reconhecidos:

      1. embora admita a excessiva duração das investigações, até 2001, o Estado sustenta que, a partir desse momento, as investigações foram iniciadas e conduzidas com diligência. A Comissão observa que o reconhecimento se refere unicamente às violações cometidas durante o governo de Alberto Fujimori, e não compreende a responsabilidade estatal pelas violações às garantias judiciais e à proteção judicial que fazem com que o caso permaneça impune até hoje;

      2. a necessidade de que o Estado adote todas as medidas necessárias para formalizar e conferir certeza jurídica à falta de efetividade e não aplicabilidade das leis de anistia, mediante sua supressão do direito interno; e

      3. o alcance do dano causado aos familiares das vítimas e a necessidade de repará-lo integral e adequadamente.

46. Em seu escrito de petições e argumentos, bem como em suas alegações finais orais e escritas, as representantes declararam que:


a) o Estado, por meio de diferentes atos, reconheceu a participação de altas autoridades políticas e militares nos fatos denunciados. Nos contatos internacionais com os Estados das Nações Unidas e da OEA, especialmente com os governos do Japão e do Chile, por ocasião das solicitações de extradição do ex-presidente Alberto Fujimori, o Peru referiu-se, especificamente, à responsabilidade intelectual de Fujimori nos crimes de Barrios Altos e La Cantuta;

  1. o Estado reconheceu democraticamente e em boa medida a responsabilidade pelos fatos; entretanto, há pontos importantes pendentes neste caso, especialmente no que se refere à impunidade que ainda persiste; e

  2. as representantes das vítimas expressaram sua consideração ao Estado do Peru pela importância que o ato de reconhecimento de responsabilidade internacional “tem para [seus] representados e porque é um gesto que contribui para a preservação da memória histórica a respeito dos fatos denunciados durante este processo perante os órgãos do Sistema Interamericano”.

47. O artigo 53.2 do Regulamento da Corte estabelece que


[S]e o demandado comunicar à Corte seu acatamento às pretensões da parte demandante e às dos representantes das supostas vítimas, seus familiares ou representantes, a Corte, ouvido o parecer das partes no caso, resolverá sobre a procedência do acatamento e seus efeitos jurídicos. Neste caso, a Corte determinará, se for o caso, as reparações e custas correspondentes.
48. O artigo 55 do Regulamento da Corte estabelece que
[A] Corte, levando em conta as responsabilidades que lhe cabem em matéria de proteção dos direitos humanos, poderá decidir pelo prosseguimento do exame do caso, mesmo em presença das situações indicadas nos artigos precedentes.
49. No exercício dos poderes a ela inerentes de tutela judicial internacional dos direitos humanos, a Corte poderá determinar se um reconhecimento de responsabilidade internacional efetuado por um Estado demandado oferece base suficiente, nos termos da Convenção Americana, para prosseguir ou não o julgamento do mérito e a determinação das eventuais reparações e custas. Para esses efeitos, o Tribunal analisa a situação proposta em cada caso concreto.1
50. Nos casos em que houve acatamento e reconhecimento de responsabilidade internacional, resolvidos anteriormente pela Corte, esta estabeleceu que:
[…] o artigo 53[.2] do Regulamento se refere à hipótese em que um Estado demandado comunique à Corte que aceita os fatos e as pretensões da parte demandante e, consequentemente, aceita sua responsabilidade internacional pela violação da Convenção, nos termos expostos na demanda, situação que daria lugar a um encerramento antecipado do processo quanto ao mérito do assunto, conforme dispõe o Capítulo V do Regulamento. A Corte salienta que, com as disposições do Regulamento que entrou em vigor em 1º de junho de 2001, o escrito de demanda é constituído pelas considerações de fato e de direito, pelas petições quanto ao mérito do assunto e pelas solicitações das respectivas reparações e custas. Nesse sentido, quando um Estado acata a demanda deve indicar claramente se o faz somente quanto ao mérito do assunto ou se também abrange as reparações e custas. Caso o acatamento se refira somente ao mérito do assunto, a Corte avaliará se continua a etapa processual de determinação das reparações e custas.
[…] À luz da evolução do sistema de proteção de direitos humanos, no qual hoje as supostas vítimas ou seus familiares podem apresentar de maneira autônoma seu escrito de petições, argumentos e provas, além de reivindicações coincidentes ou não com as da Comissão, no caso de acatamento, deverá este expressar claramente se aceitam também as reivindicações formuladas pelas supostas vítimas ou seu familiares.2


  1. Reconhecimento do Estado quanto aos fatos

51. A Corte observa que o Estado reconheceu os fatos apresentados pela Comissão em sua demanda (par. 40 supra). Nesses termos tão amplos, e entendendo que a demanda constitui o marco fático do processo,3 o Tribunal considera que cessou a controvérsia sobre todos esses fatos.




    1. Acatamento do Estado quanto às pretensões de direito

52. A Corte observa que cessou a controvérsia a respeito da responsabilidade internacional do Estado pela violação dos direitos consagrados nos artigos 4 (Direito à vida), 5 (Direito à integridade pessoal) e 7 (Direito à liberdade pessoal) da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em detrimento dos senhores Hugo Muñoz Sánchez; Juan Mariños Figueroa; Bertila Lozano Torres; Roberto Teodoro Espinoza, Marcelino Rosales Cárdenas; Felipe Flores Chipana; Luis Enrique Ortiz Perea; Armando Amaro Cóndor; Heráclides Pablo Meza e Dora Oyague Fierro (par. 41 supra). Embora o Estado também tenha acatado a alegada violação do artigo 3 da Convenção, a Corte o analisará na seção pertinente (pars. 117 a 121 infra).


53. Também cessou parte da controvérsia a respeito da responsabilidade internacional do Estado pela violação dos direitos consagrados nos artigos 8 (Garantias judiciais) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento. Entretanto, o Estado argumentou que não lhe eram imputáveis outros aspectos relativos à “alegada falta de diligência do Estado […] ao não ter realizado uma investigação séria, imparcial, efetiva e em prazo razoável” para o esclarecimento dos fatos ocorridos e a punição dos autores desses fatos (pars. 41, 42 e 44 supra). Essas alegações serão oportunamente resolvidas pelo Tribunal.


54. Por outro lado, o Estado não reconheceu responsabilidade pelo alegado descumprimento do artigo 2 da Convenção.


    1. Acatamento do Estado quanto às pretensões sobre reparações

55. No presente caso, o Estado não acatou as pretensões sobre reparações apresentadas pela Comissão ou pelas representantes.


***

56. A Corte considera que o acatamento do Estado constitui uma contribuição positiva para o desenvolvimento desse processo e a vigência dos princípios que inspiram a Convenção Americana.4


57. Levando em conta as atribuições que o incumbem de zelar pela melhor proteção dos direitos humanos e o contexto em que ocorreram os fatos deste caso, o Tribunal considera que proferir uma sentença na qual se determinem os fatos e todos os elementos de mérito do assunto, bem como as respectivas consequências, constitui uma forma de contribuir para preservar a memória histórica, reparar os familiares das vítimas e, ao mesmo tempo, contribuir para evitar que se repitam fatos semelhantes.5 Dessa maneira, sem prejuízo do alcance do acatamento por parte do Estado, a Corte considera pertinente abrir o capítulo relacionado aos fatos deste caso, de maneira a abranger tanto os reconhecidos pelo Estado como os demais que sejam provados. Além disso, a Corte considera necessário tecer algumas considerações a respeito da maneira pela qual as violações ocorridas se manifestaram no contexto e nas circunstâncias do caso, bem como sobre o alcance das obrigações estabelecidas na Convenção Americana, assunto que abordará nos próximos capítulos.
58. Nesse sentido, nesses capítulos a Corte analisará as questões de mérito e das eventuais reparações em relação às quais permaneceu em aberto a controvérsia sobre a responsabilidade internacional do Estado, a saber:
os fatos e a alegada violação do direito à integridade pessoal em detrimento dos familiares das supostas vítimas, consagrada no artigo 5 da Convenção;

a suposta violação dos artigos 8 e 25 da Convenção Americana, em detrimento das supostas vítimas e seus familiares, quanto às alegações não reconhecidas pelo Estado (par. 53 supra);

o alegado descumprimento do artigo 2 da Convenção (par. 54 supra); e

os fatos relativos aos danos materiais e imateriais que teriam sido causados às supostas vítimas e a seus familiares bem como o que se refere à determinação das reparações e custas.


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