Mestrado em Sociologia Relações de poder no campo família empresária
Jorge
Rodrigues
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putativamente, descendentes de um ancestral comum, em linha uterina (Barry
et al.
2000). Estes laços de parentesco desempenham, no futuro, funções importantes na
estruturação das relações primárias entre os seus membros (Lima 2003, 160), pelo que
as famílias com origem nestes clãs, que só por si detenham capital ou influenciem as
políticas de gestão de uma empresa ou empresas, fazem destas organizações a chamada
empresa familiar.
Para ser uma família empresária não basta que os seus membros sejam parentes; têm de
partilhar um sentimento de identidade coletiva que os une através das gerações (Lima
2013, 161), o que faz desta um grupo especial, porquanto, é mais do que um grupo – é
uma equipa – que persegue objetivos de negócio (D’Allura
et Erez 2009) e surge
quando alguma das gerações das famílias A ou B, para além da geração do fundador,
ou
de ambas as famílias, detêm capital ou influenciem as políticas de gestão de uma ou
mais empresas familiares. Esta sociedade, se multifamiliar, tem como principal
caraterística a relação de confiança que constroem entre si, pela liberdade de escolha
que tiveram, criando vínculos que poderão ser mais fortes que apenas os provocados
pelo afeto familiar, o que não deixa de representar um desafio para as próximas
gerações (Bernhoeft
et Gallo 2003, 12). A manutenção desta sociedade multifamiliar
através das gerações requere, não só êxito económico – condição necessária mas não
suficiente, só por si –, mas também que esta comunidade de pessoas estejam unidas pelo
facto de pertencerem à mesma organização, partilharem uma missão comum e
disfrutarem de relações estáveis entre si (Gallo
et al. 2009, 39).
A família empresária pode ser, portanto, assimilada a uma comunidade de práticas, de
representações e de valores, que une pessoas que partilham um conjunto de relações
próximas e que se reconhecem como membros de um coletivo, que partilham um
passado comum e no presente dão continuidade aos laços de afinidade, hábitos e valores
que têm em comum, reproduzindo a rede de solidariedade que as une (Lima 2003, 159).
É por isso que a família empresária promove o espírito empreendedor no seu seio,
particularmente, entre os membros da geração seguinte; este espírito empreendedor é
algo que se transmite de pais para filhos e representa a diferença entre um empresário e
um mero administrador do negócio (Gallo
et al. 2009, 46-48). As pessoas que
pertencem a um grupo desta natureza tendem também a integrar os seus filhos na rede
de sociabilidade em que estão inseridas. Através das suas solidariedades primárias, os
indivíduos criam uma comunidade de ação que estabelece, simultaneamente, as bases
que permitem a sua continuidade nas gerações seguintes, lançando, desta forma, as
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bases sobre as quais se reproduzirão, ao longo de sucessivas gerações, o conjunto de
valores e ideais que partilham (Lima 2003, 159). Este tipo de acesso ao conhecimento
que não é ensinado nas escolas, mas informalmente, no âmbito da família e das relações
sociais dentro do seu grupo de pertença, irá permitir aos jovens membros da família
empresária, mais tarde, distinguirem-se face aqueles que não têm as suas origens numa
família empresária, e leva-os a assumirem papéis de liderança ou de administração nas
empresas da família (Lima 2003, 168). Este tipo de património familiar – capital
simbólico – que promove a distinção social e reproduz os valores e os ideais da família
empresária, é construído no tempo ao longo das sucessivas gerações (Lima 2003, 169).
In extremis, a família empresária coincide com a família na sua forma alargada, quando
esta estiver na, ou para além, da segunda geração; nos restantes casos, a família
empresária será um subconjunto da família alargada. Logo, uma família empresária
poderá estar presente em uma ou em várias empresas familiares; já a empresa familiar,
no que se refere à posse do seu capital, no todo ou em parte, é definida por referência a
uma ou mais famílias empresárias. Acontece que o conceito de família empresária está
associado a um grupo social constituído por um núcleo central (ou clã) a que se
acrescentam elementos externos. A família empresária, por norma, é um sistema aberto,
intergeracional, com um perímetro de geometria variável, com fluxos de entrada e de
saída no sistema, seja por causas naturais (nascimento e morte), seja por razões de
ordem social (adoção, casamento, divórcio) ou outras, gerando assim combinatórias
sempre originais, podendo torná-la potencialmente disfuncional, geradoras de conflitos
inter-membros e/ou intra-clãs, como vimos anteriormente.
Logo, a família empresária é um grupo social com consciência de si próprio, cujos
membros partilham um modo de vida, um conjunto de interesses, ideais, atitudes,
formas de comportamento, formas de ser,
fazer e vestir, que se adquirem durante longos
períodos de tempo em contextos sociais informais como a família ou o clube e nas
atividades extracurriculares de escolas exclusivas (Lima 2003, 158). Ainda, a família
empresária é uma coleção diversificada de organizações, com a maioria delas a
distinguir-se pelas suas preferências sócio emocionais (Romero
et Ramirez 2016) mais
do que pelos objetivos económios, e onde a definição daqueles objetivos atendem aos
desejos da família, como sejam a manutenção do controlo da empresa familiar,
proporcionar emprego aos membros da família e estabelecer a reputação da família na
comunidade (Miller
et al., 2015: 20).