Mestrado em Sociologia Relações de poder no campo família empresária
Jorge
Rodrigues
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Introdução
Um dos debates mais promissores entre académicos, entidades governamentais,
sociólogos, antropólogos, psicólogos e teólogos, só para citar algumas áreas do
conhecimento, prende-se com a definição do conceito família.
Será que o conceito e a família variaram no tempo?
A resposta é afirmativa
e o modo como a família é definida afeta significativamente os
resultados dos estudos empíricos (Bettineli
et al. 2014, 178).
A família sofreu uma série
de transformações – desde Engels (1884) ou Malinowski (1922) – e as mudanças
continuam a acontecer (Aldrich
et Cliff 2003, 580; Giddens 2013, 373). Apesar de não
atuarem da mesma forma, quase todas as sociedades se organizam em famílias, mas a
caraterização destas difere, pois, a família é produto do sistema social e reflete o estado
da cultura desse sistema, moldando-se às condições de vida que dominam num
determinado espaço de tempo (Giddens 2013, 371-372). O conceito de família com base
nas relações de parentesco obtidas através da consanguinidade e do casamento deu
lugar, a partir dos anos 1960, ao modelo ideal de família, uma extensão do modelo ideal
preconizado na modernidade, a qual enfatiza o amor romântico, o matrimónio ideal e o
afeto como base da vida familiar (Machado 2005, 319).
A realidade do Séc. XXI mostra um declínio do casamento, um aumento dos divórcios,
múltiplos arranjos conjugais e novos laços de parentesco, em combinatórias sempre
originais, a caminho do nomadismo conjugal (Déchaux 2009, 28-30), o que exige o
recurso a modernidades múltiplas (Eisenstadt 2001), como forma de gerir a existência
de padrões culturais diversificados, complexos e moventes, numa sobreposição
coexistente de diferentes tempos históricos (Almeida 2013, 27-28). Assim, estar vivo é
mudar constantemente, pois, cada experiência e cada decisão afeta todas as outras que
se seguem, pelo que os sistemas e organizações também envelhecem e mudam pela
passagem do tempo (Gersick
et al. 1997, 16).
No caso particular da família [empresária] que detém empresas [familiares], existe a
necessidade de consenso entre aqueles que fazem parte dela, devido aos significativos
bens em comum, e à intensidade dos contatos – pelo menos para alguns dos seus
membros –, os quais permanecerão elevados durante toda a vida (Gersick
et al. 1997,
63). Assim, a definição clara a respeito dos limites da família é útil para decidir quem
tem responsabilidades pela empresa e quem merece beneficiar com ela (Gersick
et al.
1997, 102). A resposta à questão “Quem é família?” tem sido tentada em função da
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dinâmica do conceito família através dos tempos. Da aceitação da sua definição irá
depender a evolução do negócio
familiar, a liderança da família ou a divisão da herança.
Contudo, um modelo não capta a realidade, somente a sugere (Gersick
et al. 1997, 288),
pelo que, mesmo utilizando a definição mais ampla do termo família (Gersick
et al.
1997, 62)
continua por definir, inequivocamente, o que é a família empresária.
0.1
Problema a abordar
Continuando o raciocínio anterior e no contexto desta dissertação em Sociologia – área de
especialização em Sociologia Económica e das Organizações, a questão de investigação
para a qual se procura resposta pode sintetizar-se em: O que é uma família empresária?
Assim, procura-se delimitar concetualmente este construto e, através de uma aplicação
exploratória a dois casos de estudo, verificar a sua aderência à realidade. É muito mais o
que não se sabe do que aquilo que se sabe sobre a família empresária, devido á habitual
discrição dos membros destas famílias, daí, a pertinência da questão de investigação. Por
família empresária entenda-se um conjunto de pessoas, com vínculos familiares formais
ou informais,
entre elas, que promovem a implementação de boas práticas e o
desenvolvimento de vantagens competitivas nos negócios de que são proprietários, no
pressuposto de estes serem ou virem a ser a fonte de criação de riqueza para todos
(Serrano
et al. 2006).
Logo, a família empresária será um sistema aberto, intergeracional, com um perímetro de
geometria variável, com fluxos de entrada e de saída no sistema, seja por causas naturais
– nascimento e morte –, seja por razões de ordem social – adoção, casamento, divórcio
(Gallo
et al. 2009), gerando assim combinatórias sempre originais, podendo torná-la
potencialmente disfuncional e geradora de conflitos inter-membros e/ou intra-clãs
(Gersick
et al. 1997, 16). A continuidade dos negócios familiares é, em geral, baixa, com
a maioria das crises a ser originada involuntariamente, pois, nenhum empresário pensará
em prejudicar o seu negócio ou as relações familiares, quando decide que a sua família se
relacione com a empresa que ele próprio fundou (Bernhoeft
et Gallo 2003).