Neblina Sobre Mannheim Bernhard Schlink e Walter Popp



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- Como é que vai ser hoje, ao fim da tarde, com o trânsito do regresso a casa?

O Herzog encolheu os ombros.

- Temos de esperar para ver como o gás de cloro se comporta. Esperamos poder evacuar os trabalhadores e empregados das IQR durante a tarde, isso já aliviaria substancialmente

o problema do trânsito do regresso a casa. Uma parte dos que trabalham noutros lados talvez tenha de dormir no local de trabalho. Nesse caso, divulgá-lo-emos pela

rádio e por carros com altifalantes. Há pouco, fiquei admirado com a rapidez com que conseguimos esvaziar as ruas.

- Pensa numa evacuação?

- Se a concentração de cloro gasoso não diminuir para metade nas próximas doze horas, teremos de evacuar a leste da Rua Leuschner, e se calhar também a Neckerstadt

e o Jung-busch. Mas os meteorologistas deram-nos esperança. Onde quer que o deixe?

- Se a concentração de monóxido de carbono no ar o permitir, ficaria muito contente se pudesse levar-me até à porta de minha casa, na Rua Richard Wagner.

- Apenas por causa da concentração de monóxido de carbono, nunca teríamos feito soar o alarme de smog. O pior é o cloro, neste caso prefiro saber que as pessoas

estão em casa ou no escritório, e de maneira nenhuma na rua.

Parou diante da minha casa.

- Senhor Selb - disse ele ainda -, o senhor não é detective privado? Penso que o meu antecessor trabalhou consigo. Ainda se lembra do conselheiro Bender e daquela

história com os veleiros?

- Espero que este não seja um caso para nós dois - disse eu. -Já sabe alguma coisa sobre a causa da explosão?

- Tem alguma suspeita, senhor Selb? Não era por acaso que o senhor estava no local do acontecimento. As IQR estavam à espera de algum atentado?

- Não sei nada disso. A minha investigação é comparativamente mais inocente e vai numa direcção completamente diferente.

- A ver vamos. Talvez ainda tenha de lhe fazer umas perguntas na esquadra - olhou para cima, para o céu. - E agora, reze por um vento forte, senhor Selb.

Subi os quatro degraus da entrada de minha casa. A ferida do braço recomeçara a sangrar. Mas estava preocupado com outra coisa. Iria a minha investigação realmente

num sentido Completamente diferente? Teria sido um acaso que o Schnei-(ler não tivesse ido trabalhar naquele dia? Teria eu abandonado depressa de mais a ideia da

chantagem? Ter-me-ia o Firner dito tudo?

8

Pois sim



Tirei o gosto a cloro da boca com um copo de leite, e tentei pôr uma ligadura nova. Fui interrompido pelo telefone.

- Senhor Selb, foi o senhor que eu vi há bocado, saindo das IQR com o Herzog? A fábrica pediu-lhe que investigasse?

Era o Tietzke, um dos últimos jornalistas honestos. Depois da extinção do jornal Heidelherger Tageblatts, fora a muito custo que conseguira trabalho no Rhein-Neckar-Zeitung,

e estava numa situação difícil.

- Que investigações? Não fique com ideias erradas, Tietzke. Eu estava nas IQR por causa de um outro assunto, e ficar-lhe-ia agradecido se esquecesse que me viu.

- Se eu não posso descrever o que vi, tem de me dizer um pouquinho mais.

- Mesmo com a melhor das boas vontades, não posso falar-lhe do assunto. Mas posso tentar arranjar-lhe uma entrevista exclusiva com o Firner. Tenho de lhe telefonar

ainda hoje à tarde.

Demorei metade da tarde a conseguir apanhar o Firner entre duas reuniões. Ele não podia confirmar nem refutar que tivesse havido sabotagem. O Schneider, segundo

informações da mulher, estava de cama com uma otite. Então, também o firner se interessara em saber a razão pela qual o Schneider não fora trabalhar... Embora contrariado,

dispunha-se a receber o Tietzke na manhã seguinte. A senhora Buchendorff entraria em contacto com ele.

Depois disso, tentei telefonar ao Schneider. Ninguém atendeu, o que poderia significar tudo ou nada. Deitei-me na Cama, consegui adormecer apesar das dores no braço,

e voltei a acordar à hora do telejornal. Nas notícias, comunicava-se que a nuvem de cloro gasoso estava a levantar em direcção a leste e que o perigo, que nunca

existira, acabaria no decorrer da noite. A interdição de sair à rua, que também não existira, Iria terminar às 22 horas. Encontrei um bocado de gorgonzola no congelador

e fiz um molho com as tagliatelle que trouxera de Roma havia dois anos. Foi divertido. Era necessário haver uma interdição de sair para que eu voltasse a cozinhar.

Não precisei do relógio para me aperceber de que eram 22 horas. Nas ruas, o barulho era tanto que parecia que o Wald-hof tinha ganho o campeonato alemão. Pus o meu

chapéu de palha e fui ao Rosengarten. Um conjunto chamado Just forfun tocava canções dos bons velhos tempos. O tanque escadeado da Fonte não continha água e alguns

jovens dançavam lá dentro. Dei uns passos de fox trot - o saibro e as articulações queixaram-se.

Na manhã seguinte, havia um folheto com o porte pago na minha caixa do correio, enviado pelas Indústrias Químicas do Reno, em que era assumida uma tomada de posição

inamovível sobre o incidente. "As IQR protegem a vida", fiquei a saber, também que a vertente mais importante da investigação actual era a conservação da vitalidade

da floresta alemã. Pois sim. Juntamente com o folheto havia um pequeno cubo de plástico com uma semente sã de pinheiro alemão. Era patusco de ver. Mostrei o objecto

ao meu gato e coloquei-o sobre o lintel da chaminé.

Passeando sem pressa pelos Planken, comprei no talho do mercado um pãozinho quente com Leberkãse e mostarda, fiz uma visita ao turco das azeitonas boas, vi os esforços

inúteis dos Verdes, que com o seu quiosque informativo na Praça Parade tentavam perturbar a sintonia entre as IQR e a população de Mannheim, e reconheci, entre as

pessoas presentes, o Herzog, que ia deixando que o atafulhassem de panfletos.

À tarde, fui sentar-me no Parque Luisen. Paga-se para entrar, como nos parques de diversões. Por isso, no início desse ano comprara pela primeira vez uma entrada

anual, que tencionava ir amortizando. Quando não estava a observar os reformados quedavam de comer aos patos, lia o romance Grúnen Heimich. O nome próprio da senhora

Buchendorff levara-me a isso.

Às cinco horas fui para casa. Coser o botão do smoking custou-me uma boa meia hora por causa do meu braço inutilizado. Fui de táxi da torre de água ao Casino das

IQR. Havia, sobre a entrada, uma faixa com caracteres chineses. Nos três mastros esvoaçavam ao vento as bandeiras da República Popular da China, da República Federal

da Alemanha e das IQR. À direita e à esquerda da entrada estavam duas raparigas do Palatinado trajadas a rigor, parecendo tão autênticas como bonecas Barbie vestidas

de "Múnchener Kindl". A chegada dos carros estava no auge. Tudo parecia muito honrado e digno.

9

Meteu a mão no decote da Economia



O Schmalz estava no átrio.

- Como está o seu filho?

- Bem, obrigado. Depois poderia falar com o senhor? Queria agradecer-lhe. Agora tenho de ficar aqui.

Subi as escadas e entrei no salão pelas portadas abertas. As pessoas estavam de pé em pequenos grupos, os empregados e empregadas de mesa serviam champanhe, sumo

de laranja, champanhe com sumo de laranja, Campari com sumo de laranja e Campari com água mineral. Vagueei um pouco por ali. Era como em todas as outras recepções,

antes de os discursos serem pronunciados e de o buffet ser servido. Procurei rostos conhecidos e encontrei a ruiva das sardas. Trocámos sorrisos. () Firner puxou-me

para um grupo e apresentou-me três chineses, cujos nomes eram compostos, em combinações alternadas, por San, Yin e Kim, assim como o senhor Oelmúller, responsável

pelo Centro de Informática. O Oelmúller tentava explicar aos chineses o que é a Protecção de Dados na Alemanha. Não sei o que eles achavam de tão engraçado no assunto,

de qualquer maneira ria como chineses de Hollywood - um filme baseado num livro da Pearl S. Buck.

Depois, vieram os discursos. O do Korten foi brilhante. Dissertou de Confúcio a Goethe, saltou a Revolta dos Boxers e a Revolução Cultural, e apenas se referiu à

antiga filial das IQR em Kiautchou para fazer um elogio aos chineses, porque fora lá que o último dirigente dessa filial aprendera com eles um novo processo de fabrico

do azul-ultramarino.

O chefe da delegação chinesa respondeu não menos habilmente. Falou sobre os seus anos de estudante em Karlsruhe, fez uma vénia à cultura e à economia alemã de Bòll

até Schle-yer, utilizou linguagem técnica que eu não compreendi, e terminou com a frase de Goethe "Já não é possível separar o Oriente do Ocidente".

Depois do discurso do Ministro-Presidente da Renânia-Palatinado, até mesmo um buffet menos soberbo teria deixado uma impressão carismática. Para começo, escolhi

ostras com açafrão em molho de champanhe. Ainda bem que havia mesas. Odeio recepções de pé, em que fazemos equilibrismo com o cigarro, o copo e o prato, e onde deveria

haver alguém que nos levasse a comida à boca. Vislumbrei numa mesa a senhora Buchendorff e uma cadeira vazia. Estava deslumbrante no seu conjunto de seda selvagem

cor de anilina. A blusa tinha os botões todos.

- Posso sentar-me aqui?

- Pode ir buscar uma cadeira, ou quer sentar já ao seu colo a perita em segurança chinesa?

- Diga-me, os chineses aperceberam-se da explosão?

- Que explosão? Não, falando a sério, eles estiveram primeiro no palácio de Eltz e depois foram experimentar o novo Mercedes ao Núrburgring. Quando voltaram, já

tudo tinha acabado, e a imprensa refere-se hoje ao assunto sobretudo do ponto de vista meteorológico. Como é que está o seu braço? O senhor é uma espécie de herói...

infelizmente, isso não pôde aparecer nos jornais, embora tivesse dado uma bela história.

A chinesa apareceu. Tinha tudo o que faz os alemães sonharem com as asiáticas. Se era mesmo a perita em segurança, isso eu também não consegui descobrir. Perguntei-lhe

se na China existiam detectives privados.

- Não há propriedades privadas, não há detectives privado> - respondeu ela, e perguntou se na República Federal da Alemanha também existiam mulheres detectives privados.

Isso conduziu a considerações sobre os subjacentes movimentos feministas.

- Li quase tudo o que foi publicado na Alemanha de literatura feminina. Como é que é possível que na Alemanha os homens escrevam literatura feminina?

O chefe de mesa transmitiu-me o convite para a mesa do Oelmúller. De caminho servi-me, como segundo prato, de rolinhos de linguado à Vereador de Bremen.

O Oelmúller apresentou-me os outros comensais da mesa entre os quais um que me impressionou pela habilidade pedante com que arrumara sobre o crânio os seus escassos

cabelos: o Professor Ostenteich, chefe do Departamento de Direito e Professor Honorário da Universidade de Heidelberg. Não era por acaso que aqueles senhores comiam

à mesma mesa Agora, tinha de começar a trabalhar. Desde a conversa com o Herzog que uma questão me preocupava.

- Os senhores poder-me-iam explicar o novo plano anti-smog? O senhor Herzog, da Polícia, falou-me dele e também mencionou que não era absolutamente incontroverso.

Por exemplo, o que devo compreender por registo directo de emissões de poluentes?

O Ostenteich sentiu-se obrigado a liderar a conversa.

- Isso é un peu délicat, como diriam os franceses. O senhor deveria ler o parecer do Professor Wenzel, que compila a problemática competente de uma maneira minuciosa

e que décou fiert a injusta pretensão legislativa de Baden-Wúrtenberg e da Kenània-Palatinado. Lepouvoir arrete lepouvoir... a regnlamentação federal da Lei do Controlo

de Emissões bloqueia esses caminhos alternativos legais das regiões. Junte-se a isso o direito à propriedade privada, a protecção da actividade empresarial e da

confidencialidade das sociedades. O legislador pensa poder arrumar isso tudo com uma só penada. Mais la vérité est en marche, ainda existe, heureusement, o Tribunal

Constitucional em Karlsruhe.

- E então como é que funciona o novo modelo de alarme de smog? - lancei um olhar de desafio ao Oelmúller.

O Ostenteich não deixou que lhe retirassem a liderança da conversa assim tão facilmente.

- Ainda bem que também pergunta acerca do lado técnico, senhor Selb. Isso poderá o nosso senhor Oelmúller explicitar já. O nosso problema é que o Estado e a Economia

só suportam andar lado a lado e um com a outra quando entre ambos subsiste uma certa distance. E, permita-me por favor esta imagem ousada, neste caso o Estado mediu

mal as distâncias e meteu a mão no decote da Economia.

Riu-se vigorosamente, e o Oelmúller sentiu-se obrigado a imitá-lo.

Quando voltou a paz, ou, como um francês diria, o silence, o Oelmúller disse:

- Tecnicamente, tudo isto é muito simples. A protecção do meio ambiente baseia-se, de um modo geral, na medição da concentração de produtos poluentes no agente de

transporte das emissões, seja ele a água ou o ar. Quando os valores máximos permitidos são ultrapassados, tenta-se identificar a fonte de emissão e desligá-la. O

smog só pode formar-se quando uma ou outra fábrica emite maior quantidade de poluentes do que o permitido. Por outro lado, o smog também se forma quando as emissões

das várias fábricas se mantêm dentro dos valores permitidos, mas as condições meteorológicas não as eliminam.

- E o responsável pelo alarme do smog, como é que ele sabe de que espécie de smog se trata? É óbvio que tem que reagir de maneira muito diferente nos dois casos.

Aquilo começava a interessar-me; adiei a minha ida seguinte ao buffet e rebusquei um cigarro no pequeno maço amarelo.

- Correcto, senhor Selb, na verdade dever-se-ia reagir de maneira diferente nos dois casos, mas com os métodos actuais as duas situações são muito difíceis de distinguir.

Pode acontecer, por exemplo, que se pare todo o trânsito e que as fábricas tenham de estrangular as suas produções, embora tenha sido apenas uma fábrica de carvão

a ultrapassar os valores máximos permitidos para a emissão de poluentes, mas que não pôde ser atempadamente identificada e impedida de laborar. O que é sedutor no

novo modelo de registo directo da emissão de poluentes é que, pelo menos teoricamente, vão evitar-se os problemas que o senhor acabou justamente de mencionar. A

emissão de poluentes é medida por sensores nos lugares onde se origina, e os valores são transmitidos a uma central que, dessa maneira, a qualquer momento sabe onde

e que tipo de emissões estão a ser libertadas. E não apenas isto; a central transfere os valores das emissões para uma simulação do estado do tempo local previsto

para as vinte e quatro horas seguintes (aquilo a que chamamos gráfico meteorológico) e podemos assim prever, de certa maneira, a ocorrência de smog. Um sistema de

aviso antecipado que não funciona lá muito bem na prática, como teoricamente parecia possível, porque a meteorologia ainda está a dar os primeiros passos.

- Qual é a sua opinião sobre o incidente de ontem, nesse contexto? O novo modelo satisfez ou falhou?

- Apesar de tudo, pode dizer-se que funcionou bem.

O Oelmúller retorcia, pensativamente, a ponta da barba.

- Não, não, senhor Selb, neste momento, tenho que alargar a perspectiva do técnico para um tour d'horizon global económico. Antigamente, o dia de ontem simplesmente

nunca teria acontecido. Mas ontem tivemos o caos com todos aqueles anúncios por altifalantes, os controlos da polícia, a interdição de sair à rua. E para quê? A

nuvem dissipou-se sem qualquer Intervenção dos defensores do meio ambiente. Atiçou-se o medo, destruiu-se a confiança e prejudicou-se a imagem das IQR... tant de

bruitpour une omelette. Eu acho que é exactamente um caso como este que podemos utilizar no Tribunal Constitucional, para exemplificar os excessos do novo regulamento.

- Os nossos químicos estão a investigar se os valores de Ontem conseguem sequer justificar o accionamento do alarme do smog - O Oelmúller voltava a usar da palavra.

- Começaram logo a analisar os dados das emissões de poluentes que nós também recolhemos no nosso sistema IGF, o sistema de informação de gestão e da fábrica.

- A indústria sempre teve o direito de receber on-line os resultados das análises feitas pelo Estado - disse o Ostenteich.

- Acha possível, senhor Oelmúller, que exista uma relação entre o acidente e os incidentes no sistema informático?

- Já pensei nisso. Nós controlamos electronicamente quase todos os processos de produção, e há muitas ligações directas entre os computadores que controlam os processos

e o sistema IGF. Manipulações a partir do sistema IGF? Não posso excluir essa hipótese, apesar da existência de inúmeras seguranças internas. Na verdade, ainda não

sei o suficiente sobre o acidente de ontem para poder dizer se uma suspeita dessas tem pés para andar. E, se reverificar, é terrível o que pode vir a acontecer-nos.

Com a interpretação que o Ostenteich fez do acidente da véspera, quase me esqueci de que ainda andava de braço ao peito. Bebi à saúde dos senhores e pus-me a caminho

do buffet. Com os lombinhos de cabrito em molho de ervas no prato aquecido, tomara o rumo da mesa do Firner quando o Schmalz se dirigiu a mim.

- Poderemos, a minha mulher e eu, convidar o doutor para tomar um café?

Pelos vistos, o Schmalz descobrira o meu título de doutor e preferira aderir a ele, para neutralizar mais um ceceio.

- É muito amável, senhor Schmalz. - agradeci. - Mas, por favor, compreenda que, até à conclusão deste caso, não poderei dispor livremente do meu tempo.

- Bem, então fica para outra altura.

O Schmalz ficou com um ar infeliz, mas que a fábrica tivesse prioridade, isso ele compreendia.

Olhei em volta à procura do Firner e encontrei-o no momento em que se dirigia do buffet, com um prato, para a sua mesa.

Ficou parado por um breve instante.

- Saúdo-o! Descobriu alguma coisa?

Segurava o prato desajeitadamente à altura do peito, para esconder uma nódoa de vinho tinto na camisa.

- Sim - respondi eu simplesmente. - E o senhor?

- O que quer dizer com essa pergunta, senhor Selb?

- Imagine que temos um chantagista que quer demonstrar a sua superioridade, primeiro através da manipulação do sistema IGF, e depois provocando uma explosão de gás.

Seguidamente, exige dez milhões às IQR. Na fábrica, quem é seria o primeiro a ter as exigências sobre a mesa?

- O Korten. Porque só ele é que pode decidir sobre um montante dessa ordem de grandeza.

Franziu a testa e, sem querer, olhou para a mesa ligeiramente sobrelevada onde o Korten se sentava com o chefe da delegação chinesa, o Ministro-Presidente e outras

personalidades importantes. Esperei em vão por um apaziguador: "Mas, senhor Selb, o que está a pensar!".

Baixou o prato. A mancha de vinho tinto tornou desnecessariamente ainda mais visível, por detrás da fachada de superioridade serena, um Firner tenso e inseguro.

Como se eu já lá estivesse, deu uns passos, imerso em pensamentos, em direcção à janela aberta. Depois controlou-se, voltou a pôr o prato diante do peito, fez um

breve aceno de cabeça na minha direcção e dirigiu-se com passos decididos para a sua mesa. Eu fui à casa de banho.

- Então, meu querido Selb, isso vai andando?

() Korten colocou-se no outro urinol e dedilhou a braguilha.

- Referes-te ao caso ou à próstata?

Ele urinava e ria-se. Começou a rir-se cada vez mais alto, leve de se apoiar aos azulejos com a mão, e então também eu me lembrei. Já havíamos estado uma vez assim,

ao lado um do Outro, na casa de banho do Friedrich-Wilhelm. Tinha-no-lo planeado como medida preparatória para uma balda às aulas; quando o professor desse pela

nossa falta, o Bechtel deveria levantar-se e dizer: "O Korten e o Selb sentiram-se mal há bocadinho e estão na casa de banho... eu vou num instantinho ver como estão".

Mas o professor foi averiguar pessoalmente; encontrou-nos de pé, muito alegres, e obrigou-nos a continuar ali de pé durante toda a aula, controlados de vez em quando

pelo contínuo.

- Vem aí o professor Brecher com o monóculo - ofegou o Korten.

- O Mete-nojo, vem aí o Mete-nojo - lembrei-me da alcunha, e ali estávamos nós de braguilhas abertas, a darmos palmadas nos ombros um do outro, e vieram-me as lágrimas

aos olhos e a barriga doía-me de tanto rir.

Nessa altura, a coisa quase acabou mal. O Brecher fizera queixa de nós ao reitor, e eu já imaginava o meu pai furibundo e a minha mãe chorosa e a bolsa de estudos

a voar. Mas o Korten assumira toda a responsabilidade: ele fora o instigador, eu apenas o seguira. Por isso teve uma carta enviada para casa, e o seu pai apenas

se rira.

- Tenho de ir.

O Korten abotoou a braguilha.

- Já?


Ainda continuava a rir-me. Mas acabara-se a brincadeira, e os chineses esperavam.

10

Recordações do Adria azul



Quando voltei para a sala, estavam todos de partida. Ao passar por mim, a senhora Buchendorff perguntou-me como é que iria para casa; era óbvio que eu ainda não

conseguia guiar com o braço naquele estado.

- Vim cá ter de táxi.

- Terei muito gosto em dar-lhe boleia, afinal somos vizinhos. Daqui a um quarto de hora, na saída?

As mesas jaziam abandonadas, formavam-se grupinhos de pessoas em pé e voltavam a afastar-se. A ruiva tinha ainda uma garrafa a postos, mas já todos haviam bebido

o suficiente.

- Olá - disse-lhe eu.

- Gostou da recepção?

- O buffet era bom. Estou admirado por ainda restar alguma coisa. Mas uma vez que é o caso... poderia mandar preparar um pequeno farnel para o meu piquenique de

amanhã?


- Para quantas pessoas? - Esboçou uma vénia irónica.

- Se tiver tempo, para duas.

- Oh, eu não posso. Mas vou pedir para embrulharem alguma coisa para dois. Um momento.

Desapareceu pelas portas de batente. Quando reapareceu, trazia uma grande caixa de cartão.

- Devia ter visto a cara do nosso cozinheiro-chefe. Tive de lhe dizer que o senhor é esquisito, mas importante. - Riu-se. - Como o senhor almoçou com o nosso director-geral,

ele tomou a iniciativa de juntar ainda uma Foster Bischofsgarten Spãtlese.

Quando a senhora Buchendorff me viu com a caixa de cartão, ergueu as sobrancelhas.

- Empacotei a perita em segurança chinesa. Não reparou como ela é pequenina e graciosa? O chefe da delegação não deveria tê-la deixado ir comigo.

Só me vinham à cabeça gracinhas tolas. Se isto se passasse há trinta anos, teria de confessar a mim mesmo que estava apaixonado. Mas o que devo achar disto, numa

idade em que já não me apaixono?

A senhora Buchendorff guiava um Alfa Romeo Spider, um modelo antigo sem o feio aileron traseiro.

- Quer que baixe a capota?

- Normalmente ando de mota em calções de banho, até de Inverno.

Estava a ficar cada vez pior. Ainda por cima, agora também havia um mal-entendido, porque ela se dispunha a fechar a capota. E só porque eu não me atrevera a dizer

que não havia nada melhor para mim do que dar um passeio, numa cálida noite de Verão, com uma mulher bela ao volante de um cabriolei.

- Não, deixe estar, senhora Buchendorff, eu gosto muito de andar de descapotável aberto numa noite cálida de Verão.

Passámos pela nova ponte suspensa; debaixo de nós, o Reno e o cais. Olhei para cima, para o céu por entre os cabos de suspensão. Estava claro e estrelado. Ao mudarmos

de direcção, à saída da ponte, e antes de mergulharmos nas ruas, por um instante Mannheim apareceu diante de nós, com as suas torres, igrejas e arranha-céus. Tivemos


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