Sífilis: Diagnóstico, tratamento e controle
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An Bras Dermatol. 2006;81(2):111-26.
considerar a fase evolutiva da doença. Na sífilis primá-
ria e em algumas lesões da fase secundária, o diagnós-
tico poderá ser direto, isto é, feito pela demonstração
do treponema. A utilização da sorologia poderá ser
feita a partir da segunda ou terceira semana após o
aparecimento do cancro, quando os anticorpos
começam a ser detectados.
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PROVAS DIRETAS
Demonstram a presença do
T. pallidum e são
consideradas definitivas, pois não estão sujeitas à
interferência de mecanismos cruzados, isto é, falso-
positivo. Têm indicação na fase inicial da enfermida-
de, quando os microorganismos são muito numero-
sos. Encontram sua indicação na sífilis primária e
secundária em lesões bolhosas, placas mucosas e con-
dilomas. O emprego de material procedente da
mucosa oral deverá considerar a possibilidade de difi-
culdade na distinção entre o treponema e outros
espiroquetas saprófitas da boca, exceto no caso do
teste de imunoflorescência direta.
19,21
A – EXAME EM CAMPO ESCURO
O teste consiste no exame direto da linfa da
lesão. O material é levado ao microscópio com con-
densador de campo escuro, em que é possível, com
luz indireta, a visualização do
T. pallidum vivo e
móvel. É considerado um teste rápido, de baixo custo
e definitivo. A sensibilidade varia de 74 a 86%, poden-
do a especificidade alcançar 97% dependendo da
experiência do avaliador.
38,39
B – PESQUISA DIRETA COM MATERIAL CORADO
Os métodos utilizados são: Fontana-
Tribondeau, método de Burri, Giemsa e Levaditi.
No método de Fontana-Tribondeau após a cole-
ta da linfa é feito um esfregaço na lâmina com adição
da prata. A prata por impregnação na parede do tre-
ponema torna-o visível. O metodo de Burri utiliza a
tinta da China (nanquim).
Na coloração pelo Giemsa o
T. pallidum cora
tenuamente (palidamente), sendo difícil a observação
do espiroqueta; e, por fim, o método de Levaditi usa
a prata em cortes histológicos. Todos os métodos de
coloração são inferiores ao campo escuro.
21
C – IMUNOFLUORESCÊNCIA DIRETA
Exame altamente específico e com sensibilida-
de maior que 90%. Praticamente elimina a possibilida-
de de erros de interpretação com treponemas sapró-
fitas. É chamado de DFA-TP (
diret fluorescent-anti-
body testing for T. pallidum)
PROVAS SOROLÓGICAS
O
T. pallidum no organismo promove o desen-
volvimento de dois tipos de anticorpos: as reaginas
(anticorpos inespecíficos IgM e IgG contra cardiolipi-
na), dando origem aos testes não treponêmicos, e
anticorpos específicos contra o
T. pallidum,
que ori-
ginaram os testes treponêmicos. Os testes não trepo-
nêmicos são úteis para triagem em grupos populacio-
nais e monitorização do tratamento, enquanto os tre-
ponêmicos são utilizados para confirmação do diag-
nóstico.
A – TESTES NÃO TREPONÊMICOS
Os primeiros testes para diagnóstico da sífilis
foram reações de fixação de complemento. As reações
de Wassermann e Khan utilizavam material extraído
de tecidos de difícil estandardização e acabaram
cedendo lugar aos antígenos mais purificados, como
o VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) que
Caso confirmado: quando o T. pallidum ou seu material genético é constatado fisicamente em amostras de lesões,
líquido amniótico, cordão umbilical ou de tecidos oriundos da necropsia
Caso presuntivo: quando pelo menos um dos seguintes parâmetros está presente:
1 – RN ou criança cuja mãe contaminada não tenha sido tratada ou o foi de forma inadequada;
2 – RN ou criança exibindo teste treponêmico positivo e algumas das seguintes alterações: evidência de sífilis congênita
ao exame físico; alterações radiológicas; VDRL positivo no líquor; elevado conteúdo de proteínas ou leucocitose no
líquor, na ausência de outras causas; IgM positiva para lues
3 – Natimorto sifilítico – morte fetal ocorrida em gestação de mais de 20 semanas ou feto com peso superior a 500g,
nascido de mãe com sífilis não tratada ou inadequadamente tratada.
Q
UADRO
1: Definições sobre caso de sífilis congênita
Fonte: Diretrizes para o controle da sífilis congênita. Brasília: MS/PN de DST/Aids, 2005
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utiliza um antígeno constituído de lecitina, colesterol
e cardiolipina purificada. A cardiolipina é um compo-
nente da membrana plasmática das células dos mamí-
feros liberado após dano celular e encontra-se pre-
sente também na parede do
T. pallidum.
A prova do VDRL positiva-se entre cinco e seis
semanas após a infecção e entre duas e três semanas
após o surgimento do cancro. Portanto, pode estar
negativa na sífilis primária. Na sífilis secundária apre-
senta sensibilidade alta, e nas formas tardias a sensi-
bilidade diminui.
A reação não é específica, podendo estar posi-
tiva em outras treponematoses e em várias outras
situações. Essas reações falso-positivas podem ser
divididas em transitórias e persistentes. As transitórias
negativam em seis meses (malária, gravidez, mononu-
cleose infecciosa, viroses, tuberculose e outras). As
reações persistentes permanecem positivas além de
seis meses (hanseníase virchowiana e doenças auto-
imunes, como lúpus). Os títulos em geral são altos
nas treponematoses (acima de 1/16), podendo ser
superiores a 1/512.
Os casos de falso-negativos na sífilis secundária
(1% a 2%) decorrem do excesso de anticorpos (efeito
prozona). Esses casos poderão ser evitados utilizan-
do-se maiores diluições do soro.
Os testes rápidos não treponêmicos têm um
importante significado no controle da sífilis. Entre
eles encontramos o teste da reagina plasmática rápi-
do (RPR), o mais usado e realizado por punctura no
quirodáctilo. Foi o primeiro teste sorológico de
scree-
ning que dispensou equipamentos convencionais de
laboratório e dá o resultado em 60 minutos. Também
é quantificável, mas não comparável com os títulos
obtidos no VDRL.
Os testes não treponêmicos podem ser titula-
dos e por isso são importantes no controle da cura. A
persistência de baixos títulos em pacientes tratados
corretamente é denominada cicatriz sorológica e
pode permanecer por muitos anos.
19,20,40,41
B – TESTES TREPONÊMICOS
Os testes treponêmicos utilizam o
T. pallidum
como antígeno e são usados para confirmar a reativi-
dade de testes não treponêmicos e nos casos em que
os testes não treponêmicos têm pouca sensibilidade,
como na sífilis tardia. Positivam-se um pouco mais
cedo que os testes não treponêmicos. Em 85% das
pessoas tratadas com sucesso, os resultados permane-
cem reativos por anos ou até mesmo por toda a vida.
O TPI (prova de imobilização dos treponemas)
foi o primeiro teste treponêmico desenvolvido. Utiliza
como antígeno treponemas virulentos vivos obtidos
de sifilomas testiculares do coelho. A reação, apesar
de específica, é de difícil execução e dispendiosa, com
utilização restrita a laboratórios de pesquisa.
40
O teste com anticorpo treponêmico fluores-
cente (FTA) veio sofrendo modificações na diluição e
melhorando sensibilidade e especificidade até chegar
ao FTA-ABS. Apresenta rápida execução e baixo custo,
mas necessita de um microscópio fluorescente. Em
doenças auto-imunes e outras treponematoses pode
apresentar resultados falso-positivos.
19,21
O TPHA e o
MHA-TP são testes de hemoaglutinação O MHA-TP é
baseado na hemoaglutinação passiva de eritrócitos
sensibilizados de ovelhas.
41,42
Na sífilis não
tratada tem
sensibilidade igual à do FTA-ABS, exceto na sífilis pri-
mária inicial, em que este último é mais sensível.
21
Os testes EIA (imunoensaio enzimático treponê-
mico) e Western-blot são confirmatórios. O EIA é um
teste alternativo que combina o VDRL com TPHA. O pro-
cesso laboratórial é automatizado e apresenta leitura
objetiva dos resultados.
43-45
O Western-blot identifica anti-
corpos contra imunodeterminantes IgM e IgG de massas
moleculares (15kDa, 17kDa, 44kDa e 47kDa).
41,46
Por
enquanto, esses testes vêm demonstrando alta sensibili-
dade e especificidade em todas as fases da sífilis, mas
estão sendo mais utilizados em projetos de pesquisa.
40
No início dos anos 90 duas técnicas de PCR
foram descritas e passaram a ser empregadas, princi-
palmente para detecção de antígenos treponêmicos
na sífilis primária, com altas sensibilidade e especifici-
dade. O PCR é também extremamente útil no diag-
nóstico da sífilis congênita e neurossífilis. O DNA do
T. pallidum é detectado com uso de primers para o
gen codificador de proteína com peso molecular de
47kD. A ampliação do RNA do
T. pallidum é mais sen-
sível por demonstrar a viabilidade do treponema, e
utiliza os
primers que ampliam uma região com
366bp do gen 16S r RNA.
41,47-50
TESTES RÁPIDOS TREPONÊMICOS
De grande importância no auxílio do diagnós-
tico devido à leitura imediata, foram desenvolvidos a
partir dos testes de aglutinação. O ensaio imunocro-
matográfico é o mais eficaz. O teste imunocromato-
gráfico promove a detecção visual e qualitativa de
anticorpos (IgG, IgM e IgA) contra um antígeno
recombinado de 47-kDa do
T. pallidum em sangue
total, soro e plasma humano. O sangue pode ser cole-
tado por punctura do quirodáctilo. A leitura do teste
é feita entre cinco e 20 minutos após sua realização.
A sensibilidade e a especificidade do teste são de
93,7% e 95,2%, respectivamente, e mostraram-se
superiores às do RPR nos estudos preliminares.
51
Entretanto, o teste não deve ser usado como
critério exclusivo no diagnóstico da infecção pelo
T.
pallidum. Esses testes poderão substituir os testes
rápidos não treponêmicos, principalmente como tes-
tes de triagem.
51-55
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Avelleira JCR, Bottino G.
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