EXAME DO LÍQUOR
O exame do líquor cefalorraquidiano (LCR)
deverá ser indicado nos pacientes que tenham o diag-
nóstico sorológico de sífilis recente ou tardia com sin-
tomas neurais e em pacientes que mantiverem rea-
ções sorológicas sangüíneas apresentando títulos ele-
vados após o tratamento correto. A punção lombar
nos casos de sífilis latente tardia (mais de um ano de
duração ou de duração desconhecida) e em pacientes
HIV-positivos independente do estágio da sífilis tem
sido questionada, embora mantida como recomenda-
ção nos manuais de controle.
16,56
Nenhum teste sorológico isoladamente é segu-
ro no diagnóstico da neurossífilis.
O diagnóstico é feito pela combinação de posi-
tividade à prova sorológica, aumento da celularidade
(maior que 10 linfócitos/ml) e proteínas no LCR
(superior a 40mg/dl).
O VDRL é a prova recomendada para o exame
do líquor. O VDRL no líquor tem baixa sensibilidade
(30-47% falso-negativo) e alta especificidade. O FTA-
ABS pode ser positivo pela passagem de anticorpos
por difusão do sangue para o LCR em pacientes com
sífilis. Porém é um teste altamente sensível, e a neu-
rossífilis poderá ser excluída diante de um FTA-ABS
negativo. Em pacientes HIV-positivos o exame do LCR
deverá considerar que alterações na contagem de
células e na dosagem de proteínas isoladamente
poderão ser atribuídas ao comprometimento neuro-
lógico do vírus HIV.
19,20,27
SÍFILIS CONGÊNITA
O diagnóstico da sífilis congênita é confirmado
por provas diretas com o achado do
T. pallidum nas
lesões, líquidos corporais ou tecidos. Testes sorológi-
cos do sangue do cordão umbilical e sangue periféri-
co do recém-nato podem ser feitos. O diagnóstico na
ausência de lesões deverá considerar que anticorpos
maternos podem passar ao feto sem infecção, e, nesse
caso, é necessário realizar sorologia quantitativa
periódica (negativação em média dentro de seis
meses após o nascimento) ou o FTA-ABS-IgM, já que
a molécula de IgM não ultrapassa a barreira placentá-
ria, sendo diagnóstica quando positiva. Em relação ao
VDRL, o diagnóstico de sífilis congênita é feito quan-
do os resultados do recém-nato são iguais a quatro ou
mais vezes o título materno.
13
HISTOPATOLOGIA
Não é empregada rotineiramente para o diag-
nóstico. No entanto, como seus achados são sugesti-
vos, o diagnóstico da sífilis é suspeitado pelo patolo-
gista, havendo necessidade da confirmação sorológi-
ca. A patologia básica em todos os estágios configura-
se em edema, proliferação das células endoteliais e
infiltrado inflamatório perivascular com linfócitos e
plasmócitos. Nas fases primária e secundária os vasos
estão dilatados, espessados, e há proliferação das
células endoteliais. Um infiltrado inflamatório de
células mononucleares e plasmócitos de localização
perivascular constituem as alterações mais caracterís-
ticas. Nas fases tardias da sífilis secundária e na sífilis
terciária além das alterações vasculares podem ser
encontrados granulomas de células epitelióides e
gigantes com ou sem necrose central.
57
EXAME RADIOGRÁFICO
Nos casos suspeitos de sífilis congênita, a
radiografia dos ossos longos pode oferecer auxílio
diagnóstico. As alterações mais características são a
osteocondrite, periostite e a osteomielite. Em alguns
casos podem ser as únicas alterações no recém-nato.
13
Sífilis: Diagnóstico, tratamento e controle
119
An Bras Dermatol. 2006;81(2):111-26.
F
IGURA
9: Sífilis: tratamento -
stufa sicca
F
IGURA
10: Sífilis: tratamento – Salvarsan
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TRATAMENTO
Mercúrio, arsênico, bismuto e iodetos foram
inicialmente usados na tentativa de tratar a sífilis, mas
mostraram baixa eficácia, toxidade e dificuldades
operacionais. Também mostraram pouca eficácia tra-
tamentos que, inspirados na pouca resistencia do
T.
Palllidum ao calor, preconizavam o aumento da tem-
peratura corporal por meios físicos como banhos
quentes de vapor ou com a inoculação de plasmódios
na circulação (malarioterapia) (Figura 9).
A crescente preocupação com o aumento dos
casos mobilizou o trabalho de médicos e cientistas,
entre eles, Paul Erlich, que em 1909, após 605 tenta-
tivas de modificar o arsênico, sintetizou um compos-
to que foi denominado composto 606 ou salvarsan, o
primeiro quimioterápico da história da medicina
18
(Figura 10).
Em 1928, a descoberta do poder bactericida do
fungo
Penicilium notatus, por Fleming, iria modificar
a história da sífilis e de outras doenças infecciosas.
A penicilina age interferindo na síntese do pep-
tidoglicano, componente da parede celular do
T. pal-
lidum. O resultado é entrada de água no treponema,
o que acaba por destruí-lo.
Em 1943, Mahoney mostrou que a peniclina
agia em todos os estágios da sífilis. A sensibilidade do
treponema à droga, a rapidez da resposta com regres-
são das lesões primárias e secundárias com apenas
uma dose são vantagens que permanecem até hoje. A
penicilina continua como droga de escolha, e até o
momento não foram documentados casos de resis-
tência.
A concentração sangüínea eficaz é de 0,03
μ/cm
3
e deverá ser mantida por maior tempo que o da divi-
são do treponema. Portanto, a escolha recai sobre a
penicilina benzatina. O quadro 2 mostra o esquema
recomendado pelo MS.
56
No tratamento da neurossífilis a droga escolhi-
da é a penicilina cristalina pela capacidade de atraves-
sar a barreira hemato-encefálica. A dose recomendada
varia de 3 a 4.000.000UI, por via endovenosa, de qua-
tro em quatro horas, no total de 18 a
24.000.000UI/dia por 10 a 14 dias.
56
Os casos de reação à penicilina são em sua
maioria de natureza benigna com as reações anafiláti-
cas ocorrendo entre 10 e 40 por 100.000 injeções
aplicadas, com dois óbitos por 100.000. Nos casos de
alergia à penicilina, o teste intradérmico deverá ser
feito, bem como, nos casos comprovados, dessensibi-
lização com a penicilina V oral, conforme recomenda-
ções do MS.
16
Caso essas medidas não sejam possíveis,
deverão ser utilizadas drogas alternativas. A doxicicli-
na poderá ser utilizada na dose de 100mg/dia; a tetra-
ciclina e a eritromicina (estearato) na dose de 500mg,
de seis em seis horas, todas por 15 dias na sífilis
recente e 30 dias na tardia. A penicilina é a única
droga considerada eficaz no tratamento de mulheres
grávidas.
58,59
O esquema terapêutico deverá ser
empregado conforme o estágio da sífilis nas mesmas
doses do tratamento padrão. Pacientes alérgicas à
penicilina deverão ser dessensibilizadas e tratadas
com a penicilina.
16,56
O tratamento da sífilis congênita deverá ser
realizado conforme os quadros 3 e 4.
O acompanhamento da queda da titulação dos
pacientes deverá ser trimestral e, no segundo ano,
semestral.
OUTRAS DROGAS
O desconforto gerado pela aplicação intra-
muscular da penicilina benzatina, acaba por influen-
ciar a aderência, sendo tentadas outras alternativas
de tratamento. Drogas testadas mais recentemente
foram ceftriaxone e azitromicina. Todas demonstra-
ram atividade, mas não são superiores à penicilina,
devendo ser mantidas como drogas de segunda
linha.
18
O ceftriaxone mostrou ação no modelo animal
e em pequenos grupos de pacientes, mas apresentou
taxa elevada de re-tratamentos em pacientes HIV-
positivos.
18
A resposta à azitromicina em coelhos e em
pequenos grupos de pacientes, e a possibilidade de
dose única oral estimularam o uso profilático da
droga. Entretanto, foram observadas altas taxas de
resistência à azitromicina. Estudos genéticos confir-
maram mutantes resistentes em 28% do material exa-
minado por PCR.
60
A identificação de cepas resistentes mostra que
a utilização desses antibióticos deverá
ser cautelosa,
principalmente nos portadores do vírus HIV.
60-62
120
Avelleira JCR, Bottino G.
An Bras Dermatol. 2006;81(2):111-26.
Sífilis recente: sífilis primária
Penicilina benzatina 2.400.000UI, IM, dose única
Sífilis recente: sífilis secundária ou latente recente
(com menos de um ano)
Penicilina benzatina 4.800.000UI, IM, em duas doses
semanais de 2.400.000UI
Sífilis tardia: sífilis terciária, sífilis latente tardia (com
mais de um ano) e sífilis latente de tempo desconhecido
Penicilina benzatina 7.200.000UI, IM, em três doses
semanais de 2.400.000UI
Q
UADRO
2: Esquema de tratamento da sífilis
Fonte: Guia de controle das DST. Brasília: MS/PN de DST/Aids,
1999
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