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gramática e o laconismo, apresentei também uma provável relação de troca entre o conto
introdução e o conto conclusão. No entanto, versei tal operação como desaconselhável por
entender, ao fim e ao cabo, que introdução e conclusão na obra em epígrafe têm, ou
apresentam, em verdade, uma falsa, mesmo que possível, relação de troca. Tal proposição de
troca de posições entre o conto introdução e o conto conclusão foi feita a primeira vez de
modo bastante interessante pelo crítico literário e escritor espanhol especialista em literatura
chicana Justo S. Alarcón (1988, p. 67-74). Nela, tal autor questiona a circularidade romanesca
da obra de Rivera, observando desde um ponto de vista fenomenológico que
[p]or una parte, el capítulo introductorio no es más que un pedazo desprendido del
capítulo de la conclusión. Más aún, creemos que está mal colocado. Nos parece que
la Introducción y la Conclusión debieran invertirse. La razón es simple: en la
Introducción se nos habla de los «sueños» del narrador que no tienen agarre en
ninguna parte. No hay conceptos, porque tal cual está planteado el problema no lleva
a ningún lugar (…) ¿Cómo es posible, pues, que dicho capitulito sea la puerta,
fabricada de sueños, para dejarnos pasar a los que sigue, que es un mundo realista en
extremo? Es, pues, alógico, por no decir ilógico (ALARCÓN, 1988, s/p).
A partir do acima exposto, tem-se que a pertinência dos argumentos de Alarcón
praticamente “obriga” a um retorno, a novo exame aprofundado, a uma revisão da estrutura
organizacional (ou “desorganizacional”, se assim pode ser dito) do romance de Rivera. Desta
forma, contemplemos, a título de apoio a esta nova mirada, o capítulo que abre a compilação
romanesca de contos de ...y no se lo tragó la tierra:
Aquel año se le perdió. A veces trataba de recordar y ya para cuando creía que se
estaba aclarando todo un poco se le perdían las palabras. Casi siempre empezaba con
un sueño donde despertaba de pronto y luego se daba cuenta de que realmente estaba
dormido. Luego ya no supo si lo que pensaba había pasado o no.
Siempre empezaba todo cuando oía que alguien le llamaba por su nombre, pero
cuando volteaba la cabeza a ver quién era el que le llamaba, daba la vuelta entera y
así quedaba donde mismo. Por eso nunca podía acertar ni quién le llamaba ni por
qué, y luego hasta se le olvidaba el nombre que le habían llamado. Pero sabía que él
era a quien llamaban.
Una vez se detuvo antes de dar la vuelta entera y le entró miedo. Se dio cuenta de
que él mismo se había llamado. Y así empezó el año perdido.
Trataba de acertar cuándo había empezado aquel tiempo que había llegado a llamar
año. Se dio cuenta de que siempre pensaba que pensaba y de allí no podía salir.
Luego se ponía a pensar en que nunca pensaba y era cuando se le volvía todo blanco
y se quedaba dormido. Pero antes de dormirse veía y oía muchas cosas... (RIVERA,
[1971] 2012, p. 77, grifo meu).
A oração “daba la vuelta entera”, a qual grifei na citação acima, além de outros tópicos
desse texto abertura, encontra correspondências que realçam a associação do conto riverano
para com o conto “El hombre”, do El llano en llamas de Juan Rulfo. Isto atesta de novo a
conotação de instantâneos literários entre ambos os autores, algo a que já me referi páginas
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atrás. Porém, há mais a extrair das considerações sobre os contos-capítulos que abrem e
fecham o romance de Tomás Rivera. Em primeiro lugar, o conto inicial, ao contrário dos
outros doze conformativos do desenvolvimento da obra e do conto final, não é precedido por
uma estampa curta, o que desde já lhe confere um caráter de distinção no que toca ao seu
posicionamento, usado, no mínimo, de forma estratégica – reiterando: de modo evidente a que
introduzam e concluam a obra de maneira cíclica, circular.
A relação entre as doze estampas e os doze contos que ficam no intervalo, no lapso
introdução – conclusão é outro aspecto que comunga, de modo contrário ao que defendeu
Alarcón em seu artigo aqui utilizado, para a existência de um todo circular, ou, ainda melhor,
um todo elíptico, como já apontei, na reunião contística orquestrada por Rivera. Conforme
coloquei anteriormente, estampas e episódios que as seguem podem ou não ter estrita
correlação. O próprio Tomás Rivera confirma isto ao afirmar, ainda sobre a estampa, que ela
“a veces se puede ligar bien al cuento que precede pero no necessariamente. Sirve de ligación
para la obra total” (Documento, Archivo Tomás Rivera apud OLIVARES, 1992, p. 417).
Exemplificam tal correlação variável o caso de “Lo que nunca supo”, primeira estampa pós-
conto introdução, e o conto “Los niños no se aguantaron”. Entre esses dois primeiros narrados
do desenvolvimento, a relação latente se transfere ao campo do elemento água; assim,
enquanto na estampa o menino narrador burla a cosmogonia de sua mãe bebendo, sem nunca
lhe contar, a água do copo que ela depositava em baixo da cama para os espíritos em que
acreditava, deixando-a crer que eram estes mesmos espíritos que esvaziavam o copo;
enquanto isso, no conto seguinte a água vem rememorada pela falta que faz na labuta rural de
dois meninos que, ao contrário do que lhes dizia seu empregador, vão-se a um tanque sem
permissão, onde um deles é morto por acidente, com um disparo, que seria apenas para
assustá-los, dados pelo mesmo velho que os empregara e que, após o ocorrido, fica entre a
loucura e a mendicância.
Há, ainda, ligação evidente no caso do segundo par estampa-conto, caso da estampa
“Se había dormido” e do conto imediatamente seguinte “Un rezo”, quando em ambos a mãe
do menino protagonista roga pela vida e por notícias de seu filho mais velho, perdido na
Guerra da Coréia (na estampa, a consulta é a um espírito em uma caixa; e, no conto, roga-se a
Deus, à Virgem de Guadalupe, à Virgem de San Juan e a Jesus Cristo). Outra coligação
imediata o há no nono par estampa-conto, que opõe as “cores”, a beleza poética da preparação
para e da festa de um casamento (me)chicano da estampa “Fue um día muy bonito” à triste
história seguinte “La noche en que las luces se apagaron”, na qual um ex-namorado se mata
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