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tópico, Alarcón mencionava também a Juan Rodríguez
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como o único que até aquele então
havia “asociado a la persona del autor con lo que los críticos nombran ‘narradores’, sean estos
explícitos o implícitos o virtuales” (S. ALARCÓN, 1988, p. 67 – grifo do autor). Assim,
mesmo expressando-se de forma metafórica, Alarcón coincide com o crítico evocado da
seguinte maneira:
Estoy de acuerdo con lo siguiente: que, al fin de cuentas, el autor, como
prestidigitador, tira de las cuerdas o hilos de sus personajes, narradores o voces a
través de su obra. Por tanto, todo lo que se haga o diga en dicha obra, al fin de
cuentas, es el autor el que, escondido detrás de una o varias máscaras, manipula de
una u otra forma a esa legión de narradores (S. ALARCÓN, 1988, p. 67).
Embora um tanto evasivo nesse primeiro momento, S. Alarcón termina por fazer da
remissão ao autor como narrador
no romance de Rivera, não sendo apenas algo já explicitado
no título de seu texto bem como em toda a crítica ao que chama de contradições na narrativa
riverana. Tais críticas se estreitam sobre supostos problemas ontológicos os quais estariam
intimamente ligados à forte presença de Tomás sobre a figura do menino narrador, vinculação
fortemente defendida pelo crítico espanhol até o final de seu artigo, quando, ao citar um
pensamento ligado a um livro acerca da filosofia da existência, assim escreve: “Esto es lo que
le pasó también a nuestro autor/narrador en ...y no se lo tragó la tierra: ‘se aterrorizó’ y no
pudo pensar. Y, sin embargo, se lanzó y se atrevió a contarnos doce cuentos o experiencias”
(S. ALARCÓN, 1988, p. 74 – grifo do autor em aspa única – grifo meu em itálico).
A fina ironia contida na crítica de S. Alarcón não é de todo descabida. Há também na
ficção de ...y no se lo tragó la tierra, em contos como o já mencionado “El retrato”, o desfile
estilístico do que Esteban Giner (2005, p. 84) chama de “un uso delicadísimo de la ironía”. E
os críticos, por vezes, mesmo à revelia, terminamos por vencidos sermos por uma
contaminação de estilo advinda mesmo de autores sobre os quais despejamos poderosas
críticas. Não é, ainda, a crítica de S. Alarcón desmedida se aceitarmos que muitas vezes certos
clássicos exigem para sua maior compreensão e aceitação como tal um afastamento crítico
que demanda em conjunto maior distância no tempo e nas instâncias sócio-étnico-culturais e
cognitivas desde as quais discursam seus analisadores. É ainda menos impertinente a crítica
de Alarcón se não nos esquecemos de que, mesmo com tal distanciamento no tempo e de
instâncias, um Giner (2005), mais preocupado com a contextualização da obra riverana como
um todo (mostras contempladoras de poesia, conto e romance no autor), também se vê à
mercê dos frágeis limites entre Rivera e seu “menino” narrador. Contudo, inclusive a recente,
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Crítico chicano cujas observações sobre Rivera aparecem no artigo de 1978 “The Problematic in Tomás
Rivera's ... y no se lo tragó la tierra”, reeditado em 1986 na compilação bilíngue Contemporary Chicano
Fiction: A Critical Survey, da Vernon Lattin Ed.
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e excelente, primeira edição latino-americana do romance de Tomás Rivera quase se deixa
tragar, quase se deixa “cegar” pela nuvem de terra que ...y no se lo tragó levanta acerca da
questão autor/narrador. Tornemos a Ramos e Buenrostro.
A pesquisa materializada por Julio Ramos e Gustavo Buenrostro resulta em verdadeiro
tesouro tanto para investigadores da literatura chicana quanto para quem, tomando fins dos
anos de 1960 e início dos de 1970 como datas decisivas no e para o processo de
(re)florescimento e estabelecimento definitivo de um novo-antigo sistema literário, encontram
em Tomás Rivera uma figura chave cujo papel pioneiro nesses eventos não deve ser ignorado.
A concepção final da edição de ...y no se lo tragó la tierra, abraçada pela argentina Ediciones
Corregidor, que a publica em 2012, é fruto, pois, de uma profunda investigação científica de
cunho também bibliográfico que demandou a obtenção de acesso a arquivos do escritor junto
a sua família e, principalmente, à Biblioteca Tomás Rivera, localizada em Riverside, na
Universidade da Califórnia (EUA), lugar onde Rivera ocupou seu último cargo acadêmico
(tendo sido nomeado, sem que houvesse solicitado, reitor de um dos centros/uma das cadeiras
daquela instituição) antes de seu falecimento. Porém, embora o caráter bastante objetivo
adotado por ambos os pesquisadores se evidencie na concepção de abertura (prólogo) e
fechamento (introdução aos anexos que encerram a edição argentina), um aspecto de leve tom
subjetivado subjaz das reflexões que emprestam aos segmentos citados. Refiro-me aqui ao
uso, já citado por mim na nota de número 41, do termo relato, em espanhol, para tocar na
narrativa de Rivera.
Conforme adiantei, relato em espanhol é um sinônimo para narração, e para conto;
mas, encontra também, na plêiade semântica para narração, o ato, a ação de narrar, de contar
um fato, ou fatos, detalhadamente (Cf. relato em Diccionario de la lengua española de la Real
Academia en línea e no sítio Wordreference.com). Instaura-se desde já a ambiguidade do que
seja fato (mais próximo de um real empírico) em relação ao processo criativo e (re)criador
envolto no ato de repetir, contando-se (ou recontando-se) un hecho (de fato, de hecho)
acontecido. Relato nos remete ainda aos antigos relatos de viagem dos “descobridores”,
encarnando assim toda uma mnemônica que envolve em seu processo todo um caráter de
seleção, nem sempre objetiva, e, inclusive, de recriação, porquanto é de igual modo
imaginativo e, mesmo, inventivo.
Ao longo das páginas dos segmentos aqui mencionados, ao se referirem ao romance de
Rivera e a seus contos-capítulos componentes, Ramos e Buenrostro os tratam pelo espanhol
novela (o gênero literário romance, em português), narrativa, histórias, algumas vezes
cuento(s) (conto), não muitas vezes capítulo(s) e, em muitíssimas ocasiões, por relato(s).
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