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se que don Leonardo em mais uma de suas máximas “deseó que todos fueran como este
muchacho obrero pero con cara de gente decente, con facciones finas pero un mostachón
como de mariachi bien dotado y, caray, menos moreno que el propio Leonardo Barroso”
(FUENTES, [1995] 2007, p. 185 – grifo meu).
Será este mexicano cuidadosamente pinçado, distinguido que a narrativa levará para
diante da executiva estadunidense Audrey. Será Lisandro e, não, nenhum dos outros
mexicanos contratados pelo senhor Barroso, esses “todos tan prietos, tan de a tiro nacos”
(Ibíd.); afinal, era aquele “el primer viaje a Nueva York. ¿Qué clase de impresión vamos a
hacer, compañero?” (Ibid., p. 181). E é exatamente essa classe de boa imagem que a narrativa
coiote parece delegar a Lisandro, enxergando ser somente ele capaz de causar tamanha boa
impressão aos olhos do estrangeiro hiponimizado em Audrey, cujo olhar refletido na narrativa
nos transmite que
El trabajador era guapo (…), tenía esa actitud de caballerosidad insólita y casi
insultante, fuera de lugar, como si abusara de su inferioridad, pero también tenía
ojos brillantes en los que los momentos de tristeza y alegría se proyectaban con igual
intensidad, tenía una piel mate, oliva, sensual, una nariz corta y afilada, con aletas
temblorosas, pelo negro, rizado, joven, un bigote espeso. (FUENTES, [1995] 2007,
p. 199)
Mas, acima, enfim, enquanto a distinção física da descrição o destaca, características
outras voltam a cair no lugar comum relegado a imaginários sobre a identidade mexicana:
primeiro, o sentimento de inferioridade que se manifesta perpetuado ou se lhe atribui, repetido
ainda no final do conto, quando, em resposta ao nome de Audrey escrito ao contrário, o
narrador informa que Lisandro, em vez de ter feito o mesmo, teria escrito sua nacionalidade
“Ciegamente, sin reflexionar, estupidamente quizás, acomplejadamente, no lo sabe hasta el
día de hoy” (Ibid., p. 202 – grifo meu); depois, tristeza e alegria mescladas com igual
intensidade, a mesma mescla que já se mostrara “enxergada” pela própria Audrey momentos
antes da descrição narrativa de sua observação anterior, quando ela ainda buscava “una
palabra que describiera la actitud, el rostro, del trabajador que limpiaba las ventanas de la
oficina” (Ibid., 198). Encontrando ela esta palavra
[C]on un relampagazo mental. Cortesía. Lo que había en este hombre, en su
actitud, en su distancia, en su manera de inclinar la cabeza, en la extraña mezcla
de tristeza y alegría de su mirada, era cortesía, una ausencia increíble de
vulgaridad (Ibid., p. 198 – grifo meu)
A incrível ausência de vulgaridade descrita traz à lembrança nova remissão à uma
espécie de novo olhar estrangeiro que desde, através do mito eufemístico do bom selvagem,
tenta mudar, suavizar, tornar mais terna, compreensível sua visão acerca dos sujeitos
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colonizados, dominados, subjugados. Porém, o lugar-comum da subserviência, da cabeça
baixa e da cortesia que eufemisticamente faz parte de um imaginário social que recai sobre o
México ainda se faz presente, imagem que se repete, na qual se insiste na narrativa, inclusive,
quando a estadunidense (seguindo a trilha de traduções do inglês ao espanhol deixada pelo
narrador coiote e tradutor fuentesiano) compara Lisandro com o marido de quem acabara de
separar-se: “Dios mío, ¿con quién he estado casada?, ¿cómo es posible?, ¿con quién he estado
viviendo?, y luego lo encontró a él y le atribuyó todo lo contrario de lo que odiaba en su
marido, la cortesía, la melancolía” (FUENTES, [1995] 2007, p. 201 – grifo meu).
E incluída no trecho acima a melancolia é importante chamar a atenção para o fato de
que, no tocante aos traços que costumam ser outorgados como caros a, indissociáveis da
personalidade ampla e geral do mexicano, cabem ou nela, melancolia, explicam-se
características outras, quais seriam a mescla entre tristeza e alegria, a própria cortesia, a
resignação e o gosto pela solidão. Antes, porém, que me detenha algo mais sobre o apelo
desse caráter melancólico conferido pelo olhar intelectual (e volto a citar aqui a conexão que
se opera entre partes da linha de estudo adotada por Ramos, Paz e Fuentes) dedicado a buscar
desvendar, dissecar uma espécie de “ethos” mexicano; antes disso, parece-me valer a pena
observar como a narrativa distingue, separa esse mesmo sentido de melancolia do
estadunidense, como quando da descrição de um pensamento de Lisandro sobre o olhar de
Audrey:
No esperaba encontrar melancolía en los ojos de una gringa. Le decían que todas
eran muy fuertes, muy seguras de sí mismas, muy profesionales, muy puntuales, no
que todas las mexicanas fueran débiles, inseguras, improvisadas y tardonas, no, para
nada. Lo que pasaba era que una mujer que venía a trabajar los sábados tenía que
serlo todo menos melancólica, quizás tierna, amorosa. Eso lo vio claramente
Lisandro en la mirada de la mujer. Tenía una pena, tenía un anhelo. Anhelaba. Eso le
decía la mirada: – Quiero algo que me falta. (Ibid., p. 198)
A falta com a qual se encerra o pensamento de Lisandro é transferível para a
metonimização que se dá no início do discurso que lhe confere a narrativa. Note-se que ao
colocar-se na parte Audrey atributos de um todo em “Le decían que todas eran muy fuertes,
muy seguras de sí, etc.”, o narrado afasta de modo metonímico, pela figura de Lisandro, a
melancolia não apenas de Audrey, mas, por conseguinte, de um todo feminino estadunidense
teoricamente homogêneo em não ser melancólico, o qual se opõe ao mesmo processo
metonímico que se volta para as mexicanas; nesse caso, mesmo a frouxa tentativa de
amenização inserida em “no que todas las mexicanas fueran débiles, inseguras, improvisadas
y tardonas” não dá conta de tirar o peso que recai minimamente sobre uma amplidão da qual é
fácil inferir que, se não todas, várias assim o são, num encaminhamento a um imaginário
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