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pavilhão passaram milhares de pessoas que ficaram maravilhadas com a
obra deles. Milhares de pessoas ouviram o Poème Electronique de
Varèse, que foi composto para 400 colunas de som. Afinal, ele era um
compositor popular ou erudito?
Na década de 60 os Beatles deixaram de se apresentar em público
por cerca de três anos. Diziam que trabalhavam em estúdio, resgatando
algumas ideias e invenções de músicos eletrônicos como Pierre Schaeffer,
Gordon Mumma e Pierre Henry entre outros. Como será possível
classificar Terry Riley, LaMonte Young, Steve Reich ou Philip Glass? Um dia
encontrei, em uma loja de Nova York, discos de John Cage classificados
simultaneamente como new age, contemporary music, classical e jazz.
Contei a ele, que achou ótimo, reclamando apenas que poderiam tê-lo
classificado também como rock e pop. Por que não? Para os Beatles
aqueles três anos de estúdio representaram alguns dos seus maiores
sucessos comerciais!
Algumas pessoas defendem que a música minimalista seria uma
espécie de tradução da abordagem fractal em termos musicais. Nesse
sentido, o minimalismo será mais fractal que Chopin?
Chopin é "formado" por partículas de som interativas, que deixam
transparecer estruturas diferentes dependendo da escala que se adota.
Chopin foi um Seurat sonoro.
A questão mais intrigante é: como só percebemos isso agora?
Como só no final do século XX percebemos que a Natureza organiza-
se também de forma fractal?
Uma pergunta para uma simples resposta: tudo é linguagem todo o
tempo. Mudam-se os sentidos, mudam-se as coisas. Tudo é composto de
mudança.
(Arquivo Rizoma)
Fonte: Página de Emmanuel Dimas de Melo Pimenta (
www.asa-
art.com/edmp/edmp1.htm
).
119
NEUROTRANSMISSÃO, MÚSICA ELETRÔNICA E RITOS URBANOS
Marcelo Apontes
Numa composição de Stokhausen, Alphabet für Liège (1972) enquanto
uma cantora entoa mantras indianos que afetam partes de seu corpo,
outros músicos provocam padrões vibratórios em líquidos e alteram o
ritmo dos movimentos das guelras de um peixe.
Não está em pauta apenas a curiosidade do menino que disseca a
lagartixa, mas sim a exploração de aspectos ritualísticos no tratamento do
som dado por Stokhausen, que diz o seguinte sobre as propriedades das
vibrações sonoras:
“Originalmente, na música sacra e na música tribal, a própria produção
dos sons estava capacitada e qualificada a nos colocar em estado de
transe e meditação, adoração e êxtase. Porém, isto desapareceu do
mundo contemporâneo, e tudo o que resta agora é a atitude mais ou
menos falsa do freqüentador de concertos ou alguém com seu rádio ou
gravador que usa a música como uma tapeçaria sonora ou, na melhor das
hipóteses, como um recurso para identificar uma emoção particular que a
domina momentaneamente. Mas uma nova função dos sons, de certas
constelações de sons compostas por pessoas que têm este conhecimento
mais sutil de como as vibrações sonoras agem sobre os seres humanos,
pode sugerir gravações tendo em vista propósitos muito particulares.”
É possível demonstrar as propriedades psico-físicas do som, por meios
científicos, embora as culturas antigas já o fizessem por processos
intuitivos. Todo mundo sabe sobre os efeitos psicológicos despertados
por tambores em rituais indígenas/africanos, ou ainda sobre a recitação
de mantras para expansão da consciência e sua condução para estados
alterados e a função do próprio canto gregoriano, que continua como
música oficial da igreja católica.
Existe um campo biopsicoeletroacústico e Stokhausen propõe não apenas
um maior envolvimento com as propriedades mais sutis das freqüências
sonoras, mas também sugere uma ambientação que se adeque aos sons
produzidos pelos intérpretes na execução de seus instrumentos.
Uma de suas obras, Sterklang (1971), deve ser apresentada em um
parque público "durante um verão cálido e tépido, sob um céu iluminado
pelas estrelas e, de preferência, no período de lua cheia".
Paul Griffiths sintetiza da seguinte maneira as características dessa peça:
“[Em Sterklang] a meditação sobre os primeiros trabalhos [de
Stockhausen] para conjunto de Música Eletrônica Viva se estende à escala
de uma celebração pública da harmonia, com cinco grupos afinados entre
si por acordes específicos, cada um se comunicando com os demais por
intermédio de signos musicais, e por pessoas que circulam entre eles
carregando tochas incandescentes, pessoas estas que, esporadicamente,
entoam nomes de constelações estelares.”
Para Stokhausen, a peça representa a manifestação da grande escala do
"ritmo do universo", aproximando-a dos rituais místicos dos povos
orientais ou dos rituais xamânicos. O compositor promove uma
contemplação musical.
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Para um músico eletrônico, os dispositivos técnicos são traduzidos num
sentido simbólico: "Intermodular os sons, é intermodular as músicas e
idéias. As ondas hertzianas são as ondas cerebrais. Os microfones
escutam bater o coração da matéria. Os amplificadores e os difusores de
sons amplificam e difundem os pensamentos. Os fios elétricos que se
ligam aos instrumentos são os nervos condutores de influxo cerebral. As
vibrações sonoras se unificam às vibrações psíquicas. O homem faz corpo
com as máquinas, novas extensões de seu sistema nervoso aumentando
seus poderes de ação e comunicação."
A 'música eletrônica ambientada' demonstra ser potencializadora desse
campo biopsicoeletroacústico, estimulando direcionadamente dentre
outras reações, a produção de específicos neurotransmissores.
Ritmo e pulso, estímulos podem ser orientados
Os neurônios são células nervosas, cujas extremidades ficam separadas
entre si por um espaço mínimo (chamado sinapse). Para que uma célula
consiga transmitir um simples impulso elétrico para outra, ela emite essas
substâncias químicas chamadas neurotransmissores (NT), que permitem a
passagem do impulso elétrico. Por algum motivo, que a ciência ainda não
conseguiu descobrir, as células nervosas podem apresentar um
comportamento estranho.
Logo após liberar os neurotransmissores, o neurônio pode reabsorvê-los
rapidamente, antes que eles possam ativar o outro neurônio. Isso ocorre
principalmente nas pessoas com depressão ou síndrome de pânico. A
célula receptora pode também apresentar alterações em sua superfície,
tornando-se insensível aos impulsos elétricos. Quando você ingere algo
muito doce antes de um café, por exemplo, é difícil perceber se esse café
está com a quantidade ideal de açúcar, exatamente por causa da
quantidade de neurotransmissores que circularam na sinapse sob o
impulso do sabor captado pelas células nervosas. Essa causa biológica da
depressão e da síndrome do pânico não é realmente nenhuma causa, mas
sim também um efeito físico mas um efeito físico de um problema que
tem sua origem na alma.
Conceição Rossi, musicoterapeuta da Endócrino-Clínica, de São Paulo,
expressa numa entrevista concedida à Folha de São Paulo que, “sendo a
música uma expressão não verbal, caminha diretamente do sistema
auditivo para o centro das respostas emotivas, localizado no sistema
límbico do cérebro, desencadeando a liberação de neurotransmissores
como a noradrenalina, serotonina, dopamina e endorfina, ligados a
estímulos de bem-estar. A música ativa o fluxo de material da memória
armazenado para então passar para a região do cérebro responsável pelo
intelecto e atividades motoras, facilitando e promovendo a comunicação,
os relacionamentos, o aprendizado, a mobilização e a expressão
corporal.”
Assim como a música, os efeitos simbólicos, luminosos e cromáticos (luz e
cor também possuem freqüências) são igualmente uma expressão não
verbal e caminham diretamente para esse centro de respostas emotivas
no sistema límbico, estimulando a liberação dos NTs. Por isso o velho
Stokhausen sabe o que diz quando se refere à ambientação.
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