Universidade Federal do Rio de Janeiro a relaçÃo literariedade, imagem e imaginários em



Yüklə 2,09 Mb.
Pdf görüntüsü
səhifə99/104
tarix21.07.2018
ölçüsü2,09 Mb.
#57541
1   ...   96   97   98   99   100   101   102   103   104

204 
 
conta  também  do  receptor.  Fuentes,  Ramos  e  Paz  trabalham  com  conceitos  que 
desenvolveram  durante  anos,  apontando  a  visão  de  parte  da  intelectualidade  do  seu  tempo, 
interferindo  sobre  ela  suas  instâncias  de  formação  rumo  à  leitura  de  um  tempo,  diferente 
daquela  que  outros  dedicariam  em  tempos  de  um  mundo  já  em  outros  contornos,  com  um 
contexto  de  época,  de  tendências  e  teorias  distintas.  Fuentes  e  seus  antecessores  trabalham 
com  o  que  tinham  à  época  à  mão,  com  os  meios  de  estudo,  com  a  forma  e  metodologia  de 
estudar de que dispunham, e com as ideias e teorizações cabíveis, talvez, ao seu tempo.  
A ação mais direta da literatura sobre e com imaginários nacionais já foi mais evidente 
na formação de identidades nacionais, na ação de tentar instituir e chamar importância para o 
destaque da chamada cor local. Tal intencionalidade é atualmente, a meu ver, mais discutível, 
ainda  que,  conforme  procurei  demonstrar,  possa  equivaler-se  ao  demarcamento  de 
pensamentos de resistência, ideologias de teor libertário caras ao intelectual que quase sempre 
se propõe, como parte de uma coletividade, também um porta-voz dessa mesma coletividade.  
No  que  toca  às  influências  intelectuais  de  e  em  Fuentes,  acerca  de  Octavio  Paz  é 
importante  observar  que  o  impacto  de  seus  argumentos  não  recai  apenas  sobre  seus 
conterrâneos  mexicanos.  Por  isso,  procurei  destacar  também  a  busca  inicial  de  uma 
intelectualidade chicana por encontrar suas raízes no México e na leitura de seus intelectuais 
como  uma  espécie  de  pedra  fundante  desde  a  qual  dariam  vez  ao  poder  dinâmico  e  de 
resistência chicana in USA. A leitura de, e admiração intelectual chicana por autores clássicos 
como Paz pode ser mesmo observada, por exemplo, no texto de uma carta de Tomás Rivera 
endereçada ao intelectual mexicano, pouco tempo após a publicação de seu ...y no se lo tragó
Nela, Rivera comunica que envia adjunta sua obra que vai “como testimonio de admiración y 
también como testimonio de uma consciencia despertada desde aquel momento en que leí El 
laberinto de la soledad.” (RIVERA, [1972] 2012, p. 262 – grifo de datilografia do autor). 
A admiração a que se refere Tomás Rivera pode ainda ser atestada se trazemos, a duas 
pontas  de  medida,  o  ensaio  paziano  “El  pachuco  y  otros  extremos”,  componente  de  El 
laberinto, e o conto riverano “El Pete Fonseca”. O conto de Rivera, excluído da composição 
final  de  seu  único  romance  por  razões  mais  bem  temáticas  que  estruturais,  tem  por 
protagonista um sujeito “chicano” burlesco e enganador que se aproveita de uma mãe solteira 
e seus filhos, desaparecendo ao fim da história com o carro e todo o dinheiro da família. Pode-
se,  assim,  questionar  se  o  pachuco  criado  por  Rivera  não  acaba  por re(a)presentar talvez  os 
mesmos extremos de que fala Paz em seu ensaio. A resposta talvez esteja no fato de que em 
um  primeiro  momento,  na  tentativa  de  afirmação  de  uma  identidade  chicana,  a  figura  do 
pachuco abordada por Paz foi explorada por um emergente discurso chicano politizado entre 


205 
 
os anos de 1960 e 70 como marca de diferença, até, enfim, ser tomado como estereótipo (Cf. 
RAMOS e BUENROSTRO, 2012, p. 16). 
Nesse aspecto, são tão passíveis de relatividade e suscetíveis a discussões as situações 
evocadas,  que  um  conselho  mordaz  de  Roger  Bartra  (2000,  p.  77)  pode  também  servir  de 
interessante aviso ao leitor/receptor: 
[E]s necesario un proceso de decodificación-recodificación en el que los signos de 
identidad  cultural  descifrados  deben  ser  enmascarados  de  nuevo  con  nuestros 
propios  signos  (el  proceso  que  va  del  desenmascaramiento  de  inferioridades, 
hipocresías y soledades mexicanas a la reconstrucción del canon del axolote). 
 
Tal aconselhamento, segundo minha visão, pode esbarrar ainda, como venho buscando 
atrair  a  atenção,  nas  instâncias  receptivas  do  leitor/receptor  e  em  sua  responsabilidade  para 
com as muitas tramas das quais se aproveitam as teias de um imaginário. A literatura, a ficção 
é responsável por sua realidade  interna;  mas,  nunca é demais atentar-se  para a  identificação 
possível com o mundo irrealizado, o qual pode, porém, ser tomado como real por um receptor 
enredado pela ficção do como se.  
De minha parte, posso dizer que aquele que se aventure a estar presente, por exemplo, 
entre  os  dois  (e  mesmos)  lados  bi-fronteiriços  que  são  El  Paso  (EUA)  e  Juárez  (México) 
poderá  receber  um  abraço  que  o traga  junto  à  frase  “En  el  México  dominado  toma  acá  un 
abrazo  mexicano”;  e  ouvir  em  congressos  afirmações  intelectuais  de  assumida  identidade 
chicana por rechaço, mesmo linguístico, ao discurso hegemônico de ambos os lados; ou ainda 
ouvir  sentenças  como  “Acá  no  les  gusta  eso  de  ser  chicano,  gente  que  reniega  sus  propias 
raíces”; ou mesmo ver um ativista chicano, de marcado sotaque inglês estadunidense em seu 
espanhol,  chamando  a  gringos  “eses  anglo-americanos”,  esses  “pinche  gringos”,  qual  talvez 
diria, embarcada quem sabe em uma ficção de cidadania, uma professora mexicana US citzen 
radicada  em  uma  universidade  de  Pittsburgh,  Pensilvânia  (EUA).  Todos  aqui  anônimos, 
entretanto, como as vozes corais que adentram as narrativas de Rivera em ...y no se lo tragó la 
tierra
Reitero,  por  fim,  que  a  configuração  e  a  existência,  resistência  e  caráter  de 
permanência de um imaginário só se dá em comparação com o real vivido. Caberia ao leitor, 
então, à guisa de uma proposta platônica ir de hipótese em hipótese até chegar ao ponto que 
não admite hipóteses. Mas, não raro, o receptor o que faz é ir de imagens em imagens até que 
tome  como  princípio  de  tudo o  imaginário.  Nesse  tocante, o  valor  de  envolvimento  de  uma 
obra  literária  toma  o  leitor  como  fosse  um  atalho  para  esse  tão  difícil  princípio  de  tudo, 
deixando-o,  no  espaço  ao  mesmo  tempo  ínfimo  e  infinito  do  toque  do  Deus  e  do  Adão  de 
Michelângelo, nos liames (im)possíveis da complicada fronteira entre o real e o imagético. 


Yüklə 2,09 Mb.

Dostları ilə paylaş:
1   ...   96   97   98   99   100   101   102   103   104




Verilənlər bazası müəlliflik hüququ ilə müdafiə olunur ©genderi.org 2024
rəhbərliyinə müraciət

    Ana səhifə