85 Guia de Economia
Comportamental e Experimental
Em um projeto com Brian Knutson, Elliott Wimmer e Drazen Prelec (Knutson et al. 2007), rea-
lizamos o primeiro estudo para analisar a base neural dos gastos e da economia – um experimento
no qual os participantes escolhiam comprar ou não uma série de produtos com desconto enquanto
tinham o cérebro analisado por meio de ressonância magnética funcional (fMRI). O foco central do
estudo era se as pessoas de fato se baseiam em uma dor de pagar antecipatória para desestimular
o ato de gastar. Em cada teste da nossa tarefa SHOP (save holdings or purchase, guardar suas pos-
ses ou comprar), mostrou-se inicialmente aos participantes um produto que podia ser comprado
e, em seguida, segundos depois, seu preço e, por fim, a oportunidade de indicar se eles gostariam
ou não de comprar o produto pelo preço oferecido. Os participantes receberam inicialmente $20
para gastar, juntamente com a informação de que uma de suas decisões seria, no final, selecionada
aleatoriamente como sendo a decisão real. Assim que a tomografia foi concluída, os participantes
receberam um questionário que lhes pedia para indicar o quanto gostavam de cada produto e
quanto estariam dispostos a pagar por eles.
De forma consistente com pesquisas anteriores, que sugeriam que a ativação do núcleo acumbente
(NAcc) aumenta à medida que os ganhos antecipados e a felicidade autodeclarada crescem (Knutson
et al. 2001), observamos que o grau em que os participantes declaravam gostar de um produto se cor-
relacionava positivamente com a ativação do NAcc quando o produto era inicialmente apresentado. A
diferença entre a disposição de pagar e o preço (isto é, o excedente do consumidor) se correlaciona
positivamente com a ativação no córtex pré-frontal medial (MPFC), outro alvo dopaminérgico na via
mesolímbica. A ativação em ambas as regiões se correlacionou positivamente com as reais decisões de
compra. A ativação do NAcc começava a prever as decisões de compra tão logo os participantes viam
o produto, e a ativação do MPFC previa mais acentuadamente as decisões de compra durante a fase do
preço (figura 2a,b). Mais significativa em termos da dor de pagar, entretanto, foi nossa constatação de
que a ativação da ínsula durante a fase em que os sujeitos viam o preço pela primeira vez se correlaciona-
va negativamente com as decisões de compra (figura 2c). A ativação da ínsula foi previamente observada
em relação a estímulosde aversão, como odores repulsivos (Wicker et al. 2003), injustiça, (Sanfey et al.
2003) e exclusão social (Eisenberger et al. 2003). Esses resultados dão suporte à ideia de que, quando
os custos adiados da satisfação imediata não são explicitamente representados (como em, por exemplo,
McClure et al. 2004), mas, ao contrário, capturados implicitamente pelos preços, os participantes pare-
cem se basear em uma dor de pagar antecipatória para desestimular o gasto em vez de estritamente em
uma consideração deliberada daquilo a que se renuncia ao comprar imediatamente[3].
tempo (s)
tempo (s)
tempo (s)
0
4
8
12
16
20
0
4
8
12
16
20
0
4
8
12
16
20
0.10
0.15
0.20
0.05
0
-0.05
-0.10
-0.15
-0.20
(a)
*** $$$ ???
(b)
(c)
*** $$$ ???
*** $$$ ???
Mudança de sinal percentual
Porcentagem de empregadores, nos EUA, que oferecem planos 401(k) de adesão
automática de funcionários e reajustam as taxas de poupança. Também representados
programas de reajuste automático da poupança. Consulte (10).
2003
14%
19%
9%
35%
58%
44%
56%
51%
34%
2005
2007
2009
2011
Adesão automática
Reajuste automático
Adaptado do original*
Adaptado do original*
Adaptado de Rick & Loewenstein (2008, p. 3818)
86 Guia de Economia Comportamental e Experimental
Figura 2. Progressão temporal dentro de volumes de interesse em Knutson et al (2007). (a) Pro-
gressão temporal da ativação bilateral do NAcc para testes nos quais os produtos eram posterior-
mente comprados (círculos cheios) em oposição a não comprados (círculos vazios). (b) Progressão
temporal de ativação bilateral do MPFC. (c) Progressão temporal da ativação da ínsula direita. As
barras brancas indicam a fase em que a divergência era prevista; três asteriscos indicam a fase do
produto; três cifrões indicam a fase do preço; três pontos de interrogação indicam a fase da escolha;
todos atrasados/deslocados para a direita em 4 s; n=26; *p<0,05; barras de erro=± s.e.m. Adaptado
da fig. 2 de Knutson et al. (2007).
Em outra pesquisa feita com Cynthia Cryder (Rick et al. 2008), vimos examinando consequên-
cias comportamentais crônicas da dor de pagar. Como dito anteriormente, como as pessoas não fa-
zem trade-offs explicitos, é difícil de “acertar” e fácil de errar em ambas as direções. Em alguns casos,
as pessoas não experimentam dor, ansiedade ou culpa suficientes para seu próprio bem. Isso leva a
um padrão de gasto excessivo e poupança insuficiente entre pessoas comumente (por estranho que
pareça) chamadas de “esbanjadoras” [4]. Em outros casos, os “avarentos” experimentam muita dor,
o que os leva a gastar muito pouco, e à incapacidade de desfrutar daquilo que compram.
Para medir as diferenças individuais nessa dimensão, nós desenvolvemos a escala “esbanjador–
avarento”, que divide os entrevistados em uma das três categorias com base na escala das respostas:
“avarentos” gastam menos do que acham que deveriam; “consumidores sem conflitos” gastam o
quanto acham que deveriam gastar; e “esbanjadores” gastam mais do que acham que deveriam. Es-
ses atributos têm forte correlação com a dor de pagar autodeclarada. Em geral, avarentos declaram
sentir a dor de pagar intensamente, consumidores sem conflitos sentem dor moderada antes de gas-
tar e esbanjadores costumam sentir pouca dor. Surpreendentemente, dada toda a atenção da mídia
ao problema do gasto excessivo, observamos que a “avareza” é mais comum do que o “esbanjamen-
to”. Em nossa amostra de mais de 13.000 entrevistados, os avarentos superaram numericamente os
esbanjadores na razão de 3:2 (24% contra 15%).
Os escores na escala esbanjador–avarento prevêem diversos comportamentos relacionados com
gasto. Por exemplo, esbanjadores que utilizam crédito são três vezes mais propensos a se endivida-
rem do que avarentos que também utilizam crédito (60% contra 20%). Esbanjadores são duas vezes
mais propensos que os avarentos a terem menos de $10.000 na poupança (52% contra 24%), e os
avarentos são duas vezes mais propensos do que os esbanjadores a terem mais de $250.000 na pou-
pança (28% contra 12%). Essas diferenças persistem depois de consideradas as diferenças de renda.
No entanto, as diferenças individuais na dor de pagar não são determinantes absolutas do com-
portamento de gasto. Observamos que avarentos e esbanjadores se comportam de maneira similar
quando fatores circunstanciais amenizam a dor de pagar. Em um estudo, por exemplo, nós (Rick et al.
2008) perguntamos a avarentos e esbanjadores se (hipoteticamente) estariam dispostos a pagar $5
para que DVDs lhes fossem entregues no prazo de um dia em vez de quatro semanas. Nós simples-
mente colocamos diferentes molduras no valor do frete, que era descrito como uma “taxa de $5” ou
uma “pequena taxa de $5”. Embora ambas as frases representem quantias equivalentes de dinheiro,
uma “pequena” taxa presumivelmente soa menos dolorosa de pagar. Como avarentos são mais pro-
pensos a experimentar a dor de pagar, previu-se que seriam mais sensíveis à manipulação. De fato,
os avarentos foram significativamente mais propensos a pagar a pequena taxa de $5 do que a taxa
de $5, enquanto os esbanjadores foram totalmente insensíveis à manipulação.