Mestrado em Sociologia Relações de poder no campo família empresária
Jorge
Rodrigues
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Ou seja, todo o campo se carateriza por ter agentes dotados do mesmo
habitus,
enquanto operador de cálculo inconsciente que permite ao membro da família
empresária orientar-se corretamente no seu espaço social. Assim, o campo estrutura o
habitus e este constitui o campo (Bourdieu 1971, 102-103). O
habitus é a internalização
da estrutura social e o campo é a exteriorização ou objetivação do
habitus.
O capital refere-se ao conjunto de recursos de diferentes naturezas (económica,
financeira, cultural, social) disponibilizados pelos agentes que intervêm num campo
social. Estes capitais e a sua distribuição possuem um efeito estrutural no campo. Esta
distribuição entre os agentes é desigual e pressupõe que os agentes envolvidos não são
iguais. A posse ou detenção da síntese desses capitais – o capital simbólico – irá gerar
distintas posições no campo, as quais irão desencadear estratégias de luta associadas aos
interesses próprios de cada agente. Estes agrupam-se em subcampos na família
empresária, os quais têm relações, interesses e objetivos diferentes no seu relaciona-
mento com aquela, e têm também pontos convergentes entre si, o que faz da família
empresária um ser vivo, ou seja, parece ser a objetivação de um campo específico.
O governo da família empresária significa, primordialmente, ter regras claras em
relação à propriedade e à gestão da empresa familiar, saber usar o seu património de
forma responsável e coerente com o passado, com o presente e vislumbrando o futuro.
Em suma, construir o campo família empresária supõe que se tenha perante os factos
uma postura ativa e sistemática para construir um sistema coerente de relações, que
deve ser posto à prova como tal. O mesmo é dizer, abordar um caso empírico com a
intenção de construir um modelo – que não tem necessariamente de se revestir de uma
forma matemática ou formalizada para ser rigoroso – de ligar
os dados pertinentes de tal
modo que eles funcionem como um programa de investigação que coloque questões
sistemáticas, apropriadas a receber respostas adequadas (Bourdieu 1989, 32).
7.3 Limitações da dissertação
Embora a família empresária seja um construto com pouca visibilidade na sociedade, o
seu impacto na vida quotidiana, contudo, é uma realidade. Os relatos de vida de
algumas pessoas que por vezes surgem nos
media chama-nos a atenção para fragmentos
da realidade que nem sempre percebemos, por nos faltarem os instrumentos ou lentes
teóricas que nos permitam tratá-los.
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A não pertença do autor a uma família empresária e a não inserção em redes sociais
potenciadoras de capital social (Zamudio
et al. 2014), associadas à habitual discrição e
não divulgação do que se passa no seio dessas famílias (Gallo
et al. 2009, 14), que
resistem à sua objetivação e desmistificação (Louçã
et al. 2014, 11), as mesmas atuam
numa arena que além de privada, nalguns casos, ainda, será íntima, dificulta o
questionamento e análise dos seus comportamentos intrínsecos.
Por estas razões, parece ainda estar todo um caminho por fazer, na procura da
delimitação do construto família empresária, cujo pontapé de saída se tentou ativar. O
caminho faz-se caminhando, colocando pequenos marcos ao longo do mesmo, ainda
que estas marcas possam vir a ser afastadas mais tarde, por já terem cumprido a sua
função. Espera-se que seja esse o fim desta dissertação de mestrado em sociologia, sinal
de que já se terá avançado na problematização do conceito família empresária.
7.4 Investigação
futura
Nesta dissertação procurou-se preparar um quadro teórico de referência que permita
criar definições operacionais para descrever ou identificar interrelações entre os
membros da família ou famílias, com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre o
enigma família empresária. O desenvolvimento futuro do trabalho deverá assentar num
questionamento sobre aquelas interações
entre os agentes (indivíduos ou grupos) e as
instituições, encontrar uma estrutura historicizada que se impõe sobre os pensamentos e
as ações. O objetivo é perceber a luta por posições na família empresária, pocurando
densificar as relações entre os públicos internos da família empresária e a sua posição
nos órgãos de governo da mesma – estrutura de poder, sejam elas formais ou implícitas.
Assim, pretendem-se compreender factos e relações nem sempre explícitas, na procura
de relações de poder, lutas por posições ou outros aspetos escondidos ou pouco
revelados do construto família empresária, tais como privilégios, opressões, hierarquias,
com estes últimos conceitos a colocarem algumas questões de cultura organizacional na
família empresária:
a)
O público-alvo interno dominante impõe a sua cultura aos restantes públicos-alvo
(os dominados, na ótica de Elias 2000)?
b)
Os
family offices, quando existam para manter uma estrutura de propriedade
estática por gerações – estabilidade de posições no campo (Accardo 2006, 64) –,
mesmo quando mudam os acionistas (Gersick
et al. 1997, 30), não será uma