Paixões no Deserto



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***

— Sabemos onde fica este lugar? — Mubharak perguntou ao jovem sentado à sua frente.

— Não, senhor. Ninguém diz, embora eu tenha certeza de que tanto o governo como o embaixador conhecem a localização.

— Temos que agir rápido. A sorte não vai nos favorecer duas vezes. Se Fahir deu a oportunidade, por que não aproveitar? E não precisa­remos derramar uma única gota de sangue. Fahir vai cair vitima do próprio heroísmo e o povo tamashek saberá quem é ele.

— O que pretende fazer, senhor? — perguntou o rapaz cheio de curiosidade.

— O que qualquer cidadão decente faria em meu lugar: vou aos jor­nais dar a notícia de que cinco ingleses, entre eles, duas crianças, foram raptados por guerreiros nômades após o ataque a um acampamento de turistas. Quero ver como o governo vai reagir.

— Mas isso não prejudicará seu próprio povo?

— Isso, meu jovem, obrigará o governo deste país, tão zeloso com os turistas, a tomar providências. Então, saberemos onde ele se esconde. A partir daí, meus préstimos serão aceitos com prazer e eu poderei varrer aquele mestiço do mundo de uma vez por todas!

O olhar do homem era assustador e o jovem à sua frente recuou por instinto.

— Continuo não entendendo... Uma guerra entre os tuaregues só vai colocar a opinião pública contra vocês!

— Exato! E a culpa será de quem? De meus homens que libertaram os reféns ou de Fahir, que os raptou?

— Tem certeza de que esse é o melhor caminho? Muitas pessoas vão morrer...

Nu'man Mubharak riu. Estrangeiros! Não entendiam nada da bravu­ra do povo do deserto. E era com essa gente que Fahir queria se aliar!

— A morte faz parte da vida. A morte honrosa é o caminho do guerreiro. — respondeu.

O rapaz ouviu em silêncio.

— Você tem nos ajudado muito, meu caro, e ainda poderá ajudar mais. Espero que a recompensa esteja à altura do favor prestado. — disse o homem, entregando ao rapaz um envelope cheio de dinheiro.

— Obrigado, senhor.

— Bem, não quero que se atrase. Vá em paz. — despediu-se, pre­parando-se para dar prosseguimento ao seu plano. Se fosse bem sucedido, como ele tinha certeza de que seria, Fahir cairia em desgraça e nada no mundo poderia salvá-lo. E a queda de Fahir traria a relíquia de seu povo direto para suas mãos. O que poderia ser mais perfeito do que isso?

O rapaz saiu da sala e, por um instante, teve a impressão de ver uma sombra movendo-se atrás da porta. Pensou em voltar e falar com Mubharak, mas desistiu. Eram todos tuaregues. Eles que se entendessem.

Nu'man Mubharak recostou-se à cadeira, mal acreditando na própria sorte. Aquilo era um sinal dos Céus de que ele estava certo. De que ele era o líder e não o mestiço que traía as mais altas tradições de seu povo.

Mas nem tudo estava resolvido. Ainda restavam os diamantes. Com eles, Fahir poderia dividir a opinião das pessoas que acreditavam nas bobagens de segredos e profecias. E tinha a cega também. Samirtra! A mulher era mais velha que o próprio tempo e parecia desafiá-lo conti­nuando viva, quando já deveria ter morrido há séculos! Samirtra tinha força, mas não resistiria a um golpe de espada. E ainda havia a questão das flechas... Quem teria incendiado o acampamento e por quê?

"Cada coisa a seu tempo", ele pensou e pegou o telefone para tramar a derrota do inimigo.



***

— Senhores — começou o homem em uniforme militar, andando de um lado para outro da sala —, a situação é grave. Convoquei esta reunião porque acredito que algo muito sério está acontecendo.

Todos olhavam para ele em silêncio, inclusive o homem oculto por trás de uma parede falsa.

— Como sabemos, há três dias um acampamento foi atacado e incendiado por tamasheks. Cinco turistas ingleses foram levados. Muito embora Fahir nos garanta que estão bem, isso não muda a situação.

— General, se me permite... — começou o comissário, mas o general Jawhar não permitiu. Continuou expondo os fatos:

— Para nossa sorte, o embaixador britânico — e fez um gesto de cabeça na direção do homem ali presente — tem sido extremamente com­preensivo, mas sua paciência não durará para sempre. Somos um país pacífico e assim pretendemos continuar. Uma batalha entre nômades não interessa a ninguém e só por isso temos sido tão condescendentes com Fahir até agora. Porém, esta situação precisa se resolver! Você já pode falar, Michell.

O comissário pigarreou e começou:

— Primeiro, quero deixar claro que a polícia está investigando este caso com seriedade. Suspeitamos que o que aconteceu no acampamento foi obra de Nu'man Mubharak, e não de Fahir Lowell. Embora, é claro, os homens dele também estivessem lá. O guia, Bahir Mussel confirmou a presença de Maghrabi, o homem forte de Fahir, entre os nômades contratados para acompanhar a excursão.

Apesar do ar condicionado, o comissário suava em bicas e seu vozeirão parecia ratear vez ou outra:

— Suspeitamos que Jordan e Faith Burton levassem consigo algo de valor e que Fahir estivesse providenciando sua segurança. Como está no relatório que entreguei aos senhores, Jordan e Fahir foram colegas em Oxford e se tornaram amigos. Amizade que cultivam até hoje.

— E o que isso tem a ver com o ataque? — perguntou o embaixador britânico.

— Bem, monsieur le embassedeur, suspeitamos que os objetos em posse do Sr. Burton e sua mãe também interessam à Mubharak. O Sr. Jordan foi vítima de duas tentativas de assaltos aqui, na Tunísia: uma em Túnis, no dia em que chegou, e outra na Ilha de Jerba. No primeiro, ele não prestou queixas; no segundo, não se encontrava no hotel.

— O que justificaria a proteção extra providenciada por Fahir. — comentou o emissário do presidente.

— Mas não o fato de deixarmos cinco turistas perdidos no deserto! — exclamou o general Jawhar, que não concordava com a atitude de seu governo em aceitar que Fahir continuasse com seus planos.

— Mas eles não estão perdidos, senhor. Conforme eu dizia...

— Não me interessa o que diz! Você defenderia Fahir mesmo que o homem tivesse matado a própria mãe!

— Queira continuar, comissário. — pediu o emissário tunisiano.

— Como dizia, suspeitamos que esses objetos valiosos sejam os dia­mantes roubados mês passado na Inglaterra. Segundo soubemos pelas informações que monsieur le embassedeur gentilmente nos forneceu, as pedras foram levadas para a Europa entre 1830 e 1850, após serem roubadas de uma relíquia tamashek.

— Está querendo que acreditemos que um engenheiro formado em Oxford e sua mãe, de 60 anos, assaltaram o Duque de Pointpigeon? — perguntou o general, vermelho como uma beterraba.

— Nós suspeitamos que sim, senhor.

— Suspeitamos isso, suspeitamos aquilo... Eu digo que devemos mandar um helicóptero para a tal fortaleza que Fahir construiu no de­serto e acabar de vez com essa história! — berrou o general.

— Se fizer isso, monsieur le general, perderemos a oportunidade de colocar as mãos em Mubharak. — disse o vozeirão do comissário.

— Mubharak é um homem rico e poderoso. Suas empresas empregam milhares de pessoas e, embora eu concorde que haja várias suspeitas sobre suas atividades paralelas, nada ficou provado até ago­ra. Não se pode atacar um cidadão como esse sem provas concretas. — respondeu o outro, com a cara de beterraba.

— Senhores. — disse a voz por trás da parede, fazendo com que as pessoas se calassem. — Ouvi o que tinham a dizer. Agora quero que me escutem. Somos um país pacífico e assim permaneceremos. O tra­balho de Fahir vem recebendo nosso apoio, porque, assim como nós, ele também pensa no bem estar e segurança de seu povo. Fahir não quer a guerra, mas também não fugirá dela. Um confronto entre tribos tamasheks só interessa a uma pessoa: Nu'man Mubharak.

O silêncio na sala era total. A maior autoridade do país falava, como sempre, com sabedoria e nem mesmo o general teve coragem de defen­der Mubharak.

— No entanto — continuou o homem —, sem provas, nada pode­mos fazer. É seu dever, comissário, buscar as evidências de que neces­sitamos, e o seu, general, é cuidar para que esta situação não se repita. Coloque soldados disfarçados em todas as excursões até que tudo se resolva.

— Quanto tempo Fahir nos pediu? — perguntou a voz.

— Três dias. — informou o emissário.

— Então ele terá três dias. Até lá, quero Nu'man Mubharak sob vigilância. E, comissário, serão três dias e nada mais. Agora, se me dão licença...

A voz calou-se e os homens na sala começaram a discutir sobre como e quando agir.

***

Saí dos aposentos de Samirtra, no fim do dia, e confesso que estava completamente encantada. Nem em minhas fantasias mais delirantes pude imaginar a riqueza de detalhes e a sutileza de comportamentos numa cultura transmitida apenas oralmente.



A postura das mulheres, seus mistérios e prerrogativas eram de tal forma surpreendentes que fiquei imaginando o quanto nós, ocidentais, tínhamos a aprender com aquele povo.

Encontrei Jordan e os garotos ao pé da escada:

— Até que enfim! Já estava achando que não veria você nunca mais! — reclamou ele.

— Oi, senhorita Hill. — saudaram os meninos, que estavam completamente imundos e felizes.

— O que estavam fazendo? — perguntei, enquanto subíamos.

— Brincando de lutar com espada. — responderam orgulhosos.

Olhei assustada para Jordan:

— Calma, espada de madeira! — ele respondeu, enquanto saia atrás dos garotos pelo corredor.

Olhei a cena divertida e me perguntei se Jordan seria um bom pai.

Com a cabeça cheia de pensamentos, fechei a porta do quarto e me deitei, procurando entender o que estava acontecendo comigo. Em 15 dias minha vida tinha simplesmente virado do avesso.

Estava em outro país, o acampamento onde eu dormia foi incen­diado, fui ferida quase mortalmente e depois salva por um homem que parecia ter saído de um conto de fadas. Como se não bastasse, agora estava aprendendo a ser uma tamashek.

Para quem até o mês passado restaurava quadros nos porões de um museu, era uma mudança e tanto!

Jantamos todos juntos, mas Fahir não apareceu. Perguntei casualmente sobre ele e ninguém sabia de nada.

Os garotos comeram como touros, e eu notei como eles estavam fortes e bronzeados, bem diferentes da aparência que tinham quando chegaram da Inglaterra. Imaginei a aflição que a mãe devia estar sen­tindo, mas sabia que, assim que os visse, ela ficaria feliz.

Após o jantar, demos uma volta pelo jardim, protegidos por mantas de lã que uma das atendentes providenciou. A senhora Burton resolveu se recolher, levando junto os meninos, que estavam caindo de sono.

— Olhe só que céu! — disse Jordan, apontando a imensidão pontilhada sobre nossas cabeças.

— Maravilhoso, não? Tudo aqui é divino. Tenho sonhado com o deserto há tanto tempo...

— O Saara é realmente sedutor. E é fácil se deixar levar por esta atmosfera de mistérios, você não acha?

Sorri e abaixei a cabeça.

— Eu, por exemplo — continuou Jordan, agora se aproximando de mim —, se não fosse um europeu frio e controlado, tomaria você nos braços è beijaria demoradamente. — Sua voz denunciava que era isso mesmo que ele pretendia fazer.

— E seria repelido com um soco no nariz, pode ter certeza. — res­pondi brincando, mas havia um tom sério em minha voz.

— Nossa! Por que tanta violência? — ele perguntou espantado.

— É o calor do deserto. — respondi, caminhando de volta à casa. — Para alguns, desperta romance. Para outros, instintos assassinos.

E dei uma gargalhada.

— Que Deus me livre de você, Lindsay Hill! — brincou ele. — Mas devo dizer que está linda, mais ainda do que estava no dia em que nos conhecemos.

Olhei surpresa: Jordan estava me paquerando?

***

Passei horas admirando o céu na sacada de meu quarto, até que resolvi descer e dar mais uma volta pelos jardins, na tentativa de buscar o sono que simplesmente se recusava a aparecer. Tinha passado três dias dormindo e agora não conseguia pregar os olhos.



A casa estava silenciosa e apenas algumas lamparinas iluminavam a escada e a varanda. No jardim não havia luz, a não ser a do luar que enchia tudo de sombras e contornos difusos. Caminhei para a varanda no centro do jardim, pensando em me sentar lá por alguns minutos e sentir o perfume trazido pelo vento frio da noite, quando senti alguém se aproximar.

— Atrapalho? — perguntou aquela voz que acelerava meu coração.

— De maneira alguma... — respondi, sentindo a presença de Fahir ao meu lado.

— Como passou o dia? Foi bem tratada? —perguntou, com educação.

— Tratada como uma princesa. — Senti um leve tremor em minha voz e me censurei por isso.

— Fico feliz. E o braço, como está?

— Oh, está ótimo, quase curado. Hoje conheci Samirtra. Na verda­de, passei boa parte do dia com ela.

Ele não respondeu.

— Aprendi muito sobre seus costumes e cultura...

— E o que achou?

— Fascinante. — comentei, perturbada pela proximidade dele. Havia em Fahir uma aura, um magnetismo tão forte, que me deixava zonza. Eu apertei a manta sobre os ombros.

— Está com frio? As noites aqui são tão geladas quanto os dias são muito quentes. — explicou ele.

— Eu não sou namorada de Jordan. — falei de repente, mudando o assunto de forma brusca.

Ele se virou para mim e, embora não pudesse ver, senti a força de seus olhos azuis alcançarem meu coração.

— Eu desconfiei. Você me parece uma moça decente demais para namorar alguém como ele. — e deu uma risada.

— São muito amigos, não?

— Somos, sim... — e Fahir me contou sobre sua vida na Inglaterra, e como ele e Jordan haviam se conhecido.

— Gosto muito da Sra. Burton também. — disse Fahir com sua voz de veludo. — É uma mulher decidida, firme. Gosto de pessoas assim.

— Os dois são boa gente... mas têm mania de guarda-chuvas.

— Como assim? Você está falando... Ah, claro! Então Jordan não lhe contou? — ele perguntou sorrindo.

Neste momento, seu rosto se virou para mim e meu coração disparou.

— Acontece que aqueles guarda-chuvas eram especiais. Havia algo muito valioso no cabo, que Jordan trouxe da Inglaterra para mim... — e ele me explicou sobre os diamantes, por que eles eram tão importantes a ponto de seu amigo ter roubado o Duque.

— Jordan? Um ladrão de jóias?! — perguntei, incrédula! — E a mãe dele ajudou?! Meu Deus! E eu achando que ele era um panaca!

Fahir riu:

— Há anos, Jordan deixou suas habilidades como engenheiro para se dedicar ao que ele chama de "aliviar as pessoas do excesso de peso em suas consciências".

— Como assim?

— Ele as deixa menos ricas e, por conseqüência, elas se sentem me­nos culpadas em relação à miséria do mundo.

— Não acredito. Como é cínico! Por isso ele não largava daqueles trambolhos... E ainda me mandou tomar conta!

— Porque você não levantaria suspeitas, uma vez que não me conhecia.

— Contratou seu amigo para roubar essas pedras? — perguntei, incrédula.

— Na verdade, não. Estive na Inglaterra um ano atrás e comentei com ele sobre os diamantes e minhas inúmeras tentativas de comprá-los do Duque. Não conseguia convencer o homem de jeito nenhum. Foi quando Jordan se ofereceu para ajudar. Eu devia ter imaginado o tipo de ajuda que ele daria...

— Só não entendo como alguém poderia saber que eles estavam com as gemas.

Fahir ficou sério. Parecia que mil pensamentos passavam por sua cabeça antes de responder:

— No deserto, tudo se sabe. Há um homem, Nu'man Mubharak, que não aceita que eu seja visto como um líder entre meu povo. Estas pedras fazem parte de um objeto sagrado e quem as possuir será visto com mais respeito...

Eu olhava para ele séria, mas minha vontade era sentir aqueles bra­ços fortes em volta de mim. Fahir mexia com todos os meus sentidos, me fazia pensar coisas que normalmente nem passariam por minha cabeça.

— Foi o pessoal desse sujeito que atacou nosso acampamento?

— Sim. Eles queriam as pedras. Mas não foram eles que incendia­ram as tendas. Havia mais alguém ali naquela noite, e eu não sei quem. No meio da confusão, não vimos ninguém.

— E os meninos... os filhos da Sra. Johnson? Por que os trouxe?

— Nós os encontramos correndo pelo deserto. Se ficassem lá, morreriam. Os meninos são inteligentes, mas são apenas crianças.

Mais acostumada à escuridão, vi que Fahir sorria.

— Você gosta deles...

— Gosto de crianças. — respondeu, com voz branda. — Embora nunca tenha tido filhos, aprecio a sinceridade e alegria espontâneas... e também o fato de crianças falarem aquilo que pensam. Elas não são dissimuladas...

Imaginei que Fahir convivesse com muita dissimulação e mentira em seu meio.

— Por que veio à Tunísia? — perguntou ele, recostando-se no banco e suas pernas quase chegaram a tocar as minhas. Meu corpo esquentou-se na hora.

— É uma longa história. Você não terá paciência para ouvir.

— Não estou com pressa... e gostaria de saber. — respondeu ele, me incentivando a falar.

Quando dei por mim, estava contando meus sonhos de infância, o fascínio que sentia pelo deserto e a reação que isso provocava em minha família. Fahir ouvia tudo em silêncio, ocasionalmente rindo de alguma passagem ou fazendo um comentário qualquer, apenas para me estimular a falar mais.

— Então, você foi sempre fascinada pelas areias...

— Desde que me entendo por gente. — afirmei.

— E sonhava com um príncipe tamashek? — ele riu.

Senti que meu rosto estava quente e vermelho, e dei graças por isso não ser visível ao luar.

— Sempre achei que o povo do deserto... o seu povo, era mais emo­cionante e misterioso que o meu.

— Não se engane. Há mistérios na Europa também. — comentou com suavidade.

— Mas lá não existe isso! — disse eu, fazendo um gesto largo. — Não há a magia das areias nem o calor do Saara.

Fahir virou-se para mim e pegou minhas mãos. Senti o coração dis­parar, as pernas tremerem, o estômago se contrair.

— Tem uma visão muito poética sobre o deserto, senhorita Hill. Estas são terras perigosas e traiçoeiras. Nem tudo é romance e poesia por aqui, eu lhe garanto. — disse ele, com voz grave, sem soltar minhas mãos.

— A'ishah. — eu falei. — Me chame assim. Samirtra me deu esse nome e eu gostei. Achei sonoro, bonito.

— Samirtra a chamou de A'ishah? — espantou-se Fahir, largando minhas mãos.

"Não! Pode me chamar do que quiser, mas segure minhas mãos de novo!", pensei. "Mas que droga! Quem mandou eu abrir a boca?"

— O que houve? — perguntei.

Fahir não respondeu. Em vez disso, aproximou seu rosto do meu e eu pude ver seus olhos ao luar. Com o coração a galope, imaginei que seria beijada, mas ele apenas acariciou minha pele com um de seus dedos. O toque foi suficiente para que eu sentisse o rosto arder. Que homem era aquele?

— Samirtra lhe falou sobre uma antiga profecia entre nosso povo? — Fahir se levantou, afastou-se de mim e recomeçou a caminhar. Eu o segui.

— Mais ou menos... Falou sobre seu destino: ser pai daquele que mudará a vida dos tamasheks no futuro.

Caminhávamos lado a lado, sentindo a brisa fria em meio ao per­fume das flores.

— É isso que diz a profecia... Mas, para que haja um pai, é necessá­rio existir uma mãe... — disse ele em tom sério.

Fahir tinha uma pretendente? Será que ele amava alguém? Com essas perguntas na cabeça, perguntei, audaciosa:

— E quem será a mãe dessa criança?

— Eu também gostaria de saber.

— Você não... Quer dizer, nunca...

Sou solteiro, senhorita. E, não, nunca me casei. Como deve saber, os tamasheks são adeptos da monogamia. E mesmo que não fossem, eu sou. Acho que o amor verdadeiro é para sempre, e quando eu me casar será porque amo a mulher que escolhi e com ela quero terminar meus dias.

Ouvi, encantada, suas palavras. Aquele homem forte e guerreiro, que cavalgava como o vento e exalava masculinidade de cada poro de seu corpo, também era capaz de sentimentos doces.

— Nunca encontrou alguém por quem se apaixonou? — perguntei.

Ele virou-se de frente e meu corpo formigou. Achei que ia desmaiar.

Fahir correu os dedos pelo meu rosto, pelos meus cabelos. Ao invés de me responder, perguntou:

— E você, A'ishah, já se apaixonou? — a voz dele estava mais grossa e quente.

Levantei o rosto, procurando ver seus olhos. Fahir acariciou meus cabelos com suavidade. Nenhum de nós falou nada, nenhum de nós se moveu. Ficamos ali parados, um de frente para o outro, envolvidos na sensação daquela proximidade.

— Você deixou alguém na Inglaterra? —perguntou ele com voz baixa.

Lentamente movi a cabeça, indicando que não, sem desgrudar os olhos dos dele.

Fahir pegou minhas mãos e me puxou suavemente para si. Senti seus lábios de aproximarem dos meus, bem devagar, como uma cena em câmera lenta.

Achei que meu coração fosse saltar do peito e sair pulando entre as flores. Senti o calor de seus lábios carnudos tocar os meus e foi como se todas as estrelas do céu caíssem sobre mim numa chuva prateada. Mergulhei num mundo de suavidade e calor, de sensualidade e cari­nho, de paixão e emoção, que ia além de qualquer coisa que eu já havia experimentado ou vivido.

Lentamente sua língua buscou a minha e eu a entreguei com prazer. Nenhum beijo era como aquele. Nenhum homem era como Fahir. Seus braços me envolveram e eu me deixei perder neles, sentindo sua força, sua firmeza, sua virilidade.

Beijei o príncipe do deserto, o homem dos meus sonhos com toda a intensidade e entrega que fui capaz de ter. Um beijo ardoroso, lento e longo... muito longo. Um beijo de entrega, de reconhecimento. Um beijo definitivo. Depois dele, nada seria igual em minha vida e eu sabia disso muito bem.

Fahir me envolveu com força, e eu sentia o contato de seu corpo incendiar o meu. Se ele quisesse, eu seria dele ali mesmo, no meio do jardim, sob o luar do Saara. Ele continuou me beijando cada vez com mais paixão, molhando meus lábios, molhando meu rosto, puxando meus cabelos com suavidade, inclinando mais meu pescoço, de forma a deixar meu rosto exposto para suas carícias.

— Você é linda, A'ishah. Tem olhos quentes como as areias e os lábios doces como o mel. — ele sussurrava com voz apaixonada e eu me derretia cada vez mais.

Passei os braços por seu pescoço e o puxei para mim. Fahir me beijava com muita intensidade e suas mãos me pressionavam contra seu corpo com firmeza, mas em momento algum ele me tocou com mais intimidade.

Não que eu não quisesse. Eu queria, e muito! Mas ele simplesmente não o fez. Em vez disso, afastou-me suavemente e perguntou:

— Por que usava a marca da noiva prometida na testa, aquela noite, no acampamento?

Eu usava o quê?

— Não sei o que havia em minha testa. Uma das moças me levou para uma das tendas e me pintou.

— Você quase perdeu a vida por causa disso. O símbolo em seu rosto indicava que você era a prometida, a noiva do escolhido. Por isso, foi atacada.

— Mas não seria uma infâmia matar a noiva do escolhido? — perguntei, no alto de minha ignorância e curiosidade, ainda agarrada a ele.

— Não se o escolhido fosse eu. — respondeu Fahir, recostando minha cabeça em seu peito largo.

Senti um choque. Tudo acontecia rápido demais e eu não conseguia acompanhar. O que Fahir estava dizendo? Com os sentidos todos foca­dos na presença dele, era difícil raciocinar.

— Você acredita em destino, A'ishah?

— Acho que sim... Como explicar tudo o que aconteceu desde que coloquei os pés neste país? — perguntei, sentindo o perfume dele.

Fahir me abraçou forte e suspirou emocionado. Seus beijos começaram a me envolver outra vez e, quando pensei que ele me tomaria nos braços para me fazer sua, o Príncipe do Deserto me olhou nos olhos e disse:

— Sinto mais que atração por você, Lindsay Hill. Desde aquele dia na Medina, quando apareceu assustada atrás dos meninos, eu soube que era você.

— Era eu...?

— A mulher que eu queria para mim. Quando vi o homem levantar a espada contra você, não pensei em mais nada. Disparei contra ele, mas não fui rápido o suficiente.

— O que está dizendo? Você salvou minha vida! E agora ela te pertence...

Ele me apertou e fechou os olhos com força.

— Melhor irmos dormir. Se eu ficar mais um minuto com você, não sei se conseguirei me controlar.

"Não se controle! NÃO SE CONTROLE!", pensei.

— Eu não quero forçá-la a nada. Sua vida é longe daqui. Tem família, tem profissão. Estar no deserto altera o comportamento das pessoas. Há uma aura mágica nele, que torna todos mais românticos e apaixonados.

Eu sorri. Para quem ele estava dizendo isso!

— Se tivermos que nos pertencer, será porque nosso coração pediu, não porque o deserto nos envolveu. — disse ele, com firmeza.

Eu entendi perfeitamente. Ele dizia o mesmo que Samirtra: "...você deverá decidir se quer ser Lindsay Hill, a moça inglesa, ou A'ishah, a esposa do profeta".

Voltamos e Fahir me acompanhou até a porta do quarto. Beijou minhas mãos e afastou-se com um gesto de reverência.

Senti naquele momento, pela primeira vez na minha vida, o peso e a importância de uma decisão. Diante de mim abriam-se dois caminhos: o primeiro me levava de volta ao mundo seguro e previsível de meu país. O segundo apontava para as areias do deserto, ao lado de um homem bravo e forte, cuja vida era tão incerta quanto as dunas.

E eu tinha menos de 72 horas para escolher qual deles seguiria.


Capítulo VI
Quando os jornais foram entregues no dia seguinte, todos, do New York Times, em Nova York, ao Yomiuri Shimbun, no Japão, estampavam a mesma manchete: "Guerra Entre Tuaregues! Turistas Ingleses Atacados e Seqüestrados na Tunísia".

As reações foram imediatas, tanto dentro do país quanto fora dele, e uma situação que se resolveria pacífica e calmamente em apenas dois dias transformou-se num incidente internacional. Vários vôos turísticos para Túnis foram cancelados. Os países vizinhos fortificaram suas fron­teiras e aumentaram a vigilância nas cidades, principalmente em rela­ção à população nômade, e a embaixada britânica não teve alternativa a não ser envolver-se na captura dos bandidos e resgate dos reféns.

Pelas ruas, vários panfletos circulavam entre os tamasheks, dizendo abertamente que Fahir estava levando seu povo à desgraça e à guerra. O incidente no acampamento foi aumentado e distorcido, de forma a parecer uma ação isolada dos homens de Fahir. No final, havia uma exaltação a Mubharak como sendo o legítimo líder dos tamasheks e o único a ter direito sobre a relíquia sagrada.

Reunidos na embaixada britânica naquela tarde, os homens discu­tiam acaloradamente os acontecimentos e qual a melhor forma de agir:

— Eu avisei que isso aconteceria! — esbravejou o general, vermelho de raiva, diante de um comissário Adiva pálido, que parecia ter encolhido da noite para o dia.

— Não sei como isso vazou! E ainda tem estes malditos panfletos! — exclamou ele.

— Fahir deu notícias? — perguntou o embaixador.

— Não entendo isso! Quem ele pensa que é para decidir quando e como vai devolver as pessoas que seqüestrou?! — exclamou o general, revoltado.

— Bom dia, senhores. — disse, com voz calma, o homem que entrava pela porta, interrompendo a discussão sem a menor cerimônia.

Todos se levantaram, menos o general, que, já estando em pé, apenas ficou em posição de sentido. O comissário olhou para a mais alta autori­dade de seu país, achando que seus dias na polícia estavam contados.

— Sentem-se, por favor. O senhor também, general. Vamos resolver isso com calma. — disse com autoridade. — Não podemos arriscar a boa imagem de nosso país e nem deixar que o pânico se espalhe entre nossos vizinhos. Mas também não podemos permitir que uma briga entre tamasheks assuma proporções nacionais. Sabemos quem levou a notícia ao conhecimento da imprensa?

— Nu'man Mubharak em pessoa. — informou o embaixador. — Fa­lei com meu amigo Phillip Stewart, no London Times, e ele confirmou que a informação foi dada por telefone, em todos os detalhes.

— Manobra inteligente. — comentou o emissário preocupado. — Subestimei Mubharak. Não pensei que ele fosse arriscar a vida de seu povo desta forma, apenas para desacreditar Fahir. E com todos esses panfletos circulando...

— General, o que temos? — perguntou o presidente.

Antes que o homem respondesse, outra pessoa entrou na sala e co­chichou algo no ouvido do presidente, que se levantou e saiu.

Alguns minutos depois, voltou trazendo consigo uma mensagem de Fahir.

— Os meninos foram entregues a uma das patrulhas na entrada do deserto. Estavam sozinhos, mas em excelentes condições. — comunicou o presidente. — Já estão a caminho daqui em um de nossos helicópteros. Em menos de uma hora poderemos falar com eles.

— Como chegaram até lá? — espantou-se o general. — Todas as saídas do deserto estão vigiadas!

— Está lidando com tamasheks, general. O território é deles, não nosso. Podem se esconder como mágicos entre as dunas e jamais serem encontrados.

— E os outros? — perguntou o embaixador.

— Segundo Fahir, estarão aqui depois de amanhã. Os meninos es­tão vindo antes por questões de segurança. — respondeu o presidente, lendo a mensagem. — Ele disse que há homens por todo o deserto e a travessia não é segura.


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