371 Guia de Economia
Comportamental e Experimental
quando incluem pequenos brindes em cartas solicitando
contribuições, e supermercados tentam induzir as pessoas
a comprar oferecendo amostras grátis. A reciprocidade tam-
bém é usada como uma ferramenta de influência social na
forma de “concessões recíprocas”, uma abordagem também
conhecida como técnica da “porta na cara”, na qual uma pes-
soa primeiro faz um pedido grande, como comprar um pro-
duto caro, seguido por um pedido menor, como uma opção
menos cara, se a pessoa recusar o pedido inicial. A pessoa
então se sente na obrigação de “retribuir o favor” concor-
dando em atender ao pedido (Cialdini, Vincent, Lewis, Cata-
lan, Wheeler e Darby, 1975).
Regra do pico-fim
Segundo a regra do pico-fim, o que recordamos de expe-
riências passadas (agradáveis ou não) corresponde não a um
nível médio de sentimentos positivos ou negativos, e sim ao
ponto mais extremo e ao fim do episódio (Kahneman e Tver-
sky, 1999). Essa regra foi derivada com base em descobertas
de que as avaliações de um episódio passado parecem ser
determinadas por uma média ponderada de “instantâneos
fotográficos” de uma experiência, desconsiderando-se, as-
sim, sua verdadeira duração. Esses momentos prototípicos
estão relacionados aos julgamentos que as pessoas fazem
quando aplicam a heurística da representatividade (Frederi-
ckson e Kahneman, 1993).
Risco como sentimento
As perspectivas “consequencialistas” da tomada de decisão
sob risco ou incerteza (teorias de escolha de risco, ver, por
exemplo, teoria da perspectiva) tendem a enfocar apenas fa-
tores cognitivos ou considerar emoções como um resultado
antevisto de uma decisão:
A hipótese do risco como sentimentos (Loewenstein et al,
2011), por outro lado, inclui emoções também como um fator
de expectativa, ou seja, os sentimentos no momento da to-
mada de decisão.
Em contraste com teorias como a heurística do afeto, nas
quais os sentimentos têm um papel informacional e ajudam
a decidir entre alternativas, a ideia do risco como sentimen-
tos pode explicar os casos em que escolhas (por exemplo,
recusar-se a viajar de avião por medo) divergem daquilo que
o indivíduo considera objetivamente a melhor linha de ação.
S
Satisficiência (Satisficing)
Segundo Herbert Simon, as pessoas tendem a tomar de-
cisões com base na satisficiência (uma combinação de sa-
tisfação e suficiência) e não na otimização (Simon, 1956).
Muitas decisões são simplesmente “boas o suficiente” dados
os custos e restrições envolvidos. No caso da satisficiência
como uma heurística, os indivíduos que a buscam escolherão
opções que atendem aos seus critérios de decisão mais bási-
cos. Os arquitetos da escolha podem enfocar a satisficiência
quando o tomador de decisão é propenso à procrastinação
(Johnson et al., 2012).
Sistema 1/2
Ver Teoria do sistema dual
Sobrecarga de informação
Também conhecido como “sobrecarga de escolha”, esse fe-
nômeno ocorre em consequência de haver opções em ex-
cesso à disposição das pessoas. A sobrecarga de informa-
ção pode referir-se a opção de atributos ou alternativas. A
aplicação de heurísticas na tomada de decisão torna-se mais
provável quando as alternativas são mais numerosas ou mais
complexas. A sobrecarga de informação foi associada a infe-
licidade (Schwartz, 2004), fadiga de decisão, permanência
na opção default e também ao adiamento da escolha, quan-
do se evita totalmente tomar a decisão, por exemplo, não
comprando o produto (Iyengar e Lepper, 2000). A sobre-
carga de informação pode ser neutralizada simplificando-se
os atributos da escolha ou o número de opções disponíveis
(Johnson et al., 2012).
Superjustificação
Esse efeito ocorre quando o interesse intrínseco de uma pes-
soa em uma atividade anteriormente não recompensada di-
minui depois que ela passa a exercer essa atividade como um
meio de atingir um objetivo extrínseco, como, recompensa
financeira (Deci et al, 1999). Em consequência, por exemplo,
para voluntários o número de horas trabalhadas pode ser
afetado negativamente por pequenas recompensas finan-
ceiras (Frey e Goette, 1999).
T
Teoria da Perspectiva (Teoria dos Prospectos)
A teoria da perspectiva, um modelo comportamental que
mostra como as pessoas decidem entre alternativas envol-
vendo risco e incerteza (por exemplo, probabilidades de
ganho ou perda), demonstra que as pessoas raciocinam
com base na utilidade esperada relativamente a um ponto
de referência (por exemplo, a riqueza corrente) e não em
resultados absolutos. A teoria da perspectiva foi desenvol-
vida recorrendo-se a um framing de escolhas de risco. Ela
indica que as pessoas têm aversão à perda e que, como a
aversão à perda supera o prazer por um ganho equivalente,
os indivíduos se mostram mais dispostos a correr riscos para
evitar a perda. Devido à ponderação viesada de probabilida-
des (ver efeitos certeza/possibilidade) e à aversão a perda
(Kahneman e Tversky, 1979; Kahneman, 2011) essa padrão se
mantém em diversos contextos.
Teoria dos jogos (comportamental)
A teoria dos jogos comportamental é uma abordagem mate-
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mática para a construção de modelos de comportamento ana-
lisando as decisões estratégicas tomadas por jogadores que in-
teragem (Nash, 1950). Na economia experimental tradicional, a
teoria dos jogos supõe um maximizador racional, o homo eco-
nomicus. A teoria dos jogos comportamental amplia a teoria
dos jogos tradicional (analítica) porque leva em conta como os
jogadores se sentem com respeito a recompensas que outros
jogadores recebem, os limites ao pensamento estratégico e os
efeitos do aprendizado (Camerer, 2003).
Um exemplo pioneiro de estudo que descobriu violações das
suposições clássicas sobre a racionalidade ocorreu na forma
de um simples jogo do ultimato. No experimento, é dada uma
quantia em dinheiro a um jogador (o proponente/alocador) e
se pede que ele a divida com outro jogador anônimo (o res-
pondente/recipiente). O recipiente pode aceitar a proposta
do alocador ou rejeitá-la, e nesse último caso nenhum dos
dois jogadores recebe coisa alguma. Da perspectiva da teo-
ria dos jogos tradicional, o alocador só deveria oferecer uma
quantia mínima, e o recebedor deveria aceitá-la. No entanto,
os resultados mostraram que a maioria dos alocadores ofe-
receu mais do que um pequeno pagamento, e muitos chega-
ram a oferecer a metade. Algumas ofertas foram recusadas
pelos recebedores, o que sugere que eles estavam dispostos
a fazer um sacrifício quando sentiam que a oferta era injusta
(Guth, Schmittberger e Schwarz, 1982). Ver também aversão
à desigualdade.
Teoria do Sistema Dual
Os modelos da mente humana como um sistema dual con-
trastam o pensamento baseado no Sistema 1, que é auto-
mático, rápido e não consciente, com o do Sistema 2, que
é controlado, lento e consciente. Muitas heurísticas e vieses
cognitivos estudados por economistas comportamentais
são resultado de intuições, impressões ou pensamentos au-
tomáticos gerados pelo Sistema 1 (Kahneman, 2011). Entre os
fatores que tornam os processos do Sistema 1 mais dominan-
te estão: excesso de atividade cognitiva, distração, pressão
do tempo e disposição de ânimo positiva. Já os processos
do Sistema 2 tendem a prevalecer quando a decisão envolve
um objeto importante, tem acentuada importância pessoal e
quando o tomador de decisão precisa prestar contas a ou-
tros (Samson e Voyer, 2012; Samson e Voyer, 2014).
U
Utilidade
Em economia, chama-se de utilidade os benefícios (satisfa-
ção ou felicidade) que o consumidor extrai de um bem, e ela
pode ser medida com base em escolhas entre alternativas ou
em preferências reveladas na disposição para pagar. Econo-
mistas comportamentais questionam antigas suposições de
que a utilidade sempre é maximizada, e trabalham tanto com
as medidas de utilidade tradicionais como com as novas.
•
A utilidade esperada é usada em economia, e também
na teoria dos jogos e na teoria da decisão, incluindo a
teoria da perspectiva. Baseia-se em escolhas com re-
sultados incertos.
•
A utilidade descontada é uma forma de utilidade usada
no campo da escolha intertemporal da Economia Com-
portamental (Berns et al., 2007).
•
A utilidade da experiência relaciona-se a experiências
reais (hedônicas) ligadas a um resultado que é asso-
ciado a teorias sobre previsão de erros como o viés da
diversificação.
•
A utilidade lembrada sugere que as escolhas das pes-
soas também se baseiam em suas memórias de eventos
passados, e é empregada na regra do pico-fim.
•
A utilidade instantânea e a utilidade prevista são usa-
das na área da escolha intertemporal, por exemplo, em
pesquisas sobre a lacuna de empatia, mostrando que
a utilidade prevista é viesada na direção da utilidade
instantânea (Camerer e Loewenstein, 2004).
•
A utilidade processual é importante se o indivíduo valo-
riza não apenas os resultados, mas também os proces-
sos que conduzem a eles (Frey, Benz e Stutzer, 2004).
•
A utilidade social relaciona-se à teoria dos jogos, na
qual os jogadores nem sempre
agem por autointeresse
e mostram preocupação com as intenções percebidas
de outros jogadores e com a justiça (Camerer, 1997).
V
Viés cognitivo
Um viés cognitivo (ver Ariely, 2008) é um erro sistemático
(não aleatório) de pensamento, quando o julgamento se des-
via do que seria considerado desejável da perspectiva das
normas aceitas ou do que seria correto com base na lógica
formal. A aplicação de heurísticas frequentemente é asso-
ciada a vieses cognitivos, alguns dos quais, como os decorr-
rentes de disponibilidade ou representatividade, são “frios”,
no sentido de que não refletem a motivação da pessoa e re-
sultam de erros no processamento de informações. Outros
vieses cognitivos, especialmente os que atendem ao autoin-
teresse (por exemplo, o viés do otimismo), são mais motiva-
dos. Finalmente, alguns vieses, como o viés da confirmação,
podem ser motivados ou não motivados (Nickerson, 1998).
Viés da confirmação
O viés da confirmação ocorre quando as pessoas buscam ou
avaliam informações que sejam adequadas àquilo que elas
já pensam ou a ideias preconcebidas. O campo da ciência,
onde as teorias devem avançar mediante a refutação ou
comprovação de evidências, não é imune a esse viés, fre-
quentemente associado à tentativa de defender atitudes ou
crenças existentes. Por exemplo, um consumidor que gosta
de determinada marca e começa a pesquisar para uma nova
compra pode ser motivado a procurar na internet avaliações
de clientes que favoreçam essa marca. O viés da confirma-