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Deixem-me falar da mudança de ritmo que espero que vá surgir no futuro
próximo. Todos sabemos que a idade mediana da população no Ocidente
está aumentando. Os cientistas sociais já estão atentos para o interesse
da geriatria como área de pesquisa e os governos prometem criar
programas que lidem com idosos.
Atualmente os idosos anseiam por um tipo de conforto vindo do rádio
diferente do procurado pelos jovens. Eles têm seus programas favoritos e
estão menos propensos a precisar de um fluxo contínuo de som, que
interfira na rotina de seus dias. A música que apreciam é mais lenta e
mais suave. Eles preferem vozes mais velhas: há menos esperança de vida
para elas também.
Quanto tempo vai levar até que os ritmos do rádio comecem a se
desacelerar a fim de agradar a este público crescente (e incidentalmente
afluente)? A CBC já adiantou o seu primeiro noticiário noturno uma hora
por causa dos idosos, que se deitam mais cedo. Os idosos também levam
menos tempo ao volante. Eles vivem em ambientes mais tranqüilos;
temem menos o silêncio do que os jovens. Estas considerações se
revelarão na revisão dos padrões das transmissões em relação à idade e à
cadência das vozes dos anunciantes, na escolha e no encadeamento das
canções, nos tópicos de discussão e nos métodos de junção de todo este
material.
Ouvir rádio na presença de barulho (o rádio do carro é um bom exemplo)
teve um efeito muito interessante sobre o planejamento da programação:
ele foi eliminado. Em qualquer sistema exposto ao barulho, a informação
tem de ser reduzida e a redundância aumentada. Os programas que
possuem um alto quociente informacional (educacional e cultural) são
colocados de lado em favor daqueles nos quais a modulação básica é
repetida e parcamente variada. Os flashes com músicas da parada de su-
cessos, notícias e previsão do tempo são exemplos de tais repetições. Isto
não é meramente uma questão de gosto; isto é resultante de
considerações técnicas afetadas pelo ambiente onde a audiência se
encontra. A Grã-Bretanha, o Canadá e a França tiveram uma história de
produção radiofônica que enfatizava uma programação de alto nível
intelectual — ao menos até a época em que o rádio do carro, o rádio da
loja e o rádio da rua a colocaram no ostracismo.
Antigamente, os programas de rádio existiam para atender ao interesse
de grupos especiais. Guias de programação eram publicados e
consultados. Conheço pessoas no Canadá e na Europa que assinalavam no
guia a cada semana o que queriam ouvir e ficavam em casa ao invés de
irem ao cinema, à sala de concertos ou ao teatro.
Um excesso de barulho no ambiente produz ouvintes superficiais. Não se
presta mais atenção ao rádio; ele é ouvido ao mesmo tempo em que se
ouvem outras tantas coisas. Ele fica ligado, nos protegendo da rudeza da
vida moderna. O rádio se tomou o canto do pássaro do século XX,
decorando o ambiente com “graça”.
Buckminster Fuller costumava dizer que o lixo era um produto sem
embalagem. Barulho é lixo. Usar fones de ouvido coloca um escudo
protetor entre ele e o consumidor. Não se trata de um uso corretivo
contra a poluição sonora, mas de um uso profilático. Isto representa um
esforço determinado por parte do público de escapar das interrupções
sonoras e retomar a serenidade de uma escuta seletivo e contínua. Isto
também é uma questão que os programadores de rádio criativos não
deveriam ignorar.
Qualquer forma de arte precisa produzir uma metalinguagem, com o
auxílio da qual possa ser adequadamente descrita. A poesia e a pintura
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são formas de arte porque possuem uma teoria da poesia e da pintura. O
rádio, tal como existe no momento, não é provavelmente uma forma de
arte. Falta-lhe um aparato exegético (ou até mesmo um guia de
programação adequado) para a análise externa. Em The tuning of the
world, chamei atenção para a pobreza da crítica que lida com este rico e
potente ambiente sonoro contemporâneo. O que precisamos é de um
estudo da transmissão radiofônica em termos de semiótica, de semântica,
de retórica, de rítmica e de forma. Um bom programa de rádio merece a
mesma atenção que um bom livro ou um bom filme. E o formato da
programação deve ser tão interessante para o sociólogo ou para o
antropólogo quanto o formato da própria vida. Com uma análise do rádio,
uma crítica séria da radiodifusão poderia se iniciar, e com ela, sérios
mudanças.
O seu comentário só é válido para os outros se eles souberem que
também serão capazes de ver e ouvir as coisas que você está discutindo.
Um rádio que busca ansiosamente a novidade e o imediatismo não
encoraja a atenção crítica. Mas isso também é uma moda.
Esta era está intimamente ligada ao nome de McLuhan, porque ele foi o
primeiro a tomar o seu pulso. A eletricidade, afirmou McLuhan, é a
informação total. De uma hora para outra os programadores de rádio
ficaram atentos para o caráter de tudo-ao-mesmo-tempo-agora do sinal
de rádio. Lawrence Blair descreve-o desta maneira:
“Nenhuma linguagem se constitui em uma barreira para a confraria
secreta dos radioamadores e dos operadores profissionais de rádio. Eles
ficam sentados, em todo o mundo, separados por milhares de
quilômetros, apesar de conectados pela eletrônica — a única pista da sua
existência são as antenas metálicas em seus tetos. Esta confraria
intencional está sempre desperta, monitorando e alimentando com
informações o planeta: as reviravoltas políticas, as novas descobertas, as
catástrofes são enviadas em alguns minutos. A hipotética Noosfera de
Teillhard de Chardin, um envoltório de ´pensamento` em volta do mundo,
é agora bem real ”.
Era nisso que acreditávamos há vinte anos, e eu não gostaria de fazer uma
estimativa de quantas concessões foram dados a emissoras de rádio como
resultado de promessas de trazer o mundo até os lares dos mais
numerosos e mais distantes grupos de pessoas. Esta era a camuflagem
que escondia a intenção de usar a concessão para fazer dinheiro.
A decepção ainda viceja hoje em dia. Ela é chamada de “rádio
informativo”. A sua desculpa é a de conector o ouvinte no mesmo
instante aos acontecimentos vitais onde quer que estejam se produzindo
neste planeta. Sua meta é a de manter tudo no fio da navalha do tempo
presente.
Fomos levados a supor por seus defensores (e é certo que McLuhan não é
inocente com relação a isso) que o potencial do veículo se desenvolve
melhor desta maneira. De fato, um potencial é desenvolvido. Mas quando
o interesse por ele passa, o “rádio informativo” se torna uma moda como
outra qualquer, e a moda, como Cocteau uma vez observou, é o que sai
de moda.
Eu costumava deixar meus alunos monitorarem estações de rádio e
depois pedir para afixarem nos mapas alfinetes em cima de cada
topônimo que fosse mencionado na programação — os nomes de cidades
e de países, a localização de cada acontecimento. O que aparecia em
quase todos os casos era uma aglomeração de alfinetes afixados em volta
da própria comunidade, com uma vaga dispersão pelo resto do mundo.
Ao olhar para estes mapas, ninguém conseguia deixar de chegar à con-
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