Universidade Federal do Rio de Janeiro a relaçÃo literariedade, imagem e imaginários em



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tocante,  tenha-se  o  sentido  em  um  texto  ficcional  como  uma  inevitável  operação  em  que  a 
semantização produz nos receptores o mesmo processo de tradução que o fictício  efetua em 
seus  agentes  produtores.  Tais  processos  complementares  de  tradução  do  imaginário 
comprovariam,  assim,  ser  este  a  energia  constitutiva  do  texto  ficcional.  Para  Iser  (1983,  p. 
409), “se o fictício é a tradução do imaginário na configuração concreta para o fim de uso, a 
semantização  é  a  tradução  de  um  acontecimento  experimentado  na  compreensão  do 
produzido”. 
Tudo  isso  resulta  de  outra  correspondência  com  a  psicologia,  levada  a  cabo  por 
Wolfgang Iser. Nela, o autor alemão trabalha a correlação entre percepção e representação tal 
como empregada pela psicologia gestaltista. A tomada que faz desta teoria advém da corrente 
da  psicologia  da  Gestalt  em  que  representação  e  percepção  se  empregam  no  sentido  de 
fechamento  de  formas,  com  as  quais  ambas  ocorrem  ao  mesmo  tempo,  em  que  ambas  são 
produzidas  através  de  nosso  hábito  psíquico  de  orientar  a  atividade  de  classificação  dos 
elementos absorvidos do real. Compreendida a Gestalt, grosso modo, como um processo, um 
ato  de  buscar  dar  forma,  de  configurar  o  que  se  apresenta, o  que  se  vê,  o  que  se tem  posto 
diante dos olhos, exposto à nossa mirada
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, pode-se dizer, a partir dos argumentos iserianos, 
que  somente  quando  uma  Gestalt  se  fecha  é  que  se  realiza  a  percepção,  ou  seja,  apenas  a 
partir  de  então  o  objeto  imaginário  surge  na  consciência  imaginante.  Por  isso,  buscamos  a 
‘ordenação’ dos dados, para que os possamos distribuir de maneira a possibilitar a eliminação 
da tensão que há no surgir aparentemente indômito do imaginário até enfim alcançar-se, já na 
Gestalt fechada, a determinação que se pretende ter, a procura por fornecer ao imaginário um 
caráter de “concretude”, diferente de sua inicial  característica difusa de surgimento. Isso faz 
com que, do caractere arbitrário que traz consigo o imaginário quando de seu ‘nascimento’, 
produza-se  de  modo  consequente  a  necessidade  humana  do  receptor  em  controlar  a 
experiência de acontecimento do imaginário (das ereignishafte Erfahren des Imaginaren) (Cf. 
ISER, 1983, p. 408).  
No  que  diz  respeito  a  essa  espécie  de  busca  por  controlar  o  imaginário,  coincidem 
algumas  ideias de Iser com  as de outro teórico que  lança olhar sobre o assunto. Trata-se do 
teórico literário brasileiro Luiz Costa Lima, contemporâneo do alemão e em quem ao mesmo 
passo  ele  encontra  margem  para  diálogos  entretecidos  sobre  algumas  das  questões  teórico-
literárias que movem a ambos. 
                                                             
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  Entende-se  aqui  que  mesmo  os  cegos  podem  “ver”,  portanto  imaginar,  através  e  a  partir  de  seus  outros 
sentidos,  portas  aguçadas  tanto  para  sua  percepção  quanto  para  sua  representação  (ou  reapresentação)  do  que 
captam. 


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Embora o controle do imaginário a que se refere Wolfgang  Iser seja tratado de modo 
mais abrangente pelo autor brasileiro (saindo um tanto mais da esfera do indivíduo para o uso 
dos aparelhos controladores do Estado, da Igreja, do  mercado etc.), resulta complementador 
trazer  à  luz  alguns  de  seus  esclarecimentos  sobre  a  abordagem  do  imaginário.  Entretanto,  é 
importante repetir que suas observações não se detêm tanto em teorizar o imaginário, mas, na 
verdade, referir-se ao controle exercido sobre este
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. Ainda assim, em seu percurso na direção 
das origens de tal controle há também o registro do encontro do autor com possibilidades de 
origens  do  termo  imaginário,  estivessem  estas  tanto  na  mímema  grega  quanto  na  tradução 
romana, e depois renascentista, de mímesis por imitatio e não, por exemplo, por emulatio, que 
em  verdade  levaria  até  o  sentido  de  emulação  que  talvez  quisessem  transmitir  romanos  e 
renascentistas  (neste  caso,  uma  provável  escolha  com  propósito,  ainda  que  não  declarado, 
controlador). 
Porém, são as coincidências de pensamento entre o brasileiro e o alemão  as que mais 
cobram atenção. Costa Lima retoma seu colega alemão ao corroborar uma questão chave na 
explanação  iseriana sobre o que é  fictício no texto ficcional:  a  explicação dos atos de fingir 
através de sua ligação com a estrutura que Iser denomina como se. Costa Lima concorda com 
Iser quando este aponta que é sob a ótica do como se que o ato de fingir se refere ao mundo e 
se  conecta  ao  imaginário,  atualizando-o.  Por  essa  referência  e  conexão  é  que  são  assim 
transgredidos  os  limites  tanto  do  mundo  como  do  imaginário  (Cf.  LIMA,  2007,  p.  96).  O 
teórico brasileiro ainda estende um pouco mais suas explicações ao diferenciar ficção interna 
de externa. A primeira é a que se realiza em uma obra ficcional (um romance, um poema, uma 
peça  teatral,  um  filme  ou  uma  pintura  não  estritamente  abstrata,  por  exemplo).  As  ficções 
externas seriam aquelas em que se dá a utilização do como se, por serem formas de presunção 
que  presidem  o  inter-relacionamento  humano,  que  não  se  baseiam  em  uma  convenção 
estabelecida ou mesmo em uma hipótese razoável (Cf. LIMA in BASTOS, 2010, p. 381)
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.  
                                                             
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  Haja  vista,  por  exemplo,  os  títulos  de  suas  obras  dedicadas  ao  tema,  como:  Trilogia  do  controle  (2007), 
compilação  que  reúne  os  volumes  de  O  controle  do  imaginário.  Razão  e  imaginação  nos  tempos  modernos 
(1984), Sociedade e discurso ficcional (1986) e O fingidor e o censor (1988). Além de O controle do imaginário 
& a afirmação do romance (2009).  Algo também preponderante em outro autor de suma importância a tratar do 
imaginário.  O  filósofo  francês  Gilbert  Durand  (2011,  p.  12),  já  trabalhado  no  tópico  1.2  e  que  ora  e  vez  será 
retomado  na  análise  dos  corpora, aborda muito  o  tema  imaginário  desde  o  ponto  de  vista  de  “resistências  do 
imaginário”,  resistências  de  toda  uma  imaginária  (termo  também  do  autor)  por  um  iconoclasmo  ocidental  de 
cunho  não  só  religioso,  mas  também  ideológico,  atinente  ao  campo  das  ideias,  imposto  pela  retomada  do 
pensamento racionalista aristotélico por correntes como o positivismo e o cientificismo ocidentais.  
  
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  Explicação  de  Costa  Lima  sobre  ficção  interna  e  externa, no  livro  Luiz  Costa  Lima:  uma  obra  em  questão 
(2010),  que  reúne  uma  série  de  entrevistas  concedidas  a  diferentes  teóricos  interlocutores,  organizadas  pelo 
teórico brasileiro Dau Bastos.  


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