Universidade Federal do Rio de Janeiro a relaçÃo literariedade, imagem e imaginários em



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artimanhas que já demonstrou possuir, da língua inglesa o suficiente para poder traduzi-la ao 
receptor  das  histórias  que  conta.  Tamanho  exercício  de  ficção  pode,  por  conseguinte, 
reconduzir-nos  a  uma  ironia  lançada,  e  já  citada  no  primeiro  tópico  dessa  seção,  pelo 
personagem Dionisio, em “El despojo”, terceiro conto da obra. Ali, ufanando-se do avanço da 
língua  espanhola  nos  Estados  Unidos,  o  chef  mexicano  indaga  também:  “¿Cuántos 
mexicanos, en cambio, hablaban correctamente el  inglés?  Dionisio sólo conocía a dos, Jorge 
Castañeda y Carlos Fuentes, y por eso estos dos sujetos le parecían sospechosos” (FUENTES, 
[1995] 2007, p. 65).  
É, pois, essa mesma suspeita irônica que recai sobre os posicionamentos atribuídos aos 
personagens  de  “Las  amigas”.  Não  seriam  certas  imagens  que  podem  compor  com 
imaginários através do enredo de La frontera um transparecer de posicionamentos intelectuais 
do  próprio  Carlos  Fuentes  sobre  as  relações  de  alteridade  suscitadas  no  romance?  Tais 
posicionamentos parecem responder pela utilização, pela transposição e interposição literária 
de intersecções identitárias, às quais denomino, dada a observação de seu uso em La frontera 
de cristal, de “mex-(anglo)-chicanidades”.  
No romance de Carlos Fuentes ora trabalhado sobressaem  certas ações na escolha de 
personagens que terminam por encarnar tipos ou tipificados são. Dentre tais ações vinculados 
estão, como tenho demonstrado até aqui, o desenvolvimento de situações narrativas por meio 
do tropo amplificado ao qual chamo de metáfora ampla e sua consequente interligação com a 
caracterização  de  personagens  específicos  através  de  metonimizações  o  mais  das  vezes 
hiperonímicas, verdadeiras sentenças e totalidades metonímicas que, por intermédio de outras 
ações de escolha narrativa, (re)desenham moldes identitários. São essas ações que interagem 
junto e com a  metonímia em  La frontera  as que  seguem:  a descrição (recurso suscitador de 
imagem também  fundamental  no desenrolar e estabelecimento da  metáfora ampla); o pinçar 
personagens  para  destaque;  e  a  devida  distinção  que  se  opera  na  definição  literária  de  seus 
traços, tanto físicos quanto comportamentais. 
Tudo indica, entretanto, que a busca por trabalhar literariamente a distinção de traços 
característicos, apesar da  ficção em que se  insere  no romance aqui em evidência, obedece  a 
uma continuidade, no texto ficcional, de todo um projeto intelectual de buscar respostas para 
entender, explicar a  formação e ação da psique e  da  identidade do sujeito  mexicano. Ocorre 
que esse  fruto de um projeto de toda uma geração de  intelectuais se dá, principalmente, via 
ensaio,  esse  gênero  em  que  a  habilidade  de  convencimento,  de  apanhamento  nas  redes  de 
argumentos  que  cria  e  desenvolve  o  bom  escritor  se  evidencia,  deixando  escapar,  em 
contrapartida,  a  objetividade,  o  afastamento  de  seu  objeto  de  estudo  requerido  para 


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observações  de  metodologia  mais  científica,  de  maior  rigor  científico  e,  portanto,  menos 
subjetiva ou em que a subjetivação do autor, do pesquisador, veja-se minimamente marcada. 
Como  já  pude  expor  em  pesquisa  anterior,  interferem,  agem  de  modo  mais  incisivo 
sobre a ficção de La frontera de cristal as ideias, observações e posicionamentos ideológicos 
da  ensaística  dos  intelectuais  mexicanos  Samuel  Ramos  [1934]  (1963,  1984)  e  Octavio  Paz 
[1950]  (1959)
83
.  Os  ensaios  do  próprio  Carlos  Fuentes  em  seu  El  espejo  enterrado  [1992] 
(2010) completam a tríade que acaba por incidir na caracterização de imagens que na ficção 
de La frontera representam literariamente pretensos traços distintivos, já sejam do mexicano, 
do  chicano  ou  do  estadunidense.  A  tal  incidência  corresponde  a  criação  de  traços 
comportamentais e identitários potencializados na linguagem literária do romance, compondo 
verdadeiros  conjuntos  identitários  que  se  entrechocam  e  se  atravessam  em  intersecções  de 
identidades.  
Esses delineamentos de distinção, ecos também dos posicionamentos  ideológicos em 
que se baseiam, destacam-se no romance de Fuentes como conjuntos de marcas de identidade, 
podendo ser entendidos como mexicanidades e chicanidades que giram em torno do elemento 
anglo, e talvez o que possamos chamar de anglo-americanidades, como alteridade inimiga, em 
“guerra” aguçada  nas relações  fronteiriças que ultrapassam o entorno da região de fronteira 
que “co(m)partem” México e Estados Unidos, chegando a um nível de entendimento em que 
se tem a fronteira também, ou mais bem, como um problema cultural.  
Com o termo hifenizado “mex-(anglo)-chicanidades” quero, por fim, demonstrar que, 
na  obra  de  Carlos  Fuentes  sobre  a  que  debruço  este  estudo,  tais  conjuntos  identitários  são 
intersecções porque não se completam, não chegam a se  completar porque entre um e outro 
está  o  elemento  anglo,  o  evocado  inimigo  ianque,  na  voz  que  invoca  um  passado,  também 
revolucionário
84
,  de  exacerbada  aversão  ao  estrangeiro.    Mas,  cabe  pensar  como  eclodem, 
como  tratadas  são  essas  intersecções,  essas  “mex-(anglo)-chicanidades”  e  de  que  maneira 
criam,  interferem  ou  se  coadunam  a  imaginários  prévios  através  e  na  literatura  da  obra  em 
tela? 
Alguns pares contrastivos se apresentam como importantes pontos de observação para 
elucidação  da  maneira  em  que  ocorrem,  a  disposição  em  que  se  dão  as  intersecções 
                                                             
83
 Remeto o leitor ao segundo capítulo de minha Dissertação de Mestrado  ¿Quién soy yo? A fragmentação do 
sujeito mexicano em La frontera de cristal (Universidade Federal Fluminense – UFF, 2010), onde discorro de 
modo mais abrangente sobre as correspondências que aqui não serão desenvolvidas em razão de que, na presente 
tese, a ênfase do recorte escolhido é voltada diretamente para o trato literário das correlações já verificadas e sua 
conseguinte influência e interferência sobre a formação e perpetuação de imaginários.   
84
 Remeto  o leitor ao ensaio “De la independencia a la revolución”, de Octavio  Paz, do seu  El laberinto de la 
soledad (1950) [1959].   


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