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Archibald, buen juicio. Mis convicciones son definidas, arraigadas e inconmovibles.
Nadie me las va a cambiar a estas alturas.
Se permitió un respiro hondo y un poco lúgubre.
– Los mexicanos son holgazanes.
– Haga una prueba. Es gente servicial, acostumbrada a obedecer.
– Tú también tienes tus prejuicios, ya ves – rió [sic] un poquito Miss Amy
(FUENTES, [1995] 2007, p. 159 – grifo meu).
O fragmento apresenta no desenrolar do diálogo uma mostra de sentenças de
metonimização, ora amenizadas ou por um “Tienen fama de” (em que ainda não se afirma,
não se taxa ou se evidencia a opinião de que de fato são) ou pela contestação seguinte “Es un
estereotipo”; ora relativizadas no jogo discursivo que se faz operar entre a afirmação daquela
que antes modalizava seu discurso, passando de um “Tienen fama de” para a asseveração em
“Los mexicanos son holgazanes”, e o preconceito explícito em “Es gente servicial” daquele
que antes contestava a estereotipia. E é justo no jogo dialógico proposto (“eu disse isso, mas
você também”) que parece perder-se, nesse primeiro momento, uma tendência mais carregada
a encaminhar o leitor para a proximidade equalitiva entre os termos da seguinte equação:
estereótipo (preconceito) → metonímia (hiperonímia) → imaginário (imaginários).
É esse êxito, porém, que a meu ver começa, ou amaina ora e vez (se se atém a
observações já feitas desde a abordagem analítica de “La capitalina”), a se mostrar menos
consistente quando, por exemplo, adianta-se à retomada das questões sobre estereótipos de
volta à baila no momento em que Miss Amy volta a questionar seu sobrinho, curiosa, dessa
vez, em saber da ornamentação do quarto de sua empregada Josefina:
– ¿Qué tiene en la recámara? (…) ¿Cómo la adorna?
– Como todas las mexicanas, tía. Estampas de los santos, imágenes de Cristo y la
Virgen, un viejo exvoto dando gracias, qué sé yo.
– La idolatría. El papismo sacrílego.
– Así es y nada lo va a cambiar – dijo Archibald, tratando de contagiarle un poco
de resignación a Miss Amy (FUENTES, [1995] 2007, p. 167 – grifo meu).
No diálogo acima, o que antes era mostra aproximativa suavizada nas trocas de
posicionamento no discurso passa, então, a evidenciar-se de forma mais clara como sentença
metonímica em que a parte Josefina serve de modelo, ao igual ao que fora feito com
Michelina, hiperonimizado de um todo presumível e suposto: o imaginário de que, em que
todas as mexicanas são religiosamente idólatras, algo que recai sobre o imaginário maior
acerca da religiosidade dos mexicanos: o México, todo o México é católico, e idólatra. Dessa
maneira, tomada a parte como um todo, a totalidade hiperonímica da ideia levantada encontra
seu complemento, seu fechamento taxativo no feito de que, na voz de Archibald, “nada lo va a
cambiar”.
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Entrementes, logo a seguir, a narratividade coiote de La frontera tenta retomar ou
demonstrar a uma só vez controle e afastamento objetivo da situação evocada, buscando nova
relativização de posicionamentos. Desse modo, Miss Amy segue seu diálogo com o sobrinho
externando sua opinião sobre a idolatria da mexicana:
– ¿No te parece repugnante?
– A ellas les parecen repugnantes nuestras iglesias vacías, sin decorado, puritanas –
dijo Archibald relamiéndose por dentro de la excitación que le causaba acostarse en
Pilsen con una muchacha mexicana que cubría con un pañuelo la imagen de la
Virgen para que no los viera coger. Pero dejaba prendidas las veladoras, el cuerpo
canela de la chica reverberaba precioso… Era inútil pedirle tolerancia a Miss Amy.
(FUENTES, [1995] 2007, p. 167)
O estereótipo aqui retorna contrapondo-se à figura inserida da Virgem como marca,
uma vez mais, da religiosidade, dessa feita, adjunta a certa fetichização do corpo feminino, do
corpo da mulher mexicana. Não fosse a mesma ambientação e caracterização descritiva
dedicada também ao corpo de outra personagem, a também mexicana Michelina, e tal ato
talvez passasse por isolado, apenas quem sabe como mais uma das vacilações de Archibald,
entre a compreensão, a tolerância e os seus próprios preconceitos, apenas como mais uma das
construções ou perpetuações imagéticas que lhe são atribuídas pela narrativa.
Um fato minimamente curioso chama atenção, porém, no idioma majoritário de “Las
amigas”, conto que traz uma estadunidense austera que, teoricamente, não se rebaixaria ao
trato em espanhol com uma mexicana que somente se sujeita a esse trabalho porque também
fala inglês; além de que também por certo não precisaria Miss Amy dialogar com seu
sobrinho também estadunidense, ainda que esse conhecesse sim a língua hispânica por suas
andanças no bairro mexicano de Chicago, em espanhol, como de fato se transcreve. É claro
que o uso do espanhol como língua em momentos em que deveria aparecer como inglês
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responde a uma lógica de mercado, já que por razões óbvias a obra é produzida muito mais
para um público hispano-falante do que para o público de língua inglesa nos Estados Unidos,
para quem o romance termina por contar com uma tradução ao inglês.
Está justamente na ação do traduzir, contudo, a questão a que me busco referir ao
abordar a língua utilizada em “Las amigas”. Embora decerto esse seja apenas um
questionamento de fundo mais hipotético, essa aparente preocupação menor levanta outra
questão que sugere pensarmos o narrador coiote fuentesiano agindo no conto em epígrafe
como também um tradutor, bom conhecedor, além de todas as habilidades e domínio de
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Língua que de fato aparecerá mais como marca de anglicismos, anglo-americanismos, ou como forma de dar
vez a chicanismos, ao spanglish chicano, principalmente na subparte dedicada a um personagem chicano de
nome José Francisco, no último conto do romance, o capítulo “Río Grande, río Bravo”.
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