Esquizofonia



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Então fala-me de novo como um cochicho: ”levando a tempestade às 
mais silenciosas palavras. São pensamentos nascidos sobre pés de pomba 
que guiam o mundo”/.../ 
E de novo houve uma risada e uma fuga, depois o silêncio em meu redor, 
como um duplo silêncio” ( de Grandes acontecimentos e A hora do maior 
silêncio, Zaratrustra 2). 
O tempo supremo é a simultaneidade e a sua auto-afirmação, o duplo 
silêncio evoca o eterno retorno e as séries do tempo. É dentro do 
processo da produção sonora que se exprimem ao seu mais alto grau a 
temporalização do mundo, a densificação das impressões de sensações e 
a simultaneidade estrita das linhas de realidades conexas, múltiplas e 
afirmativas. O cosmos é sonoro e a Terra a sua música! 
#Pode-se ler sob o mesmo título o belo comentário d’ André Bernold em 
“Sedas quebradas no Erèbe”, Hermann, 1999 
Na aurora de um pensamento radical, sobre a beira do abismo de um 
mundo fractal e novo, Nietzsche pressente e põe à prova que a 
imensidade do tempo, que é a sua própria eternidade, é: Silêncio. É 
preciso sublinhar que a queda do Tempo – e seu ímpeto constitutivo (seu 
eterno recomeço ou repetição do mesmo em oposição) – é ela também 
silêncio. Sem dúvida deve-se opor a imensidade do tempo e sua 
eternidade à queda do tempo. Todas as proposições se encontram dentro 
da elaboração do conceito do silêncio. Seria a queda do tempo uma outra 
maneira de falar de sua imensidade? A queda do tempo seria uma 
Resolução (aos antípodas da queda do Ser), a Resolução dentro do nosso 
simultaneísmo interior, esta simultaneidade do tempo que é uma pura 
positividade, a grande afirmação, o mundo das sincronicidades crônicas e 
sincronicidades afetivas e inconscientes. Será preciso um dia estudar de 
mais perto a relação da simultaneidade e da sincronicidade. Neste 
sentido, a imensidade do tempo e sua queda aparentam pertencer à 
mesma ordem, à mesma configuração e finalmente ao presente interno e 
imenso da obra. O simultaneísmo interior abrange a tripartição do 
presente, do passado e do futuro em proveito de uma produção infinita 
colocada tão bem em evidência pelo prólogo de Parsifal que dentro das 
conexões máquinas/ técnicas – sintetizadores daquilo que é chamado 
hoje em dia “Inteligent techno”: Aphex Twin, Autechre, Underworld, 
Scanner, Mouse on Mars, entre outros. 
É um dispositivo técnico onde a repetição modulada e a formação de 
verdadeiros blocos temporais se fundem em uma variação contínua da 
produção sonora. As variações e modulações dos motivos, a colocação em 
argolas das seqüências de silício, conjugam música e eterno retorno em 
uma vasta inovação literalmente inaudita. Os praticantes do múltiplo 
abrem à Diferença e às repetições ativas. Eles afirmam um mundo dos 
possíveis e uma existência atestada de universos incompossíveis, aéreos e 
etéreos. Eles suspendem literalmente as células musicais dentro da 
captura de forças sonoras até então desconhecidas e inaudíveis que 
compõem um ambiente cósmico puramente acústico (Deleuze, “do 
Ritornello”). 
Não há diferença de natureza entre o apocalipse sintético e ritmado, 
desigual, da produção eletrônica atual, as sínteses vibratórias e as 
oscilações analógicas ou digitais do silício (onde o choque alegre dos 
elétrons e seu ruído de fundo se evapora no ritmo ondulatório da 
sucessão desigual dos zeros e dos uns) e a obra de arte considerada como 
pura concreção de tempo, bloco temporal. A música inteligente é filha 
legítima da produção sonora a partir de uma matriz intensiva onde o 
silêncio, intensidade = 0, distribui os elétrons, as vibrações, as oscilações 
de partículas, o metal e o cristal, como Wagner faz explodir os 


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instrumentos de cobre, e de madeira, desenvolve as sínteses das 
modulações contínuas, como Ravel eleva a densidade do ar e provoca um 
alongamento do tempo e uma pura suspensão na sua Valsa. Para um 
mundo de afetos cristalinos, de afetos metálicos e de repetições 
seqüenciais, verdadeiras combinações digitais e analógicas, danças das 
sínteses binárias e do cálculo virtual ou mesmo a Técnica e suas máquinas 
do terceiro tipo inventa uma temível adiaforia numérica na inaudita 
Alegria da auto-diversão, aquela de uma sintética modulação infinita: o 
sintetizador a priori de novas formas e de novas matérias afirma as 
variações numéricas e as modulações analógicas. Isto será sem dúvida a 
revolução do universo Virtual dos processos maquínicos abraçados à 
produção sonora. A música eletrônica é o nosso ponto sintético vindouro. 
Ela prefigura o processo das sínteses futuras onde se metamorfoseia o 
suposto (eclodem a identidade subjetiva e a totalização do eu) das linhas 
de tempo virtuais e sincrônicas, em “um vidente, um querente, um 
crente, mesmo um futuro e um ponto em direção ao futuro”. A música 
imprime a transvaloração (o processo de transmutação-UMVERTUNG) do 
humano em um ponto em direção ao super-homem, o criador, o artista, o 
vidente (Nietzsche, Z, Da redenção). A música diz que o tempo supremo e 
seu duplo silêncio afirmam a mais alta tonalidade: o meio-dia é a hora do 
maior silêncio onde as forças da terra se tornam audíveis e os ritmos 
luminosos na intensa curvatura da produção sonora. 
Inverter os valores na prática de todos os dias é parar com esta expansão 
da desertificação, da indiferenciação. Fazer do silêncio uma potência 
ativa, uma intensidade temporal positiva e nômade. Fazer do silêncio o 
fundamento de uma nova enunciação musical de um pensamento 
vindouro: aquele do círculo. Que o silêncio, enfim, se torne audível: a 
saber, uma matriz singular distribuidora das múltiplas intensidades 
temporais e sonoras (forças audíveis e sonoras: “nós não podemos 
compreender para além de processos intelectuais: portanto, não 
compreender a matéria daquilo que se torna visível, audível, palpável) – 
“(Ciência Gaia, fragmento póstumo M3 11 (115), página 341, Gallimard). 
O silêncio é heterogêneo do som. Um silêncio onde todos os sons 
coexistem em um ser-junto-ao-mesmo-tempo, como se, pelo silêncio, o 
som se tornaria Tempo-universo ou tempo cósmico, produção temporal, 
bloco de duração. Um bloco de tempo no estado puro: a grande e bela 
igualdade tempo = silêncio, equação ideal mas também, sem dúvida, 
idealista. É dentro de um sentido análogo que a descrição do crescimento 
do deserto aparece no fim da quarta parte de Zaratrustra. É também um 
dos sentidos do nosso simultaneísmo interior. 
Somente talvez a música (arte do nada pois um som, por essência, não é 
materializável: pura vibração no ar) evoca o que pode ser realmente esta 
duração de uma natureza pouco comum, a produção sonora abissal, 
integral e sintética: dir-se-á uma mônada (elétro-acústica) que faz com 
que se compreenda o cosmos, sua formação e sua expansão. O canto do 
universo (Música das Esferas por J.S. Bach) através das frequências 
emitidas pelo choque contínuo das partículas, aquilo que os físicos 
chamam de “ruído”, “ruído de fundo” ou “irradiação” originária, “choque 
dos elétrons. Trata-se de realizar o supra-sensível, de tornar a obra sonora 
audível, a pintura visível: de levantar vôo em direção aos amanhãs não-
humanos. 
A música eletrônica do fim do século XX possui as suas modalidades 
temporais singulares, um relato idiossincrásico na repetição do mesmo 
indiferente, mas também na repetição diferenciante. A produção sonora 
integral e sintética é adiaforia: ela toca o intelecto e os sentimentos. O 
processo capaz de repetição criada ou pode criar a inovação eletrônica, 
um Nexus de ocasiões atuais transfiguradas e metamorfoseadas, o 
deslocamento do acento ou da intensidade que fará de uma célula 


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