Esquizofonia



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DE  NIETZSCHE  AO  TECHNO 
Manifesto pelas máquinas-pensamento vindouras, para G. Deleuze e J.P. 
Manganaro 
Richard Pinhas   
 
 
  
No seu Zaratrustra, Nietzsche coloca a relação de um “Tempo Supremo” 
com um “duplo silêncio”. Poderia existir uma equivalência ontológica 
entre o tempo supremo e este duplo silêncio como a que existe entre o 
Eterno Retorno e a Vontade de Poder. Se todo o amanhã é literalmente 
criação, e criação artística, nós nos propomos examinar os relatos de 
Nietzsche sobre a música dita “Tekno” atual e mais precisamente como 
Nietzsche faz uma espécie de apologia do “Techno inteligente”. Deixemo-
nos divagar entre um resto de filologia e a experimentação no cerne do 
nosso tempo. 


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O Tempo é a passagem da Natureza, ou melhor, é a distribuição das 
conexões, dos nexos, dos reencontros das ocasiões atuais. Os 
acontecimentos são puras durações que tendem para os “momentos-
fronteiras” (O conceito de Natureza. Whithead). O Homem integral caro a 
Nietzsche toma em conta a problemática do tempo e do silêncio, das 
sínteses e da técnica: toda a lógica do Que Há-de-Vir e da criação artística 
é “o absoluto fluxo do acontecimento” (póstumos 11-118, A Ciência 
Gaia”): Nós somos oscilações e seres ondulatórios. A Wagner que tornou 
a música doente, às mornas criações reativas pelos alienígenas-nazis, 
sucede uma produção sonora do terceiro tipo onde a relação homem-
máquina/órgão-silício vai produzir novas músicas técnicas como puros 
blocos de tempo ou cristais de tempo ( M.G. Dantec retoma a hipótese 
dos três estados da máquina a partir de Popper, em “Máquinas do 
Milênio” de 1999). Assim o Homem sintético, o termo é de Nietzsche, o 
homem da extrema modernidade (ao presente instantâneo ao qual se 
funde a imensidão do Passado e das sincronizações compossíveis e 
siderais do Futuro) na qual a diferença entre o homem e a máquina se 
esfuma, em proveito de puros blocos de produção e de duração, de 
monólitos organo-maquínicos, tecno-biológicos, o homem sintético 
aproxima desde já a simbiose que é a conexão do biológico e do silício. 
Sofre o silício como o artista mestre dos sons? Zaratrustra é a história de 
uma  deslumbrante descoberta para o homem integral e homem das 
sínteses, o Homem sintético, como hoje toda a música é a das sínteses 
modulares, analógicas ou digitais, sínteses do silêncio e do tempo com o 
mundo da eletrônica: o ruído de fundo do choque dos elétrons é 
literalmente a matéria primária de toda a produção sonora. Tentemos 
decodificar os relatos de Nietzsche a Wagner, do tempo e do silêncio para 
este grande voo biotécnoide que transforma a música do tempo em um 
acontecimento eterno. 
Richard Wagner morre em Veneza em 1883: o fim da escrita do 
Zaratrustra corresponde a um terrível sentimento de finitude. Pouco 
tempo depois, coincidência: às vésperas da sua impressão, Nietzsche 
retira do impressor o manuscrito do quarto livro. Tudo se passa como se, 
dentro do íntimo sentimento da tarefa que falta cumprir (o peso mais 
pesado), o seu relógio interno acelera: “Um reino de necessidade 
totalmente inumana revela-se cada dia de vantagens póstumas, 1880”). 
Os dias se sucedem... Por vezes luminosos e semelhantes à grande 
claridade dos céus do Sul, outras vezes invadidos pelas trevas, mais 
parecidos com qualquer coisa quase pior do que a noite. Os males do 
filósofo não são um sintoma. Eles dizem que, dentro do homem 
Nietzsche, os sentimentos da Terra, os seus últimos sobressaltos e 
abdicações estão próximos às potências monstruosas e 
desterritorializadas da Técnica. Mas nós somos também as crianças da 
máquina e a eterna Questão da Técnica não nos traz mais nenhum 
problema tanto mais que nós firmamos a sua legítima filiação: as crianças 
de Nietzsche e do “inteligent Techno”! 
Nietzsche, Holderlin, Nerval e Rimbaud, entre outros mais, sem dúvida, 
são os últimos representantes do Homem Integral e do Homem MILIAR: o 
Homem Sintético. Brevemente, surgirão os temas célebres da ponte e do 
Homem aí colocado. E ainda, a explosão parcelar das forças da tekno-
ciência que farão de nós as peças e pedaços do saber, os seres 
excepcionais da vida ascendente, os tschandalas: os proletários da 
cyberzona arrancados para sempre, talvez, ao poder do Desejo e da 
Volúpia, à relação única do Homem ao Cosmos. 
As lágrimas de Nietzsche são as nossas lágrimas futuras: o mundo se 
desmorona na liberação das forças telúricas e sobre-humanas e o cosmos 
cede o lugar à sua virtualização. Nós mesmos nos tornamos em uma 
ladainha... e todo o tema dos Mestres da Terra vem como para prevenir, 


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sinal terrível, do último combate a travar: o super-homem como 
derradeira esperança contra a parcela e o esquecimento, a mercadoria e 
o fetichismo dos ícones, o não-humano e o Amanhã artista como resposta 
à virtualização desencarnada. É um pensamento divertido já que ele 
supõe, num futuro sem dúvida próximo, uma aliança a construir entre o 
mais que humano e a máquina, entre a rede e as suas criaturas, contra a 
escravidão, a brutalidade e o rancor. Resta-nos apostar pelas redes 
desterritorializadas contra a servidão, pelas práticas múltiplas contra as 
morais puritanas aliadas no reinado da mercadoria e da Ciência com a 
finalidade de realizar um Amanhã artista e criador, lá onde se joga a 
terrível questão do Domínio da Terra. Libertar as forças alegres por  todo 
o lugar onde se projeta o instinto mortífero e triste dos governantes dos 
experts: o super-homem é a criação no momento e o amanhã artista 
como o amanhã do universo. Os homens superiores e os seus mais fiéis 
companheiros, os mais hediondos, empenharam-se em apostar na morte 
definitiva do planeta, e é isto que faz sofrer o corpo do Homem Nietzsche. 
 
Neste momento preciso da sua vida, o prólogo de Parsifal interpretado 
em Mônaco é uma singular mônada onde, enclausurado em um anel 
universal, o poder como vontade realiza-se em um Círculo de Ouro 
(Zaratrustra). As lágrimas do filósofo são coalescentes dos elementos e 
das forças cósmicas tornadas audíveis (Deleuze-Guattari, do Ritornello, 
Mil Platôs), pois esta música faz aparecer a conexão que é o puro brotar 
de um Amanhã absolutamente radical e singular, como na detonação dos 
meteoros (Joëlle de la Casinière, absolutamente necessário#): a simbiose 
do poder como Vontade, co-propriedade do anel universal, a gravitação 
do mundo. Estamos a assistir a uma nova distribuição na curvatura do 
universo, uma nova inflexão que prefigura a meditação do filósofo sobre o 
Silêncio e o seu duplo eterno, o Tempo. Suponhamos que nasce assim o 
esboço da resolução de um dos célebres enigmas de Zaratrustra: a dupla 
afirmação de um Tempo supremo e do seu correlato orgânico, o duplo 
silêncio: 
“Eis o tempo, o tempo supremo!/.../ 
E acredita-me, Amigo Ruído dos diabos! Os maiores acontecimentos – não 
são as horas mais ruidosas, mas as mais silenciosas. Não gravita o mundo 
em torno daqueles que inventam ruídos novos mas sim em torno 
daqueles que inventam valores novos; em silêncio ele gravita/.../ 
Mas seu ouro e sua risada – do centro da Terra ele os recebe: pois, sabe 
ele – de ouro é o centro da Terra/.../ 
Porquê o fantasma ele criou: Eis o tempo, eis o tempo supremo? O que é 
que é então o supremo tempo?/.../ 
E que eu seja um homem, como o sofrerei se o homem também não era 
poeta, e decifrador de enigmas e do acaso redentor?/.../ 
Na retaguarda querer, eis o que jamais não o pode querer, não poder 
quebrar o tempo e os desejos do tempo, tal é bem querer a mais solitária 
tribulação/.../ 
Fora destas fábulas e canções eu vos conduzi quando vos ensino: “o 
querer é criador!”/.../  
Ontem à noite aquela que me falou é a hora do meu maior silêncio; do 
meu irascível mestre tal é o nome/.../ 


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