Universidade Federal do Rio de Janeiro a relaçÃo literariedade, imagem e imaginários em



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vida, em especial de sua infância, sugere na relativização espaço/tempo (o do ocorrido, o do 
romance) uma “recuperação” de suas memórias, seus recuerdos. Tal renovação, tal realização 
memorialística aponta para a, supõe a habilidade de uso de uma memória fotográfica, a qual, 
potencializada  na  e  pela  ficção,  torna-se,  em  verdade,  uma  ficção  de  memória  fotográfica. 
Será  este  caráter  a  recair,  a  pairar  por  sobre  a  ficção  de  ...y  no  se  lo  tragó  a  meu  ver 
responsável de ação direta em outro engano por que se deixa levar até mesmo a crítica que se 
debruça  a  analisar  o  romance  riverano:  a  ficção  do  menino  narrador.  Há,  contudo,  mais 
porquês  a  decerto  implicar  em  segundo  plano  sobre  essa  questão  do  menino-protagonista-
(autor)-narrador. E todas elas se desdobram a partir da  memória  fotográfica enquanto termo 
que falha em suas intenções. 
A concepção de memória fotográfica carrega em si um duplo aspecto, por assim dizer, 
decepcionante. Em primeira instância, ela se revela uma ficção mesmo para ramos da ciência 
que  se  dedicaram  a  estudá-la,  sendo  que  a  neurociência  é,  em  especial,  um  dos  campos 
científicos  que  mais  pesquisaram  sobre  o  assunto.  Tomando  em  conta  que  uma  memória 
fotográfica  pressupõe  sua  “aferição”  pelo  contraste  com  a  de  outro  sujeito  partícipe  dos  ou 
nos eventos rememorados, resulta que dessa  “acareação” nada  mais poderá ser extraído que 
profundas considerações sobre prismas, perspectivas, pontos de vista. Por essa razão, quando 
revolve  o  assunto,  a  neurociência  baseia  seus  resultados  em  testes  objetivos,  os  quais, 
nenhum, até hoje, apontou de fato para o registro de uma verdadeira memória fotográfica, ao 
menos  não  como  se  a  quer
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.  Vem,  enfim,  da  ciência  seu  primeiro  teor  “decepcionante”:  a 
constatação objetiva  de  que  a  memória  fotográfica,  a  memória  como  produto  de registro  de 
uma lente fotográfica humana não existe.  
O  segundo  aspecto  “decepcionante”  ligado  à  questão  da  memória  fotográfica  está, 
pois, justamente, intimamente ligado aos objetivos da ciência que se dedica a estudá-la. Lidos 
os  artigos  voltados  a  tratar  do  tema,  observa-se  a  busca  na  verdade  por  uma  espécie  de 
memória  perfeita,  capaz  de  rememorar  tudo,  e  com  total  precisão.  Ora,  certo  está  que 
tampouco  a  origem  filosófica  do  termo  eidético  (coincidentemente  mais  vinculada  ao 
conhecimento intuitivo e por consequência à relação entre aparência e perspectiva) ou mesmo 
a moderna e popular acepção adjetiva “fotográfica” dariam conta de uma completa apreensão 
e  reprodução  da  disposição  de  objetos  captados  pela  observação  humana.  Está  então  no 
engodo  do  que  pode  vir  a  ser  uma  fotografia  o  segundo  aspecto  decepcionante  do  termo 
“memória fotográfica”.  
                                                             
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 Os artigos revisados sobre o assunto constam da bibliografia desta tese. 


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É a própria fotografia decepcionante se se a quer tomada como retrato fiel do referente 
do  qual  é  apanhada.  A  memória  fotográfica  é,  portanto,  nessa  linha,  uma  ficção  por  ser 
também  a  própria  fotografia  uma  ficção,  pelo  menos  no  desejo  a  ela  costumeiramente 
transferido  de  total  identidade  com,  de  que  seja  totalmente  idêntica  ao  objeto  desde  o  qual 
apanha,  capta  a  imagem.  Assim,  ao  aludir,  ao  remeter  ao  processo  fotográfico  é  a  memória 
fotográfica uma ficção pela própria imperfeição, pela própria incompletude da fotografia em 
sua  ficção,  em  seu  parecer,  seu  fingimento  de  cópia  total  e  perfeita,  quando,  na  verdade, 
apenas  revela  um  momento  sujeito  às  mais  variadas  apreensões  e,  a  partir  daí,  hipóteses, 
sugestões, interpretações. Das interpretações da ficção de memória a que nos submetemos na 
ficção  de  Tomás  Rivera,  uma  delas  é  a  de  que  o  caso  de  “El  retrato”  daria  conta  de  outro 
termo  cunhado  pela  neurociência:  o  de  síndrome  hipertimésica  (do  grego  timesis,  lembrar), 
evento  em  que  a  perfeição  fotográfica  de  certas  memórias  estaria  em  realidade  restrita  às 
experiências pessoais dos sujeitos que as detêm. Em todo caso, parece demandar tal apreensão 
mais cabível aos artifícios de que lança mão Rivera na construção de seu enredo um caso de 
memória  fotográfica  mais  particular;  o  que  não  impede,  por  conseguinte,  que  seja  lido  “El 
retrato” como um desnudamento de ficção de memória fotográfica. É nesse tipo de ficção de 
memória que se  insere o  menino e o  leitor (acrítico, comum,  leigo, vulgo ou não)  atrapado 
por seu narrado. É tal efeito de memória que instaura, por fim, a ficção do menino narrador.  
Há  também  um  terceiro  aspecto  decepcionante  relacionado  à  questão  da  memória 
fotográfica  e  sua  ficção,  sua  simulação,  sua  noção  aproximativa  em  ...y  no  se  lo  tragó  la 
tierra. A evidência dessa característica, dessa possibilidade de leitura está, como vimos, tanto 
em  um  dos  últimos  capítulos  da  obra,  o  conto  “El  retrato”,  quanto  na  última  anécdota,  a 
estampa “Bartolo pasaba por el pueblo”. A estampa de Bartolo, ao servir, como já expliquei, 
de  epígrafe  que  abriria  (pelos  métodos  descontínuos  da  lógica  elíptica  impressa  ao  e  pelo 
enredo) a obra inteira, e o capítulo “El retrato” (conto disposto descontinuamente a um conto 
e  outra  estampa  antes  de  “Bartolo...”)  acabam  dessa  forma,  (des)localizados,  por 
“contaminar”,  por  espalhar  sua  aura,  seus  ares  de  memória  fotográfica  (com  devidos 
“respaldo” e “justificativa” no registro ensaístico e epistolar de seu autor) através de todo o 
romance.  
Esse conjunto de ficções de memória se desenha do interior da narrativa (onde em “El 
retrato”, por exemplo, os pais do personagem Chuy, figura retratada, borrada e redesenhada, 
porquanto  recriada  e  (re)inventada,  deixam-se  levar  pela  força  fingida,  tingida  de  memória 
que têm do filho) a seu exterior: desde os ecos que a ficção encontra nos relatos explicativos 
de Tomás Rivera em artigos e cartas a toda uma crítica que termina por se deixar enlevar pela 


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