69 Guia de Economia
Comportamental e Experimental
Utilidade
Valor de
x na
escala da perda
Perdas
(x < 0)
Ganhos
(x > 0)
Valor de
x na
escala do ganho
1.
Avalia resultados como mudanças relativas
a um “ponto de referência”
2.
Perdas e ganhos são avaliados separadamente
3.
Aversão à Perda
+X
-X
Figura 3
Um dos pontos centrais dessa abordagem é a consideração dos agentes como avaliadores dos re-
sultados dos riscos, não em termos dos efeitos em seu portfólio ou riqueza finais, mas, ao contrário,
formulados como ganhos e perdas em relação a um ponto de referência (normalmente o ponto em
que se encontram no momento). É a ideia de dependência da referência.
Fundamentalmente, na Teoria dos Prospectos, as perdas e os ganhos são avaliados de maneiras
um pouco diferentes. Por exemplo, imagine assumir um risco que produza um ganho X. Na Teoria dos
Prospectos, o valor disso (em termos utilitários) seria determinado pela função “ganho” (quadrante
superior direito na figura). Mas, se eu considerasse um risco que poderia acarretar em uma perda X,
então interpretaria o valor (em termos de utilidades) dessa mudança a partir de uma escala diferente,
que captura atitudes em relação às perdas (quadrante inferior esquerdo). Perceba que a função que
avalia as perdas é mais inclinada do que a função ganho. Como consequência, confiro um valor maior
a X quando se trata de uma perda do que quando mudança de mesma magnitude ocorre em X no
domínio do ganho. Resumindo essa última ideia em uma rápida frase de efeito: “As perdas pesam
mais que os ganhos” nessa função de utilidade.
Na Teoria dos Prospectos original, essa ideia de aversão à perda era aplicada somente aos
riscos.Tomei emprestado o diagrama desse artigo pioneiro, mas os teóricos vêm, desde então, ex-
plorando o que acontece quando efeitos similares (perdas que pesam mais que ganhos) ocorrem,
digamos, na teoria do consumidor. Nesse caso, não pensamos sobre riscos, mas sobre mudanças
na cesta de produtos. Ao se movimentar pelo espaço das mercadorias, pode-se obter ganhos em
algumas dimensões e perdas em outras. Então, a mesma ideia pode ser – e tem sido – aplicada fora
do domínio absoluto dos riscos.
70 Guia de Economia Comportamental e Experimental
Ao permitir a possibilidade de aversão à perda, e particularmente, ao permitir que a ideia se
estenda por diferentes domínios, como a compreensão dos riscos ou do comportamento do consu-
midor, temos aí algumas implicações óbvias. Por exemplo, é bem fácil ver como ela pode explicar o
tipo clássico de efeito posse que discuti anteriormente (a escolha entre a caneca e o chocolate). Ao
oferecer a caneca, e então dar a possibilidade de trocá-la pelo chocolate, aquela se torna uma perda
e, o chocolate, um ganho. Em uma teoria de aversão à perda, a preferência irá se inclinar para aquilo
que já se possui (nesse caso, a caneca).
Isso também tem algumas implicações mais surpreendentes. Uma se relaciona com o fenômeno
da reversão de preferência que mencionei anteriormente, a tendência de as pessoas considerarem
riscos simples ao produzirem avaliações sistematicamente distintas, quando fazem escolhas, em con-
traste com o que fazem quando constroem avaliações. Uma implicação menos óbvia da aversão à
perda é a de que ela pode oferecer um registro da reversão de preferência por meio da Terceira Ge-
ração da Teoria dos Prospectos, mencionada anteriormente.
A aversão à perda também pode oferecer um registro importante de certos fenômenos de cam-
po. Um exemplo vem de um artigo publicado no Quarterly Journal of Economics em meados dos
anos 1990, de autoria de Benartzi e Thaler [15]. Eles argumentaram que a aversão à perda pode ser
um componente importante na explicação do famoso enigma do prêmio das ações. Como se sabe,
esse é um problema que há muito tempo interessa os economistas. A questão básica é por que as
pessoas investem tanto em ativos relativamente seguros em comparação com ativos de risco, se
esses oferecem um retorno bem maior no longo prazo? Por muito tempo, os economistas têm se
esforçado para produzir respostas empiricamente convincentes a esse problema porque, embora se
possa explicar certo nível de prêmio com um determinado grau de aversão ao risco a partir de um
modelo padrão, tem sido difícil dar conta da escala real de prêmios observada nos dados de campo.
Benartzi e Thaler sugerem que a aversão à perda pode ser parte da explicação quando acompa-
nhada da miopia. Suponha que as pessoas sejam de fato mais sensíveis às perdas do que aos ganhos
e, dessa forma, terão aversão ao aspecto negativo do mercado de ações. Elas serão particularmente
sensíveis a isso. É claro, se elas considerarem os efeitos em sua riqueza em um ponto mais distante do
futuro, e assumirem que se pode esperar que os ativos de maior risco superem em desempenho os
ativos mais seguros, então, efetivamente devem esperar uma distribuição de ganho mais favorável .
Mas imagine que as pessoas sejam, em algum grau, míopes (ou imediatistas). Quer dizer, elas não têm
uma visão de longo prazo, mas avaliam seus portfólios periodicamente. Em qualquer dado período
de tempo, pode haver ganhos e também perdas e, em vista da aversão à perda, as últimas terão um
peso particularmente maior. Então, em sua análise, os autores colocam a seguinte questão: suponha
que as pessoas sejam relativamente mais sensíveis às perdas, padrão que é sugerido pelos dados
pré-existentes sobre aversão à perda. Então quão míopes elas teriam de ser para se enquadrar os
dados existentes utilizando uma explicação que contenha tanto aversão à perda quanto miopia? Isto
é, quão imediatistas as pessoas teriam de ser para que a aversão à perda, na escala apresentada em
outros estudos, se ajustasse aos dados? A resposta oferecida por Benartzi e Thaler é que as pessoas
teriam de avaliar seus portfólios aproximadamente uma vez por ano.
Embora essa pareça uma explicação plausível, não sugiro que seja a correta. Tudo o que quero
dizer é que você possa talvez usar os conceitos ou ideias na bibliografia da Economia Comportamen-
tal para fornecer explicações possíveis sobre fenômenos interessantes no campo; fenômenos que são
de interesse para uma ampla gama de economistas que ainda não têm um interesse específico em