363 Guia de Economia
Comportamental e Experimental
GLOSSÁRIO
Alain Samson
A
Adaptação hedônica
As pessoas se habituam às mudanças da vida, um processo
conhecido como “adaptação hedônica” ou “esteira hedôni-
ca”. Assim como a felicidade que alguém sente quando ga-
nha um novo aparelho eletrônico ou um aumento de salário
acaba se dissipando com o passar do tempo, até mesmo o
efeito negativo de acontecimentos da vida como a perda
de um ente querido ou uma queda no bem-estar subjetivo
tende, em certa medida, a decrescer aos níveis anteriores
(Frederick e Loewenstein, 1999). Quando isso acontece, a
pessoa retorna a seu estado básico de felicidade, que é re-
lativamente estável. Um estudo sugeriu que a repetição de
experiências positivas menores (“empurrões hedônicos”),
como atividade física ou prática religiosa, tem um efeito mais
duradouro sobre o nosso bem-estar do que grandes aconte-
cimentos na vida (Mochon, Norton e Ariely, 2008).
Alocação ingênua
Pesquisadores da decisão constataram que as pessoas pre-
ferem distribuir recursos limitados igualmente por um con-
junto de possibilidades. Podemos dizer que se trata de uma
“alocação ingênua”. Consumidores podem investir quantias
iguais em diferentes opções, independentemente da quali-
dade delas. Analogamente, o viés da diversificação mostra
que os consumidores gostam de distribuir suas escolhas de
consumo por várias mercadorias. Estudos sugerem que os
arquitetos da escolha podem trabalhar com essas tendên-
cias graças à dependência dos tomadores de decisão em
relação à partição. Por exemplo, separando no cardápio
as opções de comidas saudáveis em diferentes categorias
(“frutas”, hortaliças” etc.) e combinando opções não saudá-
veis em uma única categoria (“doces e biscoitos”), é possível
induzir os consumidores a escolher opções mais saudáveis e
menos opções não saudáveis (Johnson et al, 2012).
Arquitetura da escolha
Esse termo foi cunhado por Thaler e Sunstein (2008) e se
refere à prática de influenciar a escolha mudando a maneira
como as opções são apresentadas às pessoas. Por exemplo,
podemos fazer isso com defaults ou adicionando opções
chamariz.
Aversão à desigualdade
A resistência humana a resultados “injustos” é conhecida
como “aversão à desigualdade”, e ocorre quando as pessoas
preferem a justiça e resistem a parcialidades. Em alguns ca-
sos, a aversão à desigualdade é desvantajosa, pois as pes-
soas estão dispostas a abrir mão de um ganho para impedir
que outra pessoa receba uma recompensa superior. A aver-
são à desigualdade tem sido estudada por meio de jogos
experimentais, por exemplo, os jogos do ditador, ultimato
e confiança (Fehr e Schmidt, 1999). O conceito é aplicado
em negócios e em marketing, incluindo pesquisas sobre res-
postas dos consumidores a promoções de preços exclusivas
(Barone e Tirthankar, 2010).
Aversão à perda
Aversão à perda é um conceito importante da EC associado
à teoria da perspectiva e sintetizado pela expressão “per-
das se destacam mais do que ganhos” (Kahneman e Tversky,
1979). Supõe-se que a dor de perder é psicologicamente cer-
ca de duas vezes mais poderosa do que o prazer de ganhar,
e como as pessoas são mais dispostas a correr risco para
evitar perder, a aversão à perda pode explicar diferenças en-
tre a busca do risco e a aversão. A aversão à perda é usada
para explicar o efeito dotação e a falácia do custo irrecupe-
rável, e também pode ter um papel no viés do status quo. O
princípio básico da aversão à perda é aplicado, às vezes, em
estratégias de mudança de comportamento, e pode explicar
por que, em certos casos, frames de penalidades são mais
eficazes do que frames para motivar pessoas (Gächter, Or-
zen, Renner e Starmer, 2009). O site Stickk permite que as
pessoas assumam publicamente um compromisso com uma
mudança de comportamento positiva (como parar de comer
junk food), que pode ser combinado com o medo de perder
— uma penalidade em dinheiro em caso de violação do com-
promisso. Ver também aversão ao arrependimento.
Aversão ao arrependimento
Quando uma pessoa teme descobrir futuramente que sua
decisão foi errada, demonstra aversão ao arrependimento.
Esse viés é associado com a aversão à perda. Pessoas aves-
sas ao arrependimento podem temer as consequências de
erros de omissão, como não comprar o melhor (ótimo) imó-
vel para investimento, e de comissão, como comprar o imó-
vel para investimento errado (subótimo) (Seiler et al., 2008).
Ver também aversão à perda e falácia do custo irrecuperável.
C
Comportamento de manada
Esse efeito evidencia-se quando pessoas fazem o que ou-
tros estão fazendo em vez de usar suas próprias informações
ou tomar decisões independentemente. A ideia de ir com a
manada tem uma longa história na filosofia e na psicologia
das multidões. É particularmente importante para o ramo
das finanças, em estudos sobre a irracionalidade coletiva
dos investidores, incluindo as bolhas no mercado de ações
(Banerjee, 1992). Em outras áreas da tomada de decisão, por
exemplo, na ciência política, e na cultura popular, o compor-
tamento de manada às vezes é mencionado como “cascatas
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de informação” (Bikhchandi, Hirschleifer e Welch, 1992).
Compromisso
Compromissos (ver também Compromisso prévio
) são usa-
dos frequentemente como uma ferramenta para neutralizar
a falta de determinação das pessoas e para se obter mudan-
ça de comportamento, por exemplo, quando se trata de fa-
zer dieta ou poupança — o compromisso será tão mais eficaz
quanto mais alto for o custo de violá-lo (Dolan et al., 2010).
Da perspectiva da psicologia social, os indivíduos são moti-
vados a manter uma autoimagem coerente e positiva (Cial-
dini, 2008), e é provável que cumpram seus compromissos
para evitar danos à sua reputação (se for um compromisso
assumido publicamente) e/ou dissonância cognitiva, se o
compromisso for privado (Festinger, 1957). A técnica de “es-
tabelecer metas” para mudar um comportamento é associa-
da a assumir compromissos (Strecher et al., 1995), enquanto
a reciprocidade envolve um compromisso implícito.
Compromisso prévio
O ser humano necessita de uma autoimagem contínua e
coerente (Cialdini, 2008). No esforço de alinhar o comporta-
mento futuro, o melhor modo de ser consistente é por meio
de um compromisso, sobretudo se ele for feito perante ou-
tras pessoas. Assim, comprometer-se previamente com um
objetivo é um dos recursos comportamentais mais aplica-
dos para se obter uma mudança positiva. O programa “Pou-
pe Mais Amanhã”, destinado a ajudar empregados a pou-
par mais dinheiro, ilustra esse conceito (Thaler e Benartzi,
2004). O programa dá aos empregados a opção de compro-
meter-se previamente com um aumento gradual dos valores
poupados no futuro toda vez que receberem um aumento
salarial. Evita-se nesse programa a percepção de perda que
ocorreria diante de uma redução da renda disponível, pois
os consumidores se comprometem em poupar aumentos
de renda futuros. A inércia das pessoas torna mais provável
que elas se mantenham no programa, pois para saírem dele
é preciso que façam essa opção formalmente. Ver também
compromisso.
Contabilidade mental
Em vez de raciocinarem com base na contabilidade formal,
as pessoas lidam com dinheiro de maneiras diferentes, de-
pendendo de fatores como a origem e o uso pretendido. Um
termo importante na contabilidade mental é fungibilidade,
o fato fundamental de que todo dinheiro é igual e não tem
rótulos. Segundo essa teoria, as pessoas tratam os ativos
como menos fungíveis do que realmente são; imaginam que
pertencem à riqueza corrente, à renda corrente ou à renda
futura. A propensão marginal a consumir (a proporção de
um aumento na renda disponível que é consumida) é maior
para o dinheiro na conta de receita corrente e menor para o
dinheiro na conta de receita futura (Thaler, 1990). Conside-
remos os ganhos inesperados: as pequenas quantias ganhas
inesperadamente (por exemplo, $50 na loteria) geralmen-
te são tratadas como “receita corrente” e provavelmente
são gastas, ao passo que um ganho inesperado de grandes
quantias (por exemplo, um bônus de $5000 no trabalho)
é considerado “riqueza” (Thaler, 2008). Outro exemplo de
contabilidade mental são os pagamentos de cartão de crédi-
to, tratados de modo diferente em relação ao dinheiro vivo.
A teoria da contabilidade mental sugere que os cartões de
crédito dissociam a compra do pagamento, pois separam
e postergam o ato de pagar. Gastar com cartão de crédito
também é atrativo porque, nas faturas do cartão, os itens
individuais (por exemplo, um gasto de $50) perdem a sa-
liência quando são vistos como uma pequena parte de uma
quantia maior devida (por exemplo, $843) (Thaler, 1999). Ver
também partição e dor de pagar para ideias relacionadas à
contabilidade mental.
D
Decisão em estágios
Ao tomarem decisões complexas ou longas, como comprar
um carro, as pessoas tendem a examinar suas opções por
etapas. Isso envolve decidir em quais informações devem se
concentrar, além de escolher entre atributos e alternativas.
Por exemplo, ao restringirem suas opções, as pessoas ten-
dem a filtrar as alternativas com base em um subconjunto
de atributos e então compará-las. Os arquitetos da escolha
não só podem dividir decisões complexas em vários estágios
para facilitar o processo, mas também promover o entendi-
mento da tomada de decisão sequencial facilitando certas
comparações em diferentes estágios do processo de escolha
(Johnson et al., 2012).
Default (opção)
Opções default são linhas de ação predeterminadas que vi-
goram se o tomador de decisão não especificar nenhuma
mudança (Thaler e Sunstein, 2008). Estabelecer defaults
é uma ferramente eficaz na arquitetura de escolha quando
existe inércia ou incerteza na tomada de decisão (Samson,
2014). Requerer que as pessoas declarem que optam por não
doar seus órgãos tem sido associado a taxas de doação mais
elevadas (Johnson e Goldstein, 2003).
Dependência de Partição
Ver Alocação ingênua
Depleção do ego
Depleção do ego é um conceito que emana da teoria da au-
torregulação (ou autocontrole) em psicologia. Segundo essa
teoria, a força de vontade funciona como um músculo que
pode ser exercitado ou acionado. Estudos concluíram que
tarefas que exigem autocontrole podem enfraquecer esse
músculo e acarretar a depleção do ego, seguida por dimi-
nuição da capacidade de exercer o autocontrole. A deple-
ção do ego foi induzida em laboratório de vários modos, por
exemplo, ter de suprimir emoções ou pensamentos ou tomar
uma série de decisões difíceis. A depleção do ego resultante