Mestrado em Sociologia Relações de poder no campo família empresária
Jorge
Rodrigues
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do através de uma valorização que equilibre lealdade e competência.
A imagem que os empregados têm da empresa familiar e da empresa não familiar difere
num número importante de aspetos (Astrachan
et al. 2014). Em termos favoráveis, a
empresa familiar é vista como detendo uma forte orientação por valores, sendo leal para
com os seus empregados e preocupa-se com a tradição. Em termos desfavoráveis, a
empresa familiar é associada a conflitos familiares, nepotismo, baixas remunerações e
limitadas oportunidades de progressão na carreira, em particular, para os empregados
não familiares. Contudo, estas perceções podem ser parciais (Block
et al. 2016, 67).
4.2.3 Proprietários que não pertencem à família e trabalham na empresa familiar
Este grupo de público externo combina as descrições anteriormente efetuadas no ponto
4.2.1 Proprietários que não pertencem à família e também no ponto 4.1.3 Membros da
família que trabalham na empresa familiar (Bernhoeft
et Gallo 2003, 23).
4.3 Interações dos públicos internos da família empresária
Os espaços privados e públicos são microcosmos sociais que demarcam modos de agir e
de ser dos indivíduos. Todo o indivíduo tem três tipos de atuações: públicas, privadas e
íntimas. A distinção entre umas e outras nem sempre é fácil.
O conceito de privado parece só ter adquirido consistência no século XIX, sendo aí
definido como uma zona de imunidade oferecida ao recolhimento, onde todos podem
abandonar as armas e as defesas das quais convém munirem-se ao arriscar-se no espaço
público, coincidindo com o lugar da familiaridade – o doméstico, o íntimo (Matos 1996,
130). Contudo, cada definição aparentemente clara e precisa encontra sempre um
exemplo que a contradiz ou a torna mais complexa e problemática. Quando parece
configurar-se uma conclusão, uma definição, aparece uma nova situação histórica ou
literária que a relativiza ou a contradiz (Valdés, 2003). As únicas atuações que também
pertencem aos outros são as atuações públicas, porquanto, são efetuadas no espaço
público e para o público; logo, são tanto do indivíduo como do público, por este último
ser o objeto da relação. Já as atuações privadas e íntimas pertencem ao indivíduo. Num
estado de direito, quem queira nelas participar sem a autorização do indivíduo, comete
uma transgressão
aos direitos individuais deste, sendo considerado um delinquente.
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Por norma diferencia-se entre espaço público e espaço privado. Já não é tão frequente
diferenciar entre espaço privado e espaço íntimo. Em qualquer caso, o que realmente
existe são espaços que o indivíduo usa como cenários na representação que constituem
as suas atuações. Estas atuações são públicas, privadas ou íntimas não em si mesmo,
mas segundo o espaço em que se desenvolvem. Estes três tipos de atuações – públicas,
privadas e íntimas – caraterizam-se por (Valdés 2003; Matos 1996):
a)
As atuações públicas são necessariamente observáveis (visíveis, audíveis ou outra
forma de perceção);
b)
As atuações privadas poderão ser observáveis por permissão, por falta de cuidado
dos atores ou por
voyeurismo do
observador;
c)
As atuações íntimas não são observáveis; o que lá se passa só pode ser inferido
através do
que o sujeito diz ou faz, inclusive com a sua inibição ou o seu silêncio.
Seguindo este raciocínio, considera-se que a família empresária se insere nos espaços
privado e íntimo. Deste modo, as suas atuações são públicas no seio da família
empresária; são privadas, em relação aos restantes atores da sociedade, fora da família
empresária; e serão íntimas quando essas relações se restringem apenas aos elementos
com origem no clã familiar. Referimo-nos às reuniões que têm lugar a seguir aos
almoços ou jantares em família, para tratar de assuntos específicos da empresa familiar,
as quais têm lugar numa sala diferente da sala de refeições e onde só tomam lugar os
elementos da família empresária com descendência por via uterina, com exclusão
explícita dos membros vindos de fora do clã familiar.
Por isso, os membros da família
empresária deverão saber separar os seus papéis de:
a)
Membro da família – pais, irmãos, cunhados, noras,
primos e outros;
b)
Acionistas – detentores de parte do capital social da empresa familiar;
c)
Executivo da empresa familiar – colaborador profissional da empresa familiar.
A não separação clara daqueles papéis poderá conduzir a problemas ou conflitos no seio
da família (Floriani 2012, 117-119), os quais poderão ser tipificados em:
a)
Influência na formação da vocação para empresários,
por parte dos filhos;
b)
Incentivo natural à competição entre os membros da família;
c)
Formação social dos filhos nos valores da família;
d)
Consciencialização e conhecimento tácito do negócio da família;
e)
Estilo de vida “não conforme” com a idade dos filhos;