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Ocorre em La frontera de cristal algo semelhante com a descrição da personagem Michelina
Laborde e Ycasa, logo no primeiro conto do romance.
A primeira descrição proposta para a personagem surge após a afirmação de uma guia
de que nada há para o visitante na desértica cidade nortenha de Campazas, observação esta a
qual
[A]rrancó una pequeña sonrisa a Michelina Laborde, quebrando fugazmente la
simetría perfecta de su belleza facial – su “mascarita mexicana”, le dijo un
admirador francés –, esos huesos perfectos de las beldades de México a las que el
tiempo parece no afectar. Rostros perfectos para la muerte, añadió el galán, y eso ya
no le gustó a Michelina (FUENTES, [1995] 2007, p. 9 – grifo do autor).
A destacar nessa primeira aparição descritiva de Michelina a aceitação franca do narrador de
que usa suas próprias palavras até o poético trecho “a simetria perfeita de sua beleza” para,
logo em seguida, sem qualquer vacilação, a partir da introdução do “disse-lhe um admirador
francês”, dar, ou fingir dar vez, à suposta reprodução da voz do galanteador estrangeiro, como
quem dissesse estar apenas repetindo a “voz”, as palavras dum outro.
No entanto, um pouco mais adiante e o narrador deixa uma das marcas a perpassar
todo o seu modo de narrar este romance em contos. A repetição de termos nas partes
descritivas aparece, pois, como uma marca estilística por meio da qual há a proposição de
melhor fixação das personagens na imaginação (e ainda não no imaginário, e mais bem me
explicarei nos tópicos seguintes) do leitor. Assim, tem-se que, como o seu próprio nome
sugere, e como através da repetição faz questão também de enfatizar o narrador, Michelina...
“Era una mujer joven de gustos sofisticados porque así la educaron, así la heredaron, así la
refinaron. Pertenecía a una ‘vieja familia’, pero cien años antes, su educación no habría sido
demasiado diferente” (FUENTES, [1995] 2007, p. 9 – grifo do autor). Pouco mais à frente e o
mesmo narrador reforça para o leitor a imagem de Michelina, acrescentando à descrição
anterior o feito de que ela “era una mujer que llenaba el espacio, dondequiera que estuviera.
Coincidía con sus lugares, los hacía más bellos. Un coro de chiflidos machos la recibía en los
lugares públicos” (FUENTES, [1995] 2007, p. 11).
Porém, as nuances poéticas desse descrever Michelina se tornam ainda mais agudas se
observamos este longo, entretanto, necessário fragmento o qual aguça ainda mais a visão
sobre a personagem:
Michelina Laborde e Ycasa: la capitalina. Ustedes la conocen de tanto aparecer en
las páginas a colores de los periódicos. Un rostro clásico de criolla, piel blanca pero
con sombra mediterránea, oliva y azúcar refinada, simetrías perfectas de los ojos
largos, negros, protegidos por párpados de nube y una ligerísima borrasca de las
ojeras; simetría de la nariz recta, inmóvil, y vibrante sólo en las aletas inquietas e
inquietantes, como si un vampiro tratase de escapar de la noche encerrada dentro de
ese cuerpo luminoso. (Ibid., p. 13-4)
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E o narrador prossegue no desenho da imagem poeticamente metaforizada de
Michelina:
También los pómulos, en apariencia frágiles como una cáscara de codorniz detrás de
la piel, hacia la calavera perfecta. Y por último, la luenga cabellera negra de
Michelina, flotante, lustrosa, olorosa a jabón más que a laca, era, fatalmente, el
anuncio estremecedor de sus demás pilosidades ocultas. Todo lo dividía, cada vez, la
barba partida, la honda comilla del mentón, la separación de la piel… (FUENTES,
[1995] 2007, p. 13-4).
Aqui é enfim que Michelina Laborde se nos é revelada como a capitalina, epíteto
emprestado também ao título do capítulo que a estampa, “La capitalina”, o conto primeiro do
romance. É essa personagem membro de uma tradicional família da Cidade do México,
capital do país. Dessa forma, como a Capitolina de Machado tem seu nome remetido ao
esmero capitular de seu autor, a Capitalina de Fuentes (e a atenção descritiva dedicada aos
olhos, ao olhar da personagem demonstra ser outra interessante associação entre ambas) faz
clara e óbvia remissão ao local de onde vem, uma capital. Contudo, obliquamente faz
remissão também ao capital enquanto sinônimo de obtenção de poder, enquanto sinônimo de
posses e dinheiro. Sucede que sua família já não tem o mesmo prestígio e tampouco o mesmo
poder do passado. É desse modo que, em uma hábil relativização narrativa entre a capital e as
cidades mexicanas do norte incrustadas em meio a uma vasta região de deserto, Michelina
termina por ser prometida em casamento ao filho do rico, vivido, ex-deputado federal e, no
presente do enredo, um rico e influente empresário, don Leonardo Barroso, o don Leonardo
do fim da citação, o mais bem sucedido, mesmo que por vias de ética duvidosas, membro da
família através da qual gira boa parte do enredo da trama fronteiriça orquestrada por Fuentes.
O mais interessante, porém, é que, logo após a citação sobre a qual versa o parágrafo
anterior, logo em seguida a toda essa extensa e até certo ponto requintada descrição, onde o
apuro no uso dos adjetivos se confunde com a mesma habilidade já demonstrada
anteriormente, o mesmo narrador que se mostrou hábil com os artifícios de contar surpreende
(num caso próprio de literariedade) ao interpor, imediatamente abaixo das reticências com que
encerra o trecho acima citado, a informação de que “Todo esto lo pensó don Leonardo cuando
la vio ya crecidita y se dijo en seguida: – La quiero para mi hijo” (Ibid., p. 14). Ou seja, uma
vez mais o narrador se utiliza do artifício de dizer-se mero reprodutor do discurso alheio,
embora os pensamentos, as palavras que ele diz pertencerem e apenas repetir de outrem, de
outras vozes narrativas por ele convocadas (ou que ele finge convocar); embora tais palavras,
tal cuidado, apuro e desenvoltura no uso das escolhas lexicais que se faz desfilar se
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