A geopolítica brasileira no alvorecer do século XXI


SEÇÃO III – CONSIDERAÇÕES PARCIAIS



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SEÇÃO III – CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

Os países sul-americanos, atuando como um bloco geopolítico unido e coeso, devem buscar afirmar-se política e economicamente, saindo da situação periférica de um contexto internacional instável e difuso.

Para tal, a única saída, não resta dúvida, é a consecução da regionalização por meio da integração dos países da América do Sul, concatenando esse processo de forma a valorizar as potencialidades de cada país, suplantando as divergências intra-regionais e, sobretudo, preservando os seus “espaços de soberania”. No entanto, para que esse intento se efetive é necessária a realização de esforços por parte de todos os países sul-americanos, a fim de reduzirem suas vulnerabilidades e seus possíveis contenciosos.

Diante do exposto e por razões óbvias de caráter geopolítico (posição e importância do Brasil no espaço geográfico regional), a área natural de ação político-diplomática do País é a América do Sul. Portanto, a adoção de uma postura destacada no teatro sul-americano vai ao encontro da opinião de Therezinha de Castro de que “o Brasil deve ser o múltiplo vetor continental”.

Nesse sentido, pensa o autor que as iniciativas do atual governo devem prosseguir e serem intensificadas, com o Mercosul constituindo-se no núcleo duro e pólo difusor do processo integracionista; e, em um segundo movimento, devem fomentar a formação de um bloco regional maiúsculo, o Bloco Sul-Americano, concepção alinhada com a Teoria do Quaterno. Tal Bloco, formado pela “Tríade Geopolítica Sul-Americana (TRISA)” – Mercosul, CAN e OTCA –, conformaria uma “Frente de Resistência Geopolítica (FRG)” contra possíveis intromissões externas, a fim de garantir a soberania dos países da América do Sul.

Como corolário das reflexões expostas neste capítulo, pode-se elencar as seguintes linhas de ação, orientadoras de um projeto geopolítico para o Brasil:




  • Assumir, sem vacilações, a função de aglutinador e condutor das vontades políticas, no contexto sul-americano;




  • Contribuir para o aprofundamento e ampliação do Mercosul, visando estreitar os laços com a CAN, OTCA e Chile, tornando-o, assim, institucionalmente mais forte e capaz de fazer valer os interesses dos seus países membros e associados;




  • Contribuir para o fortalecimento da capacidade negociadora do Mercosul com os EUA, principalmente na ALCA, e com a União Européia;




  • Promover, a seguir, a formação de um bloco geopolítico sul-americano nucleado na “TRISA”;




  • Coordenar a “FRG”, com firmeza e pragmatismo, após a conformação do referido bloco;







  • Continuar participando, de forma positiva, do GRIO;




  • Contribuir para a formulação de uma consistente agenda regional;




  • Sempre que conveniente aos interesses do País, negociar acordos bilaterais;




  • Contribuir para a manutenção da estabilidade político-institucional dos países sul-americanos, respeitando, dentro do possível, o princípio da não-ingerência;




  • Mediar conflitos, caso aconteçam contenciosos entre quaisquer dos países sul-americanos;




  • Fomentar a efetiva implementação da IIRSA, contribuindo, assim, para a vinculação da infra-estrutura e, conseqüentemente, para a integração física da América do Sul; e




  • Promover a formulação de mecanismos que se contraponham à intervenção de potências extra-regionais, como a presença militar norte-americana, fruto do Plano Colômbia.

Ao executar as ações traçadas nessas linhas de ação, o País estaria contribuindo para conferir à América do Sul maior proeminência geopolítica.

Enfim, é pensamento do autor que, para o Brasil, a integração sul-americana, inserida no contexto da América Latina, é um dever constitucional (19) e, sobretudo, um mandamento geopolítico.

CAPÍTULO IV – INSERÇÃO HEMISFÉRICA

Na opinião do autor, o hemisfério ocidental, sob o ponto de vista geopolítico, resume-se ao continente americano, no qual o Brasil espontaneamente já se insere.

Portanto, a inclusão hemisférica do País, uma de suas prioridades geopolíticas, é um processo contínuo, e uma projeção natural que se impõe, vis-à-vis, ao processo de integração sul-americana. Logo, o teatro compulsório deste embate é a ALCA, até porque o Brasil reafirmou o animus de continuar participando do seu processo de negociação, conforme compromisso assumido pelo presidente brasileiro, em junho de 2003.

Assim, para que se possa avaliar os riscos dessa inserção diante da influência hegemônica dos EUA, é de fundamental importância se reconhecer, de forma resumida, os valores que têm norteado a formulação da política externa norte-americana.



SEÇÃO I – A POLÍTICA EXTERNA DOS EUA

Os valores inspiradores da política externa dos EUA e das suas decorrentes estratégias, nas três últimas décadas, serão desvendados fazendo-se a conexão com as concepções geopolíticas que lhes são consentâneas.

Após a 2ª Guerra Mundial, a então URSS, provavelmente inspirada na Teoria de Mackinder (20), buscava a conquista da Ilha do Mundo, já tendo, de alguma forma, subjugado o Heartland, em virtude da sua projeção geopolítica na Europa Oriental. Para os EUA, o presidente Truman, influenciado por George Kennan, estabeleceu, em 1947, a sua doutrina política que tinha como idéia-força a contenção do expansionismo comunista.

A estratégia concebida por Kennan (a contenção, na periferia, da URSS) tinha como inspiração a Teoria das Fímbrias, a qual preconizava a conquista das orlas (Rimland) da Ilha do Mundo, com o propósito de isolar geopoliticamente a potência continental. Assim, esse confronto geopolítico, mais conhecido como conflito Leste-Oeste, se desenvolveu durante cerca de quatro décadas. Na maior parte desse período, os EUA detiveram uma nítida hegemonia econômica e, por larga margem, a proeminência político-estratégica sobre as lides internacionais.

Ao fim daquele conflito, os EUA estabeleceram, na década de 90, a Doutrina Clinton, alicerçada na Teoria da Tríade. Assim, foi elaborada uma nova concepção político-estratégica, inspirada pelo sentimento de proeminência e supremacia, exacerbando uma onipotente hegemonia que o esfacelamento da URSS incitava.

Nesse sentido, foi lançada, em fevereiro de 1996, a Estratégia de Segurança Nacional de Envolvimento e Ampliação (National Security Strategy of Engagement and Enlargement – NSS-EE) cujos três objetivos principais seriam: incremento da segurança com o emprego de forças militares que estivessem prontas para lutar com eficiência no exterior; revitalização da economia; e a promoção da democracia. Ou seja, mudar-se-ia o paradigma estratégico, ampliando-o para além da dimensão militar, dando-se destaque ao domínio econômico.

Assim, pelo seguinte fragmento da NSS-EE ficaria patente o seu espírito: “esses objetivos são alcançáveis desde que esteja assegurado que a América permanecerá envolvida no mundo e com a ampliação da comunidade de nações seguras, de livre mercado e democráticas”. Percebe-se que embutida nessa concepção residiria a ideologia da Comissão Trilateral – a interdependência entre os Estados.

Logo, a projeção da hegemonia norte-americana no cenário mundial, segundo a concepção estratégica de Clinton, dar-se-ia em três grandes áreas de livre comércio: a saber: América – inicialmente no âmbito do NAFTA e, posteriormente, na ALCA; Europa – Mercado Transatlântico; e Ásia – Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (APEC). Tal projeção teria como sustentáculos econômicos o FMI, o Banco Mundial e a OMC, os quais, na opinião de Ignacio Ramonet (21), encarnam o verdadeiro “eixo do mal”.

Portanto, é nessa linha de pensamento que a iniciativa da ALCA, um dos três tentáculos que comporiam a grande estratégia de inserção hegemônica dos EUA, ganha status de projeto de Estado. Ademais, seria o instrumento de projeção geopolítica e geoeconômica da superpotência, no teatro que sempre considerou como seu espaço vital (22) – o continente americano.

Assim, a estratégia de Clinton poderia ser caracterizada como eclética, pois temperou a prática da cooperação e do multilateralismo, principalmente no campo econômico (idealismo pragmático – soft power), com ações unilaterais, sobretudo na dimensão militar (realismo contundente – hard power), mantendo, todavia, a sua vocação hegemônica manifesta, que poderia ser sintetizada nas palavras do Secretário de Defesa William Perry, quando do primeiro mandato: “prevenir, dissuadir, derrotar”. Na realidade, “Clinton buscou associar a hegemonia norte-americana a um padrão liberal e democrático, sustentando seu poder em uma série de parcerias e instituições multilaterais”; ou seja, segundo analistas, uma hegemonia consensual.

Por ocasião da campanha eleitoral, da qual George Bush (filho) saiu vitorioso, já se vislumbrava uma forte guinada na política externa norte-americana, quando os republicanos criticavam abertamente a linha do multilateralismo trilhada por Clinton.

Na índole da mudança, verifica-se, pelos seguintes fragmentos, como se manifestou Condoleezza Rice, futura assessora de segurança nacional, em seu artigo programático Promovendo os interesses nacionais: “ os EUA e seus aliados estão do lado certo da História”; “acordos e instituições multilaterais não devem constituir fins em si mesmos”; e “os valores norte-americanos são universais”.

Na mesma linha reflexiva, Robert Zoellick, futuro USTR (23), escreveu: “uma das principais tarefas do próximo presidente dos EUA será arregimentar o apoio do povo para uma estratégia que irá moldar o mundo de forma a proteger e promover os interesses e valores dos EUA nos próximos 50 anos”. Assim, é nítida a vocação fundamentalista e etnocêntrica da política externa norte-americana. Ademais, poder-se-ia apontar que foi inspirada, grosso modo, na Teoria da Tríade, congruente, em linhas gerais, com a Teoria da Incerteza, de Pierre Lellouche.

Por conseguinte, os EUA procuram atingir os objetivos traçados pela doutrina política de Bush, por meio da atual Estratégia de Segurança Nacional (NSS), derivada primeira do atentado de 11 de setembro de 2001. Logo, com o intuito de firmar o entendimento do “Norte geopolítico bushiano”, busca-se amparo na própria NSS.

No campo político-militar, poderiam ser citados os seguintes fragmentos: “Os EUA há muito defendem a alternativa das ações preventivas no combate ao que possa se constituir numa ameaça suficiente a nossa segurança nacional (...). Para nos defendermos ou para evitarmos os atos hostis de nossos adversários, os EUA irão, se necessário, agir de forma preventiva”. É nesse contexto que esse país, ao invadir o Iraque, no primeiro semestre de 2003, fez uso da aberração estratégica da guerra preventiva.

No domínio econômico, são transparentes as seguintes assertivas: “As lições da história são claras: as economias de mercado, economias que não sejam comandadas e controladas pela mão pesada do Estado, são o melhor caminho para gerar prosperidade e reduzir a pobreza (...). O retorno a um forte crescimento econômico na Europa e no Japão é de importância vital para os interesses de segurança nacional dos EUA. Queremos que nossos aliados tenham economias fortes para seu próprio bem, para o bem da economia global, e para o bem da segurança global”.

De outra forma, na linha de pensamento da Teoria da Incerteza, segundo a qual haverá uma “desordem mundial” que poderá se estender até 2025, verifica-se que essa desordem se conformaria em face, principalmente, dos radicalismos e das tensões provocadas pelas questões das minorias étnicas, do reacendimento do nacionalismo extremado e da acirrada competição econômica. Ademais, as questões relacionadas aos fenômenos político-sociais, tais como o narcotráfico, a narcoguerrilha e o crime organizado transnacional constituir-se-iam em fatores contribuintes de peso para um complexo contexto internacional.

Com efeito, seria importante citar que vários acontecimentos, dentre outros, demonstrariam o animus de Bush, alinhado com o novo rumo da política externa dos EUA: rejeição do Tratado de Kyoto; rompimento de acordos estratégicos, como o Tratado sobre Mísseis Antibalísticos (ABM), para o desenvolvimento do sistema nacional antimísseis; pressões para a aceleração do processo de implantação da ALCA; não reconhecimento do Tribunal Penal Internacional; e o ápice, com a invasão do Iraque, à revelia do Conselho de Segurança da ONU. Assim, configurara-se o perfil agressivo e unilateral dos novos “condôminos” do poder norte-americano, cujo maniqueísmo arbitrário poderia ser resumido por meio da seguinte máxima: quem não está comigo é meu inimigo e será punido. Seria a apologia da linguagem da força, reafirmada pela imposição (manu militari).

Assim, não resta a menor dúvida quanto às intenções dos EUA: “no exercício de nossa liderança iremos respeitar os valores, os juízos e os interesses de nossos amigos e parceiros. Ainda assim, estaremos preparados para agir sozinhos, sempre que nossos interesses e nossas responsabilidades singulares assim o exigirem. (...)”.

Portanto, para sintetizar a atual concepção geopolítica dos EUA, poder-se-ia imaginar que esse país espera construir um contexto favorável à sua expansão político-econômica, amparada por inquestionável poderio militar, visando, em última análise, a consecução do projeto trilateralista: a expansão da economia de mercado sob a forte liderança dos EUA. Seria a hegemonia pelo poder, que volta a imperar. Os falcões retomaram o timão da nau norte-americana!

Com o intuito de firmar uma visão global da recorrente política externa da superpotência, aponta-se que os EUA sempre interferiram em assuntos internos de outros países, mas nunca aceitaram ingerência nos seus. A ação militar unilateral tem sido freqüente nas suas relações externas, desde a Guerra Hispano-Americana, em 1898, quando assumiram um papel protagônico na cena mundial.

Com efeito, os EUA aplicam de forma inequívoca, sempre que se faz necessário, a antiga, mas não menos atual, idéia de Foster Dulles: “a preocupação em fazer amigos não deve constar da política dos EUA, mas, sim, acima de tudo, a defesa dos seus interesses”. Ou seja, quando os seus interesses estão em jogo, valem-se da sua condição de superpotência, não se submetendo a nenhum tipo de limite, quer seja em observância às normas do direito internacional ou de resolução de organismo multilateral.


SEÇÃO II – A ÁREA DE LIVRE COMÉRCIO DAS AMÉRICAS (ALCA)
A idéia da integração comercial do continente americano apontaria para uma simbiose entre as Teorias da Tríade e a das Casas Comuns. Tal reflexão ganhou novo ímpeto quando, em junho de 1990, o presidente dos EUA de antanho, George Bush (pai), anunciou a “Iniciativa para as Américas”. Naquela oportunidade, propôs criar uma zona de livre comércio hemisférica, sugerindo, inclusive, que o NAFTA, ainda em processo de negociação, fosse o primeiro passo.

A possibilidade de criar-se uma zona que integrasse mercados, “do Alaska à Terra do Fogo” (anexo G), gerou acalorados debates na América Latina. Entretanto, a “Iniciativa” não prosperou e seu impulso foi declinando devido a alguns “acidentes de percurso”, como a recessão norte-americana, o término da Rodada Uruguai (GATT), a campanha presidencial norte-americana e as expressivas assimetrias entre as economias.

A proposta de formação da ALCA foi lançada em dezembro de 1994, no contexto da Doutrina Clinton, na Primeira Reunião de Cúpula das Américas, ocorrida em Miami (24). Naquela ocasião, foi firmada uma declaração de princípios, na qual os chefes de Estado concordaram em aumentar a cooperação e a integração hemisférica, com a eliminação progressiva das barreiras ao comércio, de tal forma que a ALCA estivesse conformada em 2005, em consonância com o contido no anexo F.

A idéia era dar seguimento ao NAFTA, usando-o como núcleo, e aproveitar a repercussão positiva do suposto “milagre econômico” mexicano. No entanto, o malogro do México, ocorrido em seguida, arrefeceu o animus norte-americano e obrigou os EUA a realizarem operações financeiras visando salvar a economia de seu parceiro comercial, as quais tinham por fim preservar as aplicações dos investidores norte-americanos.

Desde aquela época foram realizadas diversas reuniões, presidenciais e ministeriais, nas quais foram estabelecidos o rodízio na presidência da ALCA e os grupos de negociação para a sua formação (25). Nesse sentido, merece destaque a Segunda Cúpula das Américas (Santiago do Chile, 1998), que concluiu pelo término das negociações em 31 de dezembro de 2004, de forma a iniciar-se a redução alfandegária a partir de 2005, com a completa liberação tarifária em 2015.

Por fugir ao escopo deste trabalho, não serão analisadas as questões específicas referentes ao processo de negociação. No entanto, para que se tenha uma ampla visão, quatro pontos merecem destaque, os quais foram acordados na III Reunião Ministerial, realizada em Belo Horizonte (26): os países poderão negociar ou aderir, individualmente ou como membros de um grupo de integração subregional; o resultado das negociações constituirá um empreendimento único (single undertaking) (27); a ALCA será compatível com os acordos da OMC; e o consenso é princípio fundamental nos processos decisórios. Portanto, o foco será direcionado para duas questões fundamentais: Quais seriam os possíveis riscos, diante do perfil da política externa dos EUA? O Brasil deveria ou não permanecer na ALCA?

Na busca das respostas, o primeiro aspecto a ser considerado é a postura dos EUA em considerá-la um projeto de Estado, entendendo o autor que tal empreendimento se caracteriza pela persistência ao longo do tempo, não sofrendo solução de continuidade mesmo quando há revezamento na cúpula do poder. Assim, verifica-se que a sua concepção tem se mantido ativa, como um dos instrumentos de inserção geopolítica hemisférica dos EUA, independente do “mandatário de plantão” na Casa Branca e de sua corrente política. Comprova-se tal assertiva, examinando-se as estratégias lançadas por Clinton (28) e George Bush (29).

De outro modo, outros aspectos dignos de nota, que contribuem para reforçar a tese acima, dizem respeito à dimensão da ALCA para a economia estadunidense. O primeiro é o peso geoeconômico do bloco americano, conformado por uma população de quase 800 milhões de habitantes, um PIB de aproximadamente US$ 12 trilhões e comércio exterior na casa de US$ 2,9 trilhão (anexo H). Em outras palavras, o ambiente americano compõe-se num maiúsculo mercado e, portanto, poderia constituir-se na “tábua de salvação” para a combalida economia dos EUA, pois seria um caminho essencial para o restabelecimento da sua balança comercial que apresenta, atualmente, um déficit em torno de 450 bilhões de dólares.

Com efeito, um processo de integração como o da ALCA é complexo por natureza, conformando, hoje, nove grupos de negociação, cada qual com um país exercendo a sua presidência: acesso a mercados – Colômbia; investimentos – Costa Rica; compras do setor público – EUA; solução de diferenças – Chile; agricultura – Argentina; direitos de propriedade intelectual – Venezuela; subsídios, antidumping e direitos compensatórios – Brasil; e políticas de concorrência – Peru.

Depreende-se, pois, que natural seria um projeto de abrangência hemisférica suscitar muitos debates, pois congrega 34 países cujas desigualdades políticas, econômicas (anexo H) e, até mesmo, culturais, são determinantes. Por isso, muitos estudiosos têm assinalado que a consolidação da ALCA poderia trazer para o Brasil mais desvantagens do que vantagens, se fosse feita isoladamente, precipitadamente e de forma assimétrica. Nessa direção, seria interessante registrar que na “Cúpula” fundante, o presidente do Brasil prenunciava o animus negociador do País, firmando que a posição brasileira seria pautada pelo gradualismo, priorizando o regionalismo aberto e a observância dos compromissos assumidos multilateralmente, lembrando a necessidade da constituição de um espaço econômico livre de políticas protecionistas.

Um crítico severo à permanência do Brasil nesse processo é o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o qual, nesse sentido, esclarece que a ALCA faz parte de uma operação estratégica de amplo alcance e de longo prazo, sendo seus principais objetivos políticos, no ângulo externo, consolidar a influência norte-americana sobre os maiores Estados da região, garantindo seu apoio em disputas dos EUA com outras potências, e internamente, consolidar vínculos de dependência jurídica.

Por outra via, no campo econômico, ainda entende o embaixador que os principais instrumentos da “estratégia de Miami” são a pressão pela adoção de políticas neoliberais de reorganização econômica, que reduzam e enfraqueçam os Estados e desregulamentem as economias. Continuando com Pinheiro Guimarães, os EUA pretendem estabelecer um território econômico único nas Américas, com livre circulação de bens, serviços e capitais, porém sem livre circulação da mão-de-obra, em especial aquela de menor qualificação, e fazer, gradualmente, adotar o dólar como moeda hemisférica, cuja emissão e circulação ficariam sob exclusivo controle norte-americano. No aspecto monetário, percebe-se, portanto, a conexão da adoção do dólar, como moeda hemisférica, com a Teoria das Casas Comuns de Brochard.

De outro modo, poder-se-ia apontar outros riscos a serem enfrentados pelo Brasil: despreparo de diversos setores da indústria brasileira, principalmente no domínio tecnológico; falta de firmeza, e por vezes ausência, de uma política econômica consentânea com o tamanho do País; disparidade geopolítica dos países participantes; e a presente configuração do temário de negociações.

Diante do exposto, poder-se-ia, de forma impetuosa, concluir que a única opção que restaria ao Brasil seria a sua retirada da ALCA, sob pena de ser tragado geopoliticamente pela superpotência do Norte. No entanto, deve-se levar em conta a possibilidade de permanência do País no projeto, não desprezando as oportunidades, principalmente o acesso ao maior mercado mundial.

O País não deve, contudo, abdicar da sua soberania, adotando uma postura político-estratégica que valorizasse sua dimensão geopolítica, de modo a contribuir para o delineamento de uma geoeconomia hemisférica que fosse ao encontro dos seus interesses e, por via de conseqüência, dos demais países latino-americanos. Nesse sentido, concorda-se com a opinião do embaixador Rubens Barbosa de que “a ALCA será positiva ou negativa, à medida que o Brasil souber ou não fazer prevalecer seus interesses nas negociações”.

Considerando-se que o Canadá e o México já fazem parte do NAFTA, estando, portanto, imbricados de forma acentuada com a economia norte-americana, e que o Brasil seria o líder natural da América do Sul, caberia ao País assumir o papel de principal articulador do contraponto às posições defendidas pelos EUA, de modo que “a ALCA desejável, na visão brasileira, seria aquela que reduzisse as desigualdades, entre os países e dentro deles, que ampliasse as oportunidades e trouxesse benefícios eqüitativos para todos no hemisfério, grandes e pequenos, desenvolvidos e em desenvolvimento, enfim que fosse um empreendimento de parceiros, não de competidores”.

Verificando-se os PIBs dos países americanos (anexo H), constata-se que o dos EUA (cerca de 77%) somado ao do Canadá representam quase 82% do total dos demais Estados, restando à América Latina e Caribe 18%, dos quais o Mercosul totaliza 10%, com o Brasil representando dois terços. É digno de nota que 25 países perfazem apenas 1%. Portanto, vis-à-vis ao valor assimétrico do PIB norte-americano, ficaria evidente a importância do Brasil em relação aos demais países latinos do hemisfério, até porque sua economia estaria colocada entre as dez maiores do mundo, calculando-se o PIB pela paridade do poder de compra. Nesse sentido, o estudo realizado pelo Conselho de Relações Exteriores, em 2001, enviado por meio de carta ao presidente Bush, confirmou tal juízo de valor, ao concluir que não há interlocutor estratégico melhor que o Brasil e que os EUA não podem agir isoladamente na América do Sul, sugerindo que um diálogo realista e permanente com o País é primordial para o sucesso da política hemisférica norte-americana.

Com efeito, defronte dos dados apresentados, o autor concorda com Pinheiro Guimarães, quando afirma que “é preciso encarar a ALCA como um projeto essencialmente entre o Brasil e os EUA”.




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