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...y no se lo tragó a coesão romanesca com efeito se dá na recuperação de situações e
personagens principais no último conto da obra, em La frontera, mesmo na suposta
autonomia que finge dar aos contos, o romance vai pouco a pouco, aqui e ali, trazendo de
volta situações, espacializações e personagens que importarão sobremaneira ao drama
principal que percorre a vida de diferentes componentes de uma família mexicana, os Barroso.
As histórias dos componentes dessa família apresentam sempre alguma interligação com seu
membro em maior evidência, don Leonardo Barroso, um poderoso empresário mexicano com
influentes relações também nos EUA.
Ao redor de Leonardo Barroso também terminam por estarem coligadas as histórias de
alguns outros personagens, entrelaçadas pela narrativa ao longo de diferentes contos do
romance, em uma interligação cujo ápice se dá no último capítulo da trama, o conto “Río
Grande, río Bravo”. Ali, o ponto culminante é o fim trágico destinado à figura de Leonardo
Barroso. Merece destaque, ainda, o atravessamento promovido nesse último capítulo de um
texto-rio também escrito em cursivas, qual no romance de Tomás Rivera de 1971. Entretanto,
enquanto em Rivera o texto-rio cruza o último conto interligando-o estritamente aos
personagens e situações da trama engendrada no romance, em Fuentes o texto-rio, como parte
da atmosfera de ranço histórico que perpassa o enredo, traz primeiro uma espécie de ensaio
histórico que recupera para o leitor nomes, lugares e momentos integrantes da história do
México, antes, durante e depois de seu encontrazo com Espanha e Estados Unidos. Apenas
depois, esse trecho rio fuentesiano trará de volta os personagens que já haviam merecido
realce pela narrativa, reunindo-os em novas situações as quais, tendo o final dramático do
senhor Leonardo Barroso como eixo giratório, encaminham a trama para seu fim.
Verificado esse primeiro ponto de estranhamento (quase) em comum entre as obras, há
a observação de que tal dinamismo incide, por consequência, em outro aspecto que empresta
seu caráter à literariedade desses romances: o princípio de construção. Destacado pelo
formalista Yuri Tynianov (1894-1943), o princípio de construção, coincidindo com o
dinamismo para a forma, também chamado por ele de princípio de formação, traz como uma
de suas características marcantes o processo de deformação através do qual certos fatores
formadores da obra literária são promovidos em detrimento de outros. Desse modo, faria parte
da interação dinâmica da forma a evolução (desconsiderando o tempo) e consequente
renovação dos liames entre um fator subordinante de construção e os fatores a ele
subordinados. Tal evolução da relação de subordinação não ocorre sem o conflito próprio que
responde pela interação dinâmica da forma, sendo preponderante para a sobrevivência do fato
artístico, para que o receptor possa experimentar a arte que, pela renovação do conflito entre
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suas partes integrantes, desautomatiza a percepção acostumada ao real vivido (Cf.
TYNIANOV, [1923] 1973, p. 101-2-3).
Isto posto, tem-se que em ...y no se lo tragó la tierra e em La frontera de cristal o
elemento subordinante é a forma romance, a qual estabelece, na dúvida de relação de
dependência dos contos que a compõem, conflituosa interação com os elementos a ela
subordinados, seus capítulos. Passa a existir a promoção de um fator no elemento
subordinante, sendo tal fator a concepção de romances entrecortados, fragmentados, os quais
deformam o elemento subordinado mais evidente, o fator construtivo tido como principal em
um romance: o capítulo. Assim, os contos que dão forma às duas obras em relevo,
deformados na desestabilização da certeza de diferença entre o gênero conto e o segmento
romanesco capítulo, surgem como pontos integrantes de uma interação que, da maneira como
é disposta, concede ao leitor/receptor, pelo estranhamento que causa, pela surpresa de uma
maneira não habitual de se contar um romance, uma experimentação distinta para a arte
literária, sendo esta mais uma das características que aproxima a literariedade nos e dos
romances ora abordados.
Um terceiro estranhamento a evidenciar a literariedade em ambas as obras tem a ver
com a linguagem literária que implementam. Sobre a linguagem na literatura, Viktor
Chklovski, em seu artigo de 1917 “A arte como procedimento”, retorna a Aristóteles ao
relembrar que, segundo o filósofo grego, a língua literária deve trazer em si um caráter de
estranho, algo que venha a surpreender seu leitor. E completa seu argumento dizendo que essa
língua
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“na prática, é frequentemente uma língua estrangeira” (CHKLOVSKI, [1917] 1973,
p. 54). Para continuar sua argumentação, Chklovski cita exemplos que vão desde a inclusão
surpreendente de linguagem popular no estilo literário de Pushkin até a influência da língua
búlgara antigo sobre a língua literária russa de seu tempo, com a subsequente e interessante
ação dessa de volta à linguagem popular, reintroduzindo a esta muito dos dialetos recuperados
anteriormente pela própria ação da literatura russa.
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Língua e linguagem poética aqui e em Aristóteles englobam também a prosa. Um pouco mais adiante, porém,
mais próximo ao fim de seu artigo, Chklovski busca diferenciá-las algo mais, especialmente no que diz respeito
ao caráter de surpreendente. Nesse momento, o formalista, ao tocar na linguagem prosaica das conversações,
aborda seu ritmo como fator “automatizante”. O ritmo poético, entretanto, compreenderia um ritmo estético no
qual o ritmo prosaico é constantemente violado. No entanto, ao referir-se a esse ritmo prosaico “automatizante”,
Chklovski está fazendo menção à prosa conversacional quotidiana, suscitando separá-la da arte, onde englobada
estaria a linguagem literária tanto escrita em prosa quanto em poesia. Há que se tocar, ainda, no adendo para o
qual chama atenção o autor quando ele observa que se a violação a que se refere vir a tornar-se regra constante
ela perderá força como procedimento artístico (Cf. CHKLOVSKI, [1917] 1973, p. 56), algo que, no tocante ao
tema de minha tese, remete-nos a pensar na perda de ação e influência de obras (que nesse círculo de tornarem-
se regra venham a cair) sobre a participação em (e na formação de) imaginários.
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