Neblina Sobre Mannheim Bernhard Schlink e Walter Popp



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da mesa-de-cabeceira e falou comigo, preocupada.

- Está tudo bem, Gerd! Ninguém te faz mal.

Desenvencilhei-me dos lençóis que me apertavam.

- Meu Deus, mas que pesadelo.

- Conta-mo, vai fazer-te bem.

Eu não quis, e ela ficou ofendida.

- Gerd, já notei que há algo que não está bem contigo. Por vezes, estás totalmente ausente.

Aninhei-me nos seus braços.

- Já passa, Brigitte. Não tem nada a ver contigo. Tem paciência aqui com o velhote.

Apenas na Passagem do Ano é que os meios de comunicação falaram da morte do Korten. Um acidente trágico fizera com que se precipitasse no mar durante um passeio

pela costa, na sua residência de férias, na Bretanha, na manhã da Véspera de Natal. As informações que haviam sido preparadas pela imprensa e pela rádio, para comemorar

o septuagésimo aniversário do Korten, eram agora utilizadas nos discursos fúnebres e nos elogios. Com o Korten, terminava uma época, a época dos grandes homens da

reconstrução do Pós-Guerra. O enterro realizar-se-ia no início de Janeiro, com a presença do Presidente da República Federal da Alemanha, do Chanceler federal, do

Ministro da Economia alemão, assim como de todos os membros do governo da Renânia-Palatinado. Nada de melhor poderia ter acontecido à carreira do filho. Eu seria

convidado, como cunhado que era, mas não iria. Também não iria apresentar as minhas condolências à sua mulher, Helga.

Não tinha inveja da fama dele. Também não lhe perdoava. Assassinar alguém significa não ter de perdoar.

21

Lamento muito, senhor Selb



A Babs, a Rõschen e o Georg chegaram às sete horas. A Brigitte e eu tínhamos terminado naquele momento os preparativos para a festa, acendido as velas da árvore

de Natal, e estávamos sentados no sofá com o Manuel.

- Até que enfim a vemos! - A Babs olhou para a Brigitte com curiosidade, com simpatia, e deu-lhe um beijo.

- Muitos parabéns, tio Gerd! - disse a Rõschen. - E a árvore de Natal está muita louca).

Dei-lhes os presentes.

- Mas, Gerd - disse a Babs, repreendendo-me -, não tínhamos combinado que, este ano, não nos daríamos nada?! - e fez aparecer um pacotinho. - Isto é de nós os três.

A Babs e a Ròschen tinham tricotado uma camisola vermelha escura, em que o George integrara, nos lugares apropriados, um circuito eléctrico com oito lampadinhas

formando um coração. Quando vesti a camisola, as lampadinhas começaram a piscar ao ritmo do meu coração.

Depois chegaram o senhor e a senhora Nágelsbach. Ele vestia um fato preto, colarinhos altos e laço, no nariz umas lunetas, e era a cara chapada do Karl Kraus. Ela

tinha um vestido fin-de-siècle.

- Senhora Gabler? - cumprimentei, cerimoniosamente.

Ela fez uma pequena vénia e juntou-se às outras mulheres.

Ele ficou a olhar para a minha árvore de Natal com ar de desprezo.

- Burgueses que não se levam a sério, e que também não conseguem despir a pele...

A campainha não parava. O Eberhard entrou com uma pequena mala.

- Preparei uns truques de magia.

O Philipp trazia com ele a Fúruzan, uma enfermeira turca cheia de raça e exuberância.

- A Fúrzinha sabe dançar a dança do ventre!

A Hadwig, uma amiga da Brigitte, tinha o Jan consigo, o filho de catorze anos, que começou logo a dar ordens ao Manuel.

Todos se apertavam na cozinha, em torno do buffet frio. Despercebida, a Beiss nicht gleich jeder Apfel, de Wencke Myhres, soava na sala vazia; o Philipp pusera a

tocar os êxitos do ano de 1966.

O escritório estava vazio. O telefone tocou. Fechei a porta atrás de mim. A alegria da festa chegava, amortecida, aos meus ouvidos. Todos os meus amigos estavam

ali. Quem estaria a telefonar-me?

- Tio Gerd? - era o Tyberg. - Feliz Ano Novo! AJudhh contou-me, e eu li os jornais. Parece que resolveu o caso Kor-ten.

- Olá, senhor Tyberg. Também lhe desejo um Bom Ano Novo. Vai escrever o tal capítulo sobre o processo?

- Mostro-lho quando me vier visitar. A Primavera é maravilhosa aqui, no Lago Maggiore.

- Irei. Até então.

O Tyberg compreendera. Fez-me bem saber que havia alguém que também sabia, e que não iria pedir-me contas.

A porta abriu-se de supetão e os meus convidados exigiram a minha presença.

- Onde estás escondido, Gerd? A Fúruzan vai começar a dança do ventre para nós.

Arranjámos um espaço para dançar, e o Philipp enroscou uma lâmpada vermelha no candeeiro. A Fúruzan saiu da casa de banho com um biquíni que tinha véus, cordões

e coisinhas a brilhar pendurados. O Manuel e o Jan ficaram de olhos esbugalhados. A música começou lamentosa e lenta, e os primeiros movimentos da Fúruzan foram

de uma insinuação calma e lasciva. Depois a música intensificou-se e, com ela, o ritmo da dança da Fúruzan. A Rõschen começou a bater palmas, e todos a imitaram.

A Fúruzan deixou cair os véus, fez girar muito rapidamente os cordões que tinha presos ao umbigo, e o chão da sala tremeu. Quando a música terminou, a Fúruzan terminou

a dança numa pose triunfante, e atirou-se para os braços do Philipp.

- Assim é o amor das turcas - riu-se o Philipp.

- Ri-te, ri-te, que eu já te apanho. Não se brinca com as mulheres turcas - ela olhou-o orgulhosamente nos olhos.

Eu trouxe-lhe o meu roupão.

- Alto! - gritou o Eberhard, quando o público se preparava para dispersar. - Convido-os para um espectáculo de cortar a respiração, do grande mágico Ebus Erus Hardabakus.

E fez aros girar, e entrar uns dentro dos outros, e voltar a sair, de panos amarelos fez vermelhos, fez moedas aparecer e desaparecer novamente, e o Manuel teve

autorização para verificar se tudo se passava sem batota. O truque com o ratinho branco correu mal. O Turbo saltou para cima da mesa logo que o viu, atirou pelos

ares o cilindro, debaixo do qual o Eberhard acabara de o fazer desaparecer, correu atrás dele pela casa fora e, brincando, partiu-lhe o pescoço atrás do frigorífico,

antes que um de nós pudesse intervir. A seguir, o Eberhard quis partir o pescoço ao Turbo, mas felizmente a Rõschen pendurou-se-lhe no braço.

Era a vez do Jan. Recitou Os Pés em Fogo, de Conrad Ferdi-nand Meyer. Ao meu lado, estava sentada a Hadwig, ansiosa, e os seus lábios diziam mudamente o poema.

- Minha é a vingança, assim fala o Senhor! - bradou o Jan por fim.

- Encham copos e pratos, e venham outra vez para aqui - gritou a Babs -, o espectáculo vai continuar.

Falou em segredo com a Ròschen e o Georg, e os três afastaram a mesa e as cadeiras, e fizeram da pista de dança um pequeno palco. Adivinhar nomes de filmes. A Babs

soprou com as bochechas bem cheias, e a Ròschen e o Georg correram dali.

- E tudo o vento levou!- gritou o Nágelsbach.

Depois o Georg e a Ròschen começaram à pancada, até que a Babs se meteu entre eles, lhes agarrou nas mãos e as pôs uma na outra.

- Kemal Atatúrk na guerra e na paz!

- Demasiado turco, Fúrzinha - disse o Philipp e fez-lhe uma festa no braço -, e não é que ela não é tão cheiinha?!

Eram onze e meia e eu assegurei-lhe de que havia gelo suficiente no congelador. Na sala, a Ròschen e o Georg haviam tomado a aparelhagem e faziam disparar músicas

antigas pelas colunas.

Eins und eins, das macht zwei, cantava a Hildegard Knef, e o Philipp tentou valsar no estreito corredor com a Babs. As crianças jogavam à "apanhada" com o gato.

Na casa de banho, a Fúruzan lavava-se do suor da dança do ventre. A Brigitte veio ter comigo à cozinha e deu-me um beijo.

- Bonita festa.

Quase não ouvi soar a campainha. Pressionei o botão para abrir a porta lá de baixo, mas depois vi a silhueta verde através do vidro martelado da entrada, e soube

que o visitante já cá estava em cima. Abri. Diante de mim estava o Herzog, vestido de uniforme.

- Lamento muito, senhor Selb.

Então, era o fim. Diz-se que isso sucede apenas pouco antes da execução mas, naquele momento, passaram-me pela cabeça as imagens da última semana: o último olhar

do Korten, a chegada a Mannheim na manhã da véspera de Natal, a mão do Manuel na minha, as noites com a Brigitte, o nosso grupo descontraído em redor da árvore de

Natal. Quis dizer alguma coisa. Não consegui que saísse nenhum som.

O Herzog passou por mim e entrou na sala. Ouvi baixarem o som da música. Mas os amigos continuavam a rir e a conversar animadamente. Quando consegui controlar-me

e entrei na sala, o Herzog tinha um copo de vinho na mão, e a Rõschen, um pouco tocada, brincava com os botões do seu uniforme.

- Estava agora mesmo no caminho de regresso a casa, senhor Selb, quando me chegou pelo rádio uma queixa por causa da sua festa. Então resolvi ser eu mesmo a dar

um salto cá a sua casa.

- Despachem-se! - gritou a Brigitte. - Só faltam dois minutos.

Era o tempo suficiente para distribuir os copos de champanhe e fazer saltar as rolhas.

Agora, estamos todos na varanda: o Philipp e o Eberhard lançam os foguetes, de todas as igrejas ouvem-se sinos a repicar, todos brindamos.

- Feliz Ano Novo!

FIM



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