Neblina Sobre Mannheim Bernhard Schlink e Walter Popp



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trabalharam daquela vez, morreu.

O Fred levantou-se, gemendo. Indiquei-lhe a casa de banho e servi-lhe uma Sambuca. Ele engoliu-a de um só trago e pôs-se a andar.

- Já estou bem - murmurou. - Mas por hoje já chega. Vou andando.

Talvez ele achasse que o meu comportamento era normal do ponto de vista da profissão dele. Mas eu tinha perdido a sua simpatia para sempre.

Mais outra peça do quebra-cabeças e, contudo, a imagem não fazia sentido. Portanto, a confrontação entre as IQR e o Mischkey ia até ao contrato de espancadores profissionais.

Mas da lição que o Mischkey recebera no cemitério Ehren ao assassinato ia um passo gigantesco.

Fiquei sentado atrás da minha secretária. O Sweet Afton tinha-se fumado a si próprio e restava apenas o seu corpo feito de cinzas. O trânsito rumorejava pelo Centro

Augusta. Do pátio de trás, ouviam-se os gritos de crianças a brincar. Há certos dias, no Outono, que fazem vir o Natal à memória. Pensei com o que é que deveria

enfeitar este ano a árvore de Natal. A Klarinha gostava muito do que era clássico e pendurava na árvore bolas brilhantes de vidro prateado e lametta, ano sim, ano

sim. Desde então, experimentei desde carros viquingues a pacotes de cigarros. Consegui com isso ganhar uma certa fama entre os meus amigos, mas ao mesmo tempo estabeleci

critérios aos quais agora estou sujeito. O universo dos pequenos objectos que têm potencial para serem enfeites de árvores de Natal não é ilimitado. Latas de sardinhas

em óleo vegetal, por exemplo, seriam decorativas, mas são demasiado pesadas.

O Philípp ligou e exigiu que eu fosse ver o seu novo cruzador. A Brigitte perguntou o que é que eu ia fazer naquela noite. Convidei-a para jantar comigo em casa,

desatei a correr e ainda arranjei lombinhos de porco, presunto e chicória.

Comemos lombinhos de porco à italiana. Depois, pus O homem que amava as mulheres. Já conhecia o filme e estava curioso por ver como a Brigitte reagiria a ele. Quando

o pinga-amor capotou quando perseguia um belo par de pernas, achou que era muito bem feito para ele. Não gostou muito do filme. Mas quando este terminou, não deixou

de posar como que por acaso diante do candeeiro de pé, e de fazer valer as suas pernas na contraluz.

18

Uma pequena história



Deixei a Brigitte no trabalho, no Centro Collini, e bebi o meu segundo café no Gmeiner. Não tinha nenhuma pista quente no caso Mischkey. Claro que podia continuar

à procura das estúpidas pecinhas do meu quebra-cabeças, virá-las de um lado para o outro sem saber o que fazer, e combiná-las, tentando formar esta ou aquela imagem.

Estava farto. Sentia-me jovem e dinâmico depois da noite passada com a Brigitte.

No café, a patroa ralhava com o filho.

- Da maneira como te empenhas, pergunto-me se tens qualquer intenção de vires a ser pasteleiro!

Estar-me-ia eu a empenhar a fundo na investigação das minhas pistas? Tinha medo dos que dirigiam as IQR. Porquê? Temeria eu descobrir que tinha entregue o Mischkey

a carrascos? Estaria eu, subconscientemente, a baralhar as pistas por minha causa e do Korten e da nossa amizade?

Fui de carro até Heidelberg, até ao CRI. O Gremlich tinha intenções de me despachar rapidamente, e ficou de pé. Sentei-me e voltei a tirar da pasta as folhas impressas

do Mischkey.

- O senhor queria ver isto novamente, senhor Gremlich. Posso deixá-las agora aqui. O Mischkey era mesmo um verdadeiro diabo: voltou a penetrar no sistema das IQR,

embora a ligação já estivesse interrompida. Penso que foi pelo telefone, o que é que acha?

- Não sei do que está a falar - mentiu ele, bastante mal.

- O senhor mente bastante mal, senhor Gremlich. Mas não importa. Para aquilo que eu vim dizer-lhe, não interessa se o senhor mente bem ou mal.

- Como?


Ele ainda estava de pé e olhava-me sem perceber. Fiz um gesto convidativo com a mão.

- Não quer sentar-se?

Ele abanou a cabeça.

- Não tenho de lhe dizer a quem pertence o Ford Escort vermelho com a matrícula HD-S 735 que está lá em baixo, no parque de estacionamento. Faz hoje precisamente

três semanas que o Mischkey se precipitou da ponte entre Eppelheim e Wieblingen, com o carro, para cima dos carris, depois de um Ford Escort vermelho o ter apertado.

A testemunha que eu consegui descobrir até viu que a matrícula do Ford vermelho começava por HD e terminava em 735.

- E por que é que está a contar-me isso? O senhor devia dizer isso à Polícia.

- Tem toda a razão, senhor Gremlich. A testemunha já deveria ter ido à Polícia. Primeiro tive de lhe fazer ver que uma mulher ciumenta não é motivo para encobrir

um assassinato. Entretanto, ele ja concordou em ir comigo à Polícia.

- Sim, e então? - Cruzou os braços diante do peito, com ar superior.

- A probabilidade de existir mais um Ford Escort de Hei-delberg, com uma matrícula que se enquadre na descrição é de... Ora, faça o senhor as contas. As amolgadelas

do Escort vermelho parecem ter sido pequenas e fáceis de reparar. Diga-me, senhor Gremlich, roubaram-lhe o carro há três semanas, ou emprestou-o?

- Não, claro que não, que disparates são esses que está para aí a dizer?

- Isso também me teria espantado. O senhor sabe que, no caso de um assassinato, coloca-se sempre a pergunta de a quem ele aproveitará. O que é que acha, senhor Gremlich?

A quem aproveita a morte do Mischkey?

Ele fungou com desprezo.

- Então deixe-me contar-lhe uma pequena história. Não, não, não fique impaciente, é uma pequena história muito interessante. Continua a não querer sentar-se? Muito

bem, era uma vez uma grande fábrica química e um Centro Regional de Informática, que devia controlar a fábrica. A fábrica química tinha interesse em não ser demasiado

bem controlada. No Centro Regional de Informática havia duas pessoas decisivas para o controlo da fábrica química. Para esta, aquilo significava muito, muito dinheiro.

Se houvesse hipótese de comprar um dos controladores... Quanto não daria ela por isso! Mas só compraria um, porque só precisava de um deles. Sonda os dois. Pouco

tempo depois, um deles está morto, e o outro paga uma dívida ao banco. Quer saber o montante?

Nesse momento, ele sentou-se. Para corrigir esse erro, fingiu que estava indignado.

- É monstruoso o que o senhor atribui não apenas a mim, mas a uma das nossas empresas químicas mais famosas e ricas em tradições. O melhor é eu ir contar-lhes isto;

eles podem defender-se melhor do que eu, que sou um pequeno e insignificante funcionário.

- Acredito nisso plenamente, que preferiria ir a correr para as IQR. Mas, neste momento, a história passa-se entre o senhor, a Polícia e eu, e ainda a minha testemunha.

A Polícia vai ficar interessada em saber onde estava naquela altura e, tal como a maioria das pessoas, o senhor também não conseguirá apresentar um álibi sólido,

três semanas postfestum.

Se tivesse havido uma visita aos sogros, juntamente com a sua pobre mulher e os seus indubitavelmente feiíssimos filhos, sem dúvida que ele agora o teria dito. Em

vez disso, respondeu:

- Não pode existir nenhuma testemunha que me tenha visto lá, porque eu não estive lá.

Tinha-o onde queria. Não me sentia mais leal do que ontem com o Fred, mas igualmente em boa forma.

- Correcto, senhor Gremlich, nenhuma testemunha o viu lá. Mas eu tenho alguém que irá afirmar tê-lo visto lá. E o que pensa que irá então acontecer? A Polícia tem

um morto, um crime, um criminoso, uma testemunha e um motivo. Mesmo que a testemunha se venha abaixo no tribunal, durante o julgamento, até lá o senhor fica completamente

destruído. Já não sei quanto dá hoje em dia o crime de corrupção mas, para além disso, temos de somar o tempo de prisão preventiva por assassinato, a suspensão do

serviço, a vergonha para a mulher e os filhos, o desprezo social.

O Gremlich empalidecera.

- O que significa isto? Por que está a fazer-me isto? Que mal lhe fiz eu?

- Não me agrada o modo como se vendeu. Não o suporto. Além disso, quero saber uma coisa. E se não quer que o arruine, é melhor que entre no meu jogo.

- O que quer de mim?

- Quando é que as IQR o contactaram pela primeira vez? Quem é que o recrutou e quem é, por assim dizer, o oficial de quem recebe ordens? Quanto recebeu das IQR?

Ele contou-me tudo: o primeiro contacto que o Thomas estabelecera com ele depois da morte do Mischkey, as negociações relativas ao trabalho e ao pagamento, os programas

que ele tinha em parte pensado, e em parte também já realizado. E falou da mala com as notas novas.

- Cretino foi só o facto de, em vez de ir pagando as minhas prestações aos poucos, sem levantar suspeitas, ter ido logo ao banco. Queria poupar os juros.

Ele tirou um lenço do bolso para limpar o suor e eu perguntei-lhe o que sabia da morte do Mischkey.

- Tanto quanto eu percebi, eles quiseram pressioná-lo, depois de o senhor ter provado a sua culpabilidade. Queriam a cooperação dele, pela qual me pagam agora, gratuitamente,

em troca de deixarem cair aquilo dos assaltos do Mischkey ao sistema informático. Quando ele morreu, ficaram bastante descontentes porque agora iriam ter de pagar.

A mim, evidentemente.

Ele teria podido continuar a falar sem parar, provavelmente ainda teria gostado de se justificar. Eu já tinha ouvido o suficiente.

- Obrigado, basta por hoje, senhor Gremlich. Se eu fosse o senhor, não falaria desta conversa a ninguém. Se as IQR souberem que eu sei, o senhor perde o valor para

a fábrica. Se lembrar ainda de mais alguma coisa em relação ao caso Mischkey, telefone-me.

Dei-lhe o meu cartão.

- Sim, mas... O senhor não se importa com o que está a acontecer com o controlo das emissões de poluentes? Ou está a pensar em ir, apesar de tudo, à Polícia?

Lembrei-me do fedor que tantas vezes me fazia fechar as janelas. E daquilo que não cheiramos. Contudo, naquele preciso momento, isso era-me indiferente. Voltei a

guardar as folhas impressas do Mischkey que estavam em cima da secretária do Gremlich. Quando me preparava para sair, o Gremlich estendeu-me a mão. Ignorei-a.

19

Energia e Resistência



À tarde tinha um encontro marcado com o mestre do ballet. Mas estava sem vontade de lá ir e desmarquei-o. Fui para casa, deitei-me na cama e acordei outra vez apenas

às cinco da tarde. Era muito raro dormir a sesta. Por causa da minha tensão baixa, custa-me muito voltar a levantar-me depois. Tomei um duche quente e fiz café forte.

Quando telefonei ao Philipp, a enfermeira disse:

- O senhor doutor já saiu, para experimentar o barco novo.

Atravessei Neckarstadt, fui até Luzenberg e estacionei na Rua Gewirg. No cais, passei por muitos barcos até encontrar o do Philipp. Reconheci-o pelo nome. Chamava-se

Fauno 69.

Não percebo nada de navegação. O Philipp explicou-me que com aquele barco poderia navegar até Londres ou contornar a França até Roma, desde que não se afastasse

muito da costa. A água chegava para dez duches, o frigorífico para quarenta garrafas e a cama para um Philipp e duas mulheres. Depois de mo ter mostrado, ligou a

aparelhagem, meteu um disco de Hans Albers e abriu uma garrafa de Bordéus.

- Tenho direito a uma viagem inaugural?

- Vamos com calma, Gerd. Primeiro vamos esvaziar a garrafinha, depois levantamos âncora. Tenho radar e posso partir a qualquer hora do dia ou da noite.

A garrafinha passou a duas. Primeiro, o Philipp falou-me das suas mulheres.

- E contigo, Gerd, como vai isso de amores?

- Ora, o que posso eu dizer?

- Nada de mulheres-polícia desembaraçadas ou de secretárias boazonas, ou com quem quer que tu tenhas a ver?

- Num dos casos recentes, conheci uma mulher que me agradaria muito. Mas é uma situação difícil, já que o namorado morreu.

- Ora, por favor, o que é que há de difícil nisso?

- Bem, eu não posso atirar-me a uma viúva de luto, ainda por cima se tenho de descobrir se o namorado foi assassinado.

- Por que não? Isso é o teu código de honra de procurador do Ministério Público, ou tens apenas medo que ela te dê uma tampa? - troçou ele.

- Não, não, isso não é bem assim. E depois há ainda a outra, a Brigitte. Também me agrada muito. Não sei o que devo fazer, assim, com duas mulheres.

O Philipp deu uma gargalhada estridente.

- És mesmo um cavalheiro. E o que é que te impede de conheceres melhor a Brigitte?

- Isso já aconteceu... Já...

- E ela agora espera uma criança tua?

O Philipp já quase não se conseguia aguentar de tanto rir. Depois reparou que eu estava tudo menos divertido, e perguntou seriamente como eu estava a sentir-me.

Contei-lhe.

- Isso não é motivo para estares tão triste. Apenas tens de saber o que queres. Se estás à procura de uma para casar, então fica com a Brigitte. Não são nada más,

as mulheres de quarenta, já viram tudo, já viveram tudo, e são sensuais como um súcubo, se souberes despertá-las. E ainda por cima uma mas-seurin, tu, com o teu

reumatismo! A outra soa mais a stress. Apetece-te isso? O amourfou, o júbilo incrível, a aflição mortal?

- Ainda não sei o que quero. Provavelmente, quero as duas coisas, a segurança e a excitação. De qualquer maneira, umas vezes quero uma, e outras a outra.

Isso compreendia ele. Nisso, éramos iguais. Entretanto, eu já sabia onde estava o Bordéus, e fui buscar a terceira garrafa. O camarote estava cheio de fumo.

- Ei, cozinheiro, vai à cozinha tirar o peixe de dentro do congelador e põe-no a grelhar!

No congelador havia salada de batata e salsicha comprada no supermercado e filete de peixe ultracongelado. Tinha apenas de ser metido no microondas. Dois minutos

depois, levei comigo o jantar para o camarote. O Philipp pusera a mesa e a Zarah Leander a tocar.

Depois de comermos, subimos à ponte, como o Philipp lhe chamava.

- Onde é que aqui se iça a vela?

O Philipp conhecia as minhas piadas sem graça e não se irritou. Também a minha pergunta, se ele ainda estava em condições de navegar, foi considerada uma graçola.

Estávamos muito bêbados.

Passámos por baixo da ponte Altrhein e, quando chegámos ao Reno, subimo-lo. A corrente fluía, negra e silenciosa. No recinto das IQR havia muito edifícios bem iluminados,

ardiam fogos coloridos em tubos altos, lâmpadas faziam chicotear luzes cruas. O motor rumorejava, a água estalava batendo contra o costado, e da fábrica vinha um

tremendo bramido de vapor. Deslizámos ao longo do cais de descarga das IQR, passando por gruas, cais de embarque e guindastes de contentores, por linhas ferroviárias

e armazéns. Levantou-se neblina. Começou a ficar fresco. Diante de nós, já conseguia distinguir a ponte Kurt Schumacher. Os prédios das IQR tornaram-se mais sombrios,

atrás da via férrea erguiam-se velhos edifícios mal iluminados contra o céu nocturno.

Tive uma ideia.

- Encosta à direita - disse ao Philipp.

- Estás a dizer para eu acostar? Agora, ali, nas IQR? Porquê?

- Quero ir ali espreitar uma coisa. Podes ficar estacionado durante meia hora e esperar por mim?

- Não se diz estacionar, mas sim fundear, estamos num barco. Estás consciente de que são dez e meia da noite? Pensei que daríamos a volta diante do palácio, voltávamos

para trás e depois bebíamos a quarta garrafa no ancoradouro de Waldhof.

- Explico-te tudo depois, quando estivermos a beber a quarta garrafa. Mas agora tenho de entrar ali. É por causa do caso de que te falei há bocado. Já não estou

bêbado.

O Philipp perscrutou-me com o olhar.



- Bem, tu sabes o que fazes.

Virou o barco para a direita e navegou com uma concentração calma, que eu já não esperaria no estado em que ele estava, lentamente, ao longo do muro do cais, até

encontrar uma escada encostada à parede.

- Lança as defensas.

Apontava para dois objectos de plástico brancos, com forma de salsicha. Atirei-os borda fora; por sorte estavam presos ao barco, que ele amarrou à escada.

- Gostaria que fosses comigo. Mas prefiro saber-te aqui, pronto para partir. Tens uma lanterna de bolso?

- Aye, Aye, sir.

Subi a escada. Estava com frio. O pólo que me haviam vendido sob um qualquer nome americano, e que eu vestia debaixo do meu casaco de pele, com as minhas calças

de ganga novas, não me aquecia. Espreitei por sobre o muro do cais.

Diante de mim estendia-se uma estrada estreita, paralela ao rio, atrás dela uns carris com vagões de comboio. Os edifícios eram construções de arenito do estilo

que eu já conhecia do da Segurança da fábrica e da casa dos Schmalz. Tinha diante de mim a parte velha da fábrica. Aqui, algures, teria de ser o hangar do velho

Schmalz.


Caminhei para a direita, onde os antigos edifícios de arenito se tornavam mais baixos. Tentei, ao mesmo tempo, andar com cuidado e manter a naturalidade de alguém

que tem todo o direito de andar ali. Parei na sombra dos vagões de comboio.

Eles chegaram sem que o cão-pastor que traziam com eles emitisse qualquer som. Um iluminou-me o rosto com uma lanterna em forma de bastão, o outro pediu que me identificasse.

Tirei a identificação especial do bolso.

- Senhor Selb? O que faz aqui com a sua investigação especial?

- Não precisaria de nenhuma identificação especial se tivesse de lhes responder a isso.

Mas eles não ficaram satisfeitos com aquilo, e também não conseguira intimidá-los. Eram dois rapazes novos, como agora também se vê frequentemente na Bereitschaftspolize.

Antigamente, viam-se muito nas Waffen-SS. Claro que esta comparação é inadmissível, porque hoje em dia vivemos numa sociedade democrática e livre, mas a mistura

de zelo, seriedade, insegurança e servilismo nos rostos é a mesma. Vestiam uma espécie de uniforme paramilitar com o anel de benzeno na lapela.

- Mas, colegas - disse eu -, deixem-me fazer o meu trabalho, e façam o vosso. Qual é o vosso nome? Terei muito prazer em dizer amanhã ao Danckelmann que se pode

confiar em vocês. Continuem assim!

Já não me recordo dos seus nomes; soavam a algo parecido com Energia e Resistência. Não consegui levá-los a fazer-me a continência. Mas um devolveu-me a identificação,

e o outro desligou a lanterna. O cão-pastor havia assistido a tudo sem se manifestar.

Quando deixei de os ver, e já não ouvia os seus passos, continuei. Os edifícios mais baixos que eu vira deixavam uma impressão de ruína. Algumas janelas estavam

partidas, algumas portas estavam tortas nos gonzos, de quando em quando faltava o telhado. Aparentemente, os prédios daquela zona iriam ser demolidos. Mas a degradação

parara diante de um deles. Era também de arenito com um único piso, janelas de volta redonda e telhado semicircular de chapa ondulada. Se havia um hangar do Schmalz,

teria de ser este.

A minha lanterna encontrou a pequena porta de serviço no grande portão de correr. Estavam ambos fechados, e o grande só se conseguia abrir por dentro. Primeiro nem

sequer tencionava tentar o truque do cartão, mas depois lembrei-me de que o Schmalz, naquela noite incerta, fazia hoje três semanas, porventura não teria já tido

a força nem a presença de espírito suficientes para pensar em insignificâncias como trancar as portas. E, com efeito, entrei no hangar usando o cartão da minha identificação

especial. Tive de fechar a porta imediatamente. Energia e Resistência acabavam de dobrar a esquina.

Encostei-me à porta fria e respirei fundo. Agora estava extremamente sóbrio. E ainda continuava a achar boa ideia ter entrado espontaneamente para procurar algo

no recinto das IQR. Saber que, no dia em que o Mischkey teve o acidente, o velho Schmalz tinha cortado a mão, que tinha tido um acidente vascular e esquecido os

jogos de xadrez, não era muito. E que ele consertasse furgonetas e que a rapariga da estação tivesse visto uma furgoneta estranha perto da ponte, também não era

nenhuma pista quente. Mas eu queria saber.

Passava pouca luz através das janelas. Vi os contornos de três furgonetas. Acendi a minha lanterna de bolso e reconheci uma velha Hanomag, uma Unimoge uma Citroen.

Na verdade, já não se vê a circular esta última. Na parte de trás do hangar havia uma grande bancada. Tacteei o tampo. Entre ferramentas, havia um molho de chaves,

um boné e um maço de cigarros. Agarrei no molho de chaves.

Só a Citroen é que ainda trabalhava. A Hanomag não tinha vidros, a Unimog estava assente nuns cavaletes. Sentei-me dentro da Citroen e experimentei as chaves. Uma

delas servia, e quando a girei acenderam-se as luzinhas do tablier. O volante tinha sangue seco, e também o pano sobre o lugar do morto estava sujo de sangue. Guardei-o.

Quando quis tirar a chave da ignição, toquei num interruptor do tablier. Atrás de mim ouvi um motor eléctrico ronronar, pelo espelho lateral vi as portas de trás

abrirem. Saí e fui até lá.

20

Não seres apenas um estúpido mulherengo



Desta vez não me assustei tanto. Mas o efeito ainda era impressionante. Agora sabia o que se havia passado na ponte. A parte de trás da furgoneta estava coberta

com película reflectora, da metade esquerda da porta de trás, aberta, até à metade direita. Um tríptico mortal. A película estava lisa de tão esticada, sem rugas

nem falhas, e eu vi-me lá reflectido, como no sábado no espelho das minhas escadas. Quando Mischkey entrou na ponte, a furgoneta estava lá parada com as portas traseiras

abertas. O Mischkey guinou com o volante para a esquerda por causa dos faróis que, de súbito, haviam aparentemente surgido na sua direcção e na mesma faixa, e perdeu

o controlo do automóvel. Lembrei-me da cruz no farol direito do carro do Mischkey. Não tinha sido colocado por ele mas sim pelo velho Schmalz, que desse modo reconhecera

na escuridão o momento de abrir as portas traseiras, porque a sua Vítima vinha aí.

Ouvi pancadas no portão do hangar.

- Abram a porta! Segurança!

Energia e Resistência deviam ter visto a luz da minha lanterna. Ao que parecia, o hangar seria tão exclusivamente usado pelo Schmalz que os seguranças da fábrica

não tinham a chave. Fiquei contente por aquelas duas forças da juventude não conhecerem o truque do cartão. Apesar disso, estava encurralado.

Memorizei a matrícula da furgoneta e reparei que as placas não tinham selo e estavam mal seguras por arame. Pus o motor a trabalhar, enquanto lá fora batiam no portão

com mais energia e com mais resistência, e recuei o automóvel até o deixar a um metro de distância da porta, com a superfície espelhada aberta. Depois fui buscar

à bancada uma longa e pesada chave-inglesa. Um dos meus dois perseguidores atirou-se contra a porta.

Comprimi-me contra a parede, ao lado da porta. Agora precisava de muita sorte. Quando achei que vinha aí o próximo encontrão, pressionei a lingueta.

A porta escancarou-se com violência e o primeiro segurança precipitou-se para dentro do hangar, caindo no chão. O segundo entrou a seguir de rompante, com a pistola

em riste, e deteve-se assustado perante a sua própria imagem reflectida. O pastor alemão estava ensinado a atacar qualquer homem que ameaçasse o dono com uma arma

e saltou, rasgando a película. Ouvi-o ganir de dor dentro do compartimento de carga. O primeiro segurança jazia tonto no chão, o segundo ainda não tinha compreendido

o que se passara; eu aproveitei a confusão e safei-me pela porta, correndo a toda a velocidade na direcção do barco. Tinha avançado talvez uns vinte metros pelos

carris e pela estrada, quando percebi que Energia e Resistência tinham retomado a perseguição:


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