33 Guia de Economia Comportamental
e Experimental
a não mudar o comportamento a menos que o incentivo para fazê-lo seja forte, é chamada de “viés
do status quo” (Samuelson e Zeckhauser, 1988). A inércia é uma manifestação da propensão humana
a permanecer no status quo (Madrian e Shea, 2011) e uma bem conhecida manifestação de inércia
está nas baixas taxas de adesão ao plano de previdência privada quando as pessoas têm de fazer o
esforço de se inscrever (“opção de entrar”, ou “opt-in”). Nesse caso, um modo eficaz de elevar as ta-
xas de adesão é mudar o default — o que acontece quando as pessoas não fazem uma escolha ativa.
Inércia, procrastinação e falta de autocontrole são problemas que tornam eficaz a estratégia de fazer
mudanças em opções padrão, de optar por entrar para optar por sair (de “opt-in” para “opt-out”).
Desse modo, em vez de precisar agir para inscrever-se (opt-in), agora as pessoas precisam fazer um
esforço para cancelar sua inscrição (opt-out) (Thaler e Sunstein, 2008). O nudging com defaults é
uma das ferramentas principais do “arquiteto da escolha” (Goldstein, Johnson e Heitmann, 2008).
Dimensões Temporais
Outro ramo importante da EC introduz uma dimensão temporal a avaliações e preferências humanas.
Essa área reconhece que as pessoas têm viés para o presente e não são boas em predizer tendências,
percepções de valores e comportamentos futuros.
Desconto Intertemporal e Viés do Presente
Segundo as teorias do desconto intertemporal, os eventos do presente recebem pesos maiores do
que os do futuro (Frederick, Loewenstein e O’Donoghue, 2002); quando muitas pessoas preferem
receber $100 agora a receber $110 daqui a um mês. O desconto é não linear e sua taxa não é constan-
te ao longo do tempo. A preferência das pessoas por receber $100 daqui a uma semana em vez de
receber $110 daqui a um mês e uma semana não será igual à sua preferência por receber $100 daqui
a um ano em vez de receber $110 daqui a um ano e um mês. Embora a diferença seja de um mês em
ambos os casos, o valor dos eventos que estão mais distantes no futuro cai mais lentamente do que
o daqueles que estão mais próximos do presente (Laibson, 1997).
Além da inércia, o desconto do futuro é outro aspecto importante para explicar as baixas taxas
de poupança para fins de aposentadoria. Um estudo aventa que seria possível obter uma mudança
comportamental ajudando a pessoa a se conectar com o indivíduo que ela será no futuro. Nesse es-
tudo, pessoas que viram um avatar de si mesmas em idade avançada mostraram maior probabilidade
em aceitarem recompensas financeiras futuras em vez de intermediárias (Hershfield et al., 2011).
Viés da Diversificação e Lacuna da Empatia [Empathy Gap]
A inconsistência temporal também ocorre quando uma pessoa, no presente, não prediz acurada-
mente quais serão suas preferências no futuro, uma noção bem ilustrada pelo viés da diversificação
(Read e Loewenstein, 1995). Quando vou fazer compras que serão consumidas ao longo de vários
dias, talvez eu escolha um pacote com várias caixinhas de cereais sortidos, mas daqui a duas se-
manas descubra que gostaria mais se tivesse escolhido apenas o meu sabor favorito. No caso dos
alimentos, o viés da diversificação provavelmente será bem acentuado se você tomar a decisão de
compra quando estiver saciado (por exemplo, logo após uma refeição). Essa incapacidade de avaliar
plenamente o efeito de estados emocionais na tomada de decisão é conhecida como lacuna da em-
34 Guia de Economia Comportamental e Experimental
patia (quente-frio), um termo cunhado por George Loewenstein, um dos fundadores do campo da
Economia Comportamental. Os estados “quentes” incluem diversos fatores viscerais, como emoções
negativas associadas a altos níveis de excitação (por exemplo, raiva ou medo), estados de sensibili-
dade (por exemplo, dor) e estados de impulso (por exemplo, sede, vontade intensa relacionada a um
vício, excitação sexual) (Loewenstein, 2000). A ilustração mais conhecida ocorre durante a tomada
de decisão sexual, na qual um homem em um estado “frio”, não excitado, frequentemente prediz que
usará preservativo em suas próximas relações sexuais, mas acaba não usando quando está em um
“estado quente” de excitação (Ariely e Loewenstein, 2006).
Previsão e Memória
Quando fazemos planos para o futuro, geralmente somos otimistas demais. Por exemplo, estamos
sujeitos a cometer a falácia do planejamento, subestimando quanto tempo levaremos para concluir
uma tarefa e desconsiderando experiências passadas (Kahneman, 2011). Analogamente, quando ten-
tamos predizer como nos sentiremos no futuro, podemos superestimar a intensidade das nossas
emoções (Wilson e Gilbert, 2003). O nível de felicidade que prevejo sentir em minhas próximas férias,
por exemplo, provavelmente é maior do que a felicidade que verdadeiramente sinto durante a expe-
riência real. Existem várias explicações para essa distorção, entre elas o modo como nos lembramos
de eventos passados. Minha recordação das férias passadas provavelmente não é representativa das
férias como um todo (Morewedge, Gilbert e Wilson, 2005) e eu talvez avalie minhas últimas férias
com base nos momentos mais agradáveis e no fim delas, por exemplo, e não com base na média de
cada momento da experiência - a regra do pico-fim (Kahneman e Tversky, 1999). Finalmente, con-
forme os dias vão se passando durante as férias, eu simplesmente me habituarei e minha felicidade
se reduzirá aos níveis de costume. Segundo o conceito de adaptação hedônica, mudanças em expe-
riências tendem a induzir à felicidade apenas temporariamente, pois nos acostumamos com as novas
circunstâncias (Frederick e Loewenstein, 1999).
Dimensões Sociais
Ao contrário do conceito de motivação e tomada de decisão baseado na ideia do homo economicus,
a EC não pressupõe que o ser humano faz escolhas em isolamento ou para servir aos seus próprios
interesses. Além das dimensões cognitivas e afetivas, uma área importante da EC também considera
as forças sociais, pois as decisões são tomadas por indivíduos que são moldados pelos ambientes
sociais e integrados a esses ambientes.
Confiança e Desonestidade
A confiança, que é uma das explicações para as discrepâncias entre o comportamento real e o com-
portamento predito por um modelo de agentes auto-interessados, torna possível a vida social e
permeia as relações econômicas. Ela foi associada a resultados econômicos positivos, como o cresci-
mento macroeconômico (Zak e Knack, 2001), assim como à motivação intrínseca no nível micro e ao
desempenho no trabalho (Falk e Kosfeld, 2006).
Embora a confiança possa nos deixar vulneráveis e, por isso, reflita preferências de risco, ela
também pode ser resultante de preferências sociais (Fehr, 2009). Por exemplo, ela já foi associada ao